••● Capítulo 2: Um Segredo a se Guardar ●••

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Lá estava eu em meio à floresta. Novamente, agradável silêncio me possibilitava ouvir o som da natureza. Desta vez, eu estava só.
Ainda estava de certo modo, paralisado por aquela interação misteriosa com aquela desconhecida garota. Como se não bastasse a surpresa de encontrar em uma floresta uma garota de cabelos, sobrancelhas e cílios azuis, ela dizia me conhecer e parecia ter as respostas às minhas perguntas antes mesmo que eu pudesse terminar de elaborá-las em meu pensamento. Sabia que à partir dali, algo grande se iniciaria, mas como ela mesmo havia dito, eu ainda não podia compreender.
Voltei pra casa. Chegando lá, percebi que algo tinha mudado. O ambiente e todos continuavam os mesmos, mas, eu sentia um incômodo maior em relação aos ruídos. Eu sentia os sons dos aparelhos e as interações de meus familiares transmitirem-me inquietação, sentia necessidade de me equilibrar, acalmar-me, como fazem os monges ao meditar. Eu havia ficado mais sensível a toda energia de agitação.
Foram se passando alguns dias e eu procurei por formas de meditar, mas, não conseguia me concentrar, sempre era interrompido por algo, ou por alguém.
Senti-me sem forças pra interagir com meus entes, intuía que precisava nutrir meu ser com algo, e que se isto já existiu em minha casa, não poderia mais ser encontrado lá. Eu tinha dúvidas e sabia que toda a minha sede de respostas se saciaria lá, aonde estivesse aquela garota de cabelos azuis.
Seguindo minha intuição, acordei cedo, em outra bela manhã ensolarada, preparei meu café da manhã enquanto pensava se não era tolo da minha parte achar que ela estaria lá, naquela floresta de novo, no mesmo horário que da última vez. Calcei meus sapatos e segui aquele mesmo caminho, chegando na floresta. Adentrei-a torcendo pra que ela estivesse lá, mas durou pouco. Ela estava lá novamente, assim como eu. Passou pela minha cabeça que ela gostava de estar ali e naquela hora do dia. Somente isso explicaria o motivo dela estar ali de novo. Aproximei-me dela, parando novamente ao seu lado. Seu olhar, como sempre, dirigia-se às nuvens, aos céus límpidos daquele belo dia, em completa paz. Notando minha presença, ela levou seu carinhoso olhar a mim e disse-me gentilmente: "olá!". Saudei-a de volta com o mesmo gesto, antes que ela retornasse seu olhar ao tranquilo céu azul.
Discretamente, observei-a contemplar o infinito acima de nós, enquanto o vento vinha a nosso encontro, silenciosamente. Naquele momento concluí que gostava dela, de sua presença, que me acalmou outra vez, bem mais do que minhas tentativas de meditar; trazia-me paz, sem que eu nem mesmo soubesse o porquê. Ela aparentava ser gentil e inocente, por mais que seus poucos momentos de diálogo também lhe demonstrassem ser alguém de refinada sabedoria. Era agradável estar ao seu lado.
Passamos como no dia anterior, longo e reconfortante tempo nos reconectando à natureza, admirando-a e sentindo-a em silêncio. Quando após um profundo suspiro ela disse a mim:
- Muita coisa já mudou em você. Hoje sua mente está mais aberta às verdades libertadoras que o mundo ainda espera para receber, também está mais calmo, mais amigável. Você está leve - sorrindo, ela me disse: - aliás, não precisava se apressar no café, não tenha pressa, leve a vida de forma branda e se verá sã neste mundo repleto de ideias carecidas de razão - impressionei-me quando ela mencionou meu café da manhã: referia-se a algo que fiz em tempo recorde, antes de vir ao bosque. Ela acertou em cheio.
- Como você saberia disso? Até agora eu só lhe disse oi.
- Não falamos apenas com a boca. Aliás, seus movimentos gritam, sua respiração grita, suas dúvidas gritam. É necessário o controle da chama para se aquecer, ou vai acabar se queimando; a mansidão das ondas para que se possa navegar tranquilamente.
- E como se ouve o que não se fala com a boca?
- Se sente. Você sentiu que deveria ficar em silêncio ontem quando me viu, mas suas preocupações com o "eu" lhe impediram e só lhe restou sair de um estado paz para falar. 

Era impressionante como ela sabia até o que eu sentia. 

- O que quer dizer com "suas preocupações com o eu"?

Caminhando à Paz, com AmorOnde histórias criam vida. Descubra agora