OIHIO

O surfista de estrelas

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Palavras: 700

É um belo dia no fim da existência. O buraco negro que engole a nebulosa é como uma versão negativa do sol que um dia foi, num horizonte rosa como a aurora, formando pelo fulgor dos espectros luminosos das estrelas.

Numa dessas estrelas, a última forma de vida da galáxia surfa, com sua prancha branca marcada por uma mordida de tubarão, uma onda de plasma como se fosse água dourada. A florida praiana vermelha, assim como o short branco, flamulam loucamente, e de vez em quando os chinelos azuis escorregam. No primeiro indício de que o equilíbrio vai falhar, ele se posiciona e realiza uma batida¹, gritando:

⎯⎯ Eu AMO minha vida! ⎯⎯ Percebe logo que erguer os braços enquanto surfa numa onda de calor não é a melhor id3!@. ⎯⎯ Epa...?

Mas, o que quer que tenha visto, ficou para trás. Olha para cima. A incontáveis anos luz de distância, o corpo de massa incalculável faz o espaço se distorcer, engolindo o horizonte como o maior redemoinho de todos.

Nunca antes surfou num buraco negro. Será que $3R!@ L3g@L?

Os segundos que demora para recuperar o controle da prancha são os mais longos que já experienciou. Ele viu! Mas, só para ter certeza, aproxima-se da borda superior e faz um aéreo². Seus olhos se arregalam.

Atrás dele, como tubarões famintos, devoram a própria energia na qual nadam, deixando para trás um rastro de @B$0LUT0 N@D@.

⎯⎯ Demorei demais. ⎯⎯ Ele volta-se para a frente e faz um movimento de remar com ambos os braços. De imediato, o plasma se agita e a onda aumenta, jogando-o ainda mais rápido na direção que a prancha aponta. ⎯⎯ Calma... tô sendo narrado?

De uma só vez, a superfície do plasma da onda é rompida por uma difusa silhueta, e uma explosão solar acontece. Quando o surfista volta a enxergar, percebe que está girando. Girando. Girando. Então, a dor. O faz assumir posição fetal. Aquilo tocou sua P3RN@. Começa a se espalhar pelo corpo e sua forma a tremeluzir, tremer, mudar, como estática. Então, sua pele se desfaz, revelando outra por baixo, preta como o espaço, com um leve tom roxo e inúmeras estrelas em miniatura. Boca e nariz somem, assim como as orelhas, e o cabelo dá lugar a uma névoa que se assemelha a uma nebulosa. Em vez de globos oculares, um par de buracos negros lhe servem de olhos.

⎯⎯ E lá se vai meu disfarce. ⎯⎯ diz, assim que a dor cessa. Olha em volta e avista a estrela em que surfava. Se esticar o braço, consegue tapá-la com a mão. ⎯⎯ Aquela prancha tava autografada, cara! Será que consigo...?

De repente, uma mancha negra surge na estrela, no início como um pontinho, começando a crescer. Então, de um segundo para o outro, a luz se esvai, como uma lâmpada sendo apagada.

⎯⎯ Acho que não. ⎯⎯ O surfista então sente a espinha gelar. O buraco negro, aquele que bebia a nebulosa como iogurte, começa a ser distorcido e sugado, e o resto da nebulosa que vai junto revela a mancha ainda ali, mil vezes maior. ⎯⎯ Ok, cara, me empresta isso rapidinho. ⎯⎯ O surfista estica sua mão na direção do nada, como se indo fechar uma cortina, e as estrelas se juntam no centro da palma, como se a galáxia inteira estivesse se retorcendo para caber ali. Não, não apenas isso, mas tudo, incluindo...

A narração. Devolvo em breve. Não está na rotina de um Viajante causar o fim de uma realidade, mas esta já estava para acabar mesmo! Infelizmente está mais rápido do que previ, terei que narrar algo menos elaborado para tirar meu corpo físico a tempo:

Oihio fita o nada que começa a se abrir no meio do espaço. A mancha está tão enorme que pressiona o tecido do espaço-tempo, abrindo uma trinca na R3Alidade. Rachaduras se espalham para todos os lados, como num vidro pisoteado, e Oihio percebe que uma fissura se abriu bem ao seu lado. Através do buraco, consegue ver um mundo novo demais para ter manchas.

A R3@L!D@D3 treme a sua volta, as trombetas que anunciam seu fim, e, antes que as manchas cheguem a Oihio, ele atravessa o portal.

¹Batida = Manobra onde literalmente se dá um "tapinha" com a prancha na crista da onda a fim de se manter na área crítica;

²Aéreo = Manobra em que se usa a força da onda para "saltar" no ar;