Décima Terceira Carta

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PARA VOSSA MAJESTADE O REI DE VAKRUT

No dia seguinte, eu despertei cedo, ainda curiosa sobre o dono dos olhos azuis. E tentando esquecer a minha paixão por você, todo segundo que passava eu tentava apagar seu nome da minha mente e todos os acontecimentos em Vakrut.

Eu tomei café com o meu pai, mas em silêncio absoluto, eu percebia que ele queria falar comigo, mas algo o reprimia.

Talvez a vergonha, ou a decepção ainda o calava.

Depois do café, fui a biblioteca organizar algumas prateleiras, pelo menos as que eu mais pegava livros. Depois fui para meu quarto organizar minhas roupas e tirar algumas para as doações.

Quando eu percebi já era almoço.

Mas meu pai havia ido para a casa do velho Harris. Então, comi sozinha, naquele enorme salão, no enorme silêncio e tudo naquele momento parecia mais gelado que o normal.

Talvez essa seja a famosa solidão.

Lembro-me que senti vontade de chorar, quando pensava nos momentos bons que passava nos almoços com meu pai, sempre conversávamos sobre o dia corriqueiro de cada um, mas quando mal percebi, essa pequena parte da minha rotina tinha escapado entre meus dedos como areia fina.

As consequências dos meus atos estavam batendo em minha porta mais rápido do que eu pensava. Apesar de você ter abafado o caso, eu ainda sofria com os olhares e julgamentos.

Eu não recebia mais convites para bailes, o rei de Thorpez havia cortado amizade total com meu pai, aquilo o abalou, afinal eles eram muito próximos.

Na minha fortaleza costumava ter bailes todas as semanas, mas ninguém mais aceitava nossos convites.

Meu pai também havia se tornado um homem solitário. Ninguém na corte ouvia suas ideias ou o respeitava como um Marquês.
Eu não só arruinei a minha vida, mas a dele também, e essa foi a pior parte.

Eu desejei que me cortassem em pedaços, desejei ser apedrejada e espancada nas ruas, do que ver meu pai ser humilhado por um erro que eu cometi.

Eu sabia que aquilo me assombraria para sempre.

Mas foi a minha escolha.

Mesmo eu sabendo das consequências.

A noite não demorou a chegar, e eu não desci para jantar, apenas me banhei e fui dormir. Não queria dar o desprazer ao meu pai de me ver.

Então durante os dias que se passavam, eu o evitava, mudei meu horário de café, de almoço e janta, desviava dos corredores que ele andava ou dos cômodos que estava.

Queria ficar o máximo possível longe de seu caminho, talvez assim ele seria mais feliz.

Cada dia mais eu perdia meu brilho e minha alegria, parei de ir a casa de Kiligan, me afundei de vez em minha depressão e angústia. Comecei a ficar mais em meu quarto do que na biblioteca, que era o lugar que eu mais amava ir. Até meus passeios no jardim eu não fazia mais.

Se Grace me visse agora ela ficaria feliz, em ver que as pragas que ela rogou, estavam se realizando.

Eu mereço.

Era tudo o que eu pensava na época.

Era o que eu dizia a mim mesma.

Me tornei miserável como ela queria que eu me tornasse.

Foi um mês.

Um mês em meu quarto sem ver ninguém, sem comer direito, sem ver a luz do sol.

Um mês presa em minha mente ouvindo as palavras de Grace, até que Bryce invadiu meu quarto.

__Levante-se! __ela havia sido firme em seu tom. __Levante-se agora, Lília!

__Por favor, me deixe aqui.

__Saia já dessa cama ou eu a tirarei aos tapas!

__Eu não quero mais machucar ninguém.

__Você já está machucando! __nesse momento ela já estava aos berros me dando sermões. __Kiligan está triste e nem se quer conversa mais, porque pensa que fez algo errado a você. Senhor Harris resmunga pelos cantos com lágrimas nos olhos enquanto você está se matando. E seu PAI! __uma lágrima desceu pelo meu rosto, deixando um rastro quente e úmido, eu estava sendo tão egoísta pensando apenas na minha dor, que eu não notava as pessoas que eu estava machucando. __Esta morrendo por dentro em ver a própria filha acabar com a vida dessa forma! Eu estou magoada, todos que se importam com você estão preocupados e desesperados. Mas tudo o que você pensa é nas pessoas que te desprezam e te olham torto! __ela respirou fundo, tomando fôlego para continuar, eu não tinha palavras para rebater. __Acha que eles merecem sua atenção? __eu neguei. __Acha que eles merecem suas lágrimas? __neguei novamente. __Não merecem! Por que quando doeu, só você sentiu!

Eu era uma bagunça de lágrimas, Bryce ficou em pé me olhando hesitante, ela não sabia se me abraçava ou se continuava com os sermões. Ela fez os dois, me abraçou forte e continuou a me dar uma bronca.

Eu precisava daquilo.

Do choque de realidade.

Do abraço.

Do sermão.

Depois daquele dia eu mudei.

Decidida e voltar a viver novamente.

Levantei da cama e tomei um banho quente. Com a ajuda de Bryce coloquei um vestido, que ficou largo por conta da perda de peso.

Sai de meu quarto com medo do que me esperava da porta para fora, mas minha amiga estava ao meu lado, me guiando. Um apoio para meu corpo fragilizado pelos dias que fiquei mofando em meu quarto.

Minhas pernas tremiam.

Parecia que eu tinha voltado a aprender a andar.

Saímos da fortaleza, a luz do sol tocou a minha pele, e naquele momento eu me senti viva pela primeira vez desde Vakrut.

Com o ar fresco tocando a minha pele, o som sereno dos pássaros e das folhas das árvores junto aos galhos se batendo por conta da brisa.

O quente do sol, que não estava tão quente.

A minha frente estava meu pai descendo de seu cavalo e vindo em minha direção ofegante. Eu o olhei bem e parecia exausto, com olheiras e estava mais magro também, os cabelos desgrenhado e muito preocupado.

__Lili. __foi a primeira vez que ele disse meu nome depois de tudo. Eu desabei, cai de joelhos no chão, mesmo com Bryce me segurando. Meu pai correu até mim e se ajoelhou me puxando para seus braços. __Me desculpa, filha.

__Eu que peço desculpas. Eu destruí nossa família.

__Jamais diga isso.

Eu escondia o rosto na curva de seu pescoço, como se aquilo fosse me proteger de todos os monstros que me perseguiam.
Ele não me soltou.

E isso me fez tão bem.

Porque meu pai não desistiu de mim.

A Grace desistiu.

Vossa majestade desistiu.

Mas ele não.

Meu pai nunca desistiu de mim!

E ali, abraçada com meu pai, eu percebi, que não precisava temer nada, porque eu jamais perderia ele.

COM CARINHO, LÍLIA SHORMAN

Cartas para o ReiOnde histórias criam vida. Descubra agora