Uma hora antes da reunião com os Zwane, repassei a Thomas os detalhes da catástrofe do dia anterior. Para minha infelicidade, o assédio constante do casal não era o suficiente para motivar uma ordem de restrição. Exceto a última cena protagonizada por Cassandra em meu escritório, todas as outras aproximações do casal haviam sido cordiais e inofensivas, portanto, ineficazes para alcançar meu objetivo. O que não me impediu de contratar um segurança particular, Ian Dellarios. Apesar da insatisfação quanto à ineficácia das medidas protetivas jurídicas, recorrer ao guarda-costas pareceu uma solução razoável. Detestava profundamente a ideia de andar com uma sombra que não fosse a minha, mas as constantes aparições inconvenientes daqueles dois tinham me levado ao limite. Maldita hora que lhes dei atenção!!
Depois de um breve sermão cuidadoso e preocupado, Thom apreciou minha precaução, pedindo-me que o mantivesse bem informado sobre o assunto. Depois disso, fomos para o bistrô Delgado onde seria o encontro com os irmãos Zwane. Estava bem ansiosa para rever Adélia, não podia negar. Havia alguma coisa nela que prendia meu interesse, e não era somente por sua beleza imensurável. Tinha algo por trás de toda aquela amabilidade cativante que me arrancava sorrisos involuntários. Quase cedi a curiosidade de tocá-la no fim de nosso primeiro encontro, apenas para quebrar seu encanto e desvendar seus segredos mais profundos.
O prelúdio da minha ruína ficou muito claro quando Adélia prendeu sua atenção totalmente em mim, assim que passei pela porta do pequeno restaurante que nos aguardavam. Mesmo com toda aquela distância, sua observação atenta formigava minha pele, deixando-me inquieta. Seus olhos, continham promessas perigosas dançando nas bordas das íris negra. Contrário à sua postura polida, seu sorriso largo me devorava sem pressa. Não tinha como não sentir ansiedade diante da perspectiva de ser envolvida pela intensidade de sua presença. O faria com verdadeiro deleite, se ela pedisse.
O mais surpreendente era que nada dos sentimentos que ela despertava, convergia de maneira unicamente sexual. Tinha uma atração inegável, sim, mas Adélia prendia minha atenção como nada antes. Todos esses sentimentos eu conhecia de cor, mas meu corpo reagindo como se fosse a primeira vez, me fazia praguejar por estar gostando tanto.
— Senhorita Graham, ainda não nos conhecemos! Sou Daniel Zwane. – a apresentação entusiasmada do homem ao lado de Adélia trouxe-me de volta a razão, me fazendo focar a atenção nele.
Assim como a irmã, Daniel era uma visão e tanto. Alto, atlético, cabelo castanho cortado baixinho, cavanhaque bem aparado, lábios grossos. O conjunto destes atributos despertaria a admiração instantânea de qualquer um, e o cintilar determinado de seus olhos castanhos demonstrava que ele sabia muito bem o impacto de sua aparência. Sua observação minuciosa percorreu meu corpo com tanta discrição que, se eu não estivesse o olhando diretamente, teria passado despercebida. Sua ousadia mesmo que velada me divertiu, e não consegui conter o sorriso conspirador enquanto retribuía seu cumprimento. Thomas habituado aos meus costumes, estendeu a própria mão apertando a de Daniel, quando ignorei gentilmente a mão estendida na minha direção com um sorriso cordial.
— Daniel! É um prazer revê-lo, meu amigo. – emendou Thom, igualmente animado, a fim de distraí-lo da minha inércia em retribuir sua cordialidade física.
Aproveitando-se do momento, Adélia também se levantou e nos cumprimentou. Mesmo estranhando inicialmente, ambos os irmãos não pareceram se importar com minha evidente reserva. Tomei o cuidado de não tocar nenhum deles, apenas acenando de maneira gentil e educada. Não queria passar por outra experiência desconfortável tão cedo. Os efeitos incômodos da última, ainda rastejavam como espinhos sob minha pele.
Lidar com as emoções presas nos objetos era mais suportável. Na maioria das vezes, era efêmero e facilmente esquecível. Chegava a ser curioso como as cargas emocionais se fixavam em objetos específicos, funcionando como catalisadores naturais. Por exemplo, uma faca usada contra alguém certamente seria um objeto que eu manteria à distância. Ainda que o sentimento precisasse ser forte o suficiente para isso ocorrer, sempre havia exceções.

VOCÊ ESTÁ LENDO
Artem
RomanceEva é uma curadora de arte de um importante museu. Dona de um passado sombrio, foi inevitável que criasse uma armadura capaz de afastar todos ao seu redor. No entanto, o destino parecia ter pretensões próprias, ao cruzar seu caminho com Adélia Zwane...