Lottie, Francês e Outras Coisas Lindas ᝰ lottienat

décimo quarto.

SHAUNA SHIPMAN, EU, E OUTRAS CATÁSTROFES QUE NATALIE ESTÁ CAUSANDO || charlotte mattews point of view.

Pode parecer uma pergunta clichê, mas você entende quando alguém entra na sua vida preenchendo espaços, buracos, crateras e vazios que você nem sabia existir?

Nat não é a distração que achei que seria, e percebi isso com o andar da semana. Quando preciso de paz, é isso que ela me dá. Quando preciso de diversão, ela está lá com um sorriso fácil. E quando todo o meu corpo dói de desejo ela não tem o menor problema em me beijar até eu perder os sentidos. Ela gosta de ficar comigo. E eu gosto de ficar com ela.

Aperto a nuca, sentindo meus dentes trancarem em meu lábio inferior de ansiedade. Meus pés, os quais me levam em direção ao vestiário feminino de atletismo, estão andando bem mais rápidos que o normal.

Será que deixei isso ir longe demais? Melhor pular fora agora? Posso continuar sem que alguém se machuque?

Talvez. Mas, já é sexta e a prova de classificação de Nat no intercolegial é hoje, então quero desejá-la boa sorte pessoalmente antes que aconteça.

A semana passou num pulo, e quanto mais o tempo vem passando ao nosso redor, ao mesmo modo que me tranquiliza ter Nat para me distrair, sinto que é um perigo iminente à vida inteira que tenho planejada. Meu objetivo de conseguir o intercâmbio e terminar o ensino médio na França, cursar os anos de faculdade de medicina de volta na Califórnia e depois o emprego perfeito no Hospital onde minha mãe trabalhava, fechando com uma aposentadoria numa cidade paradisíaca... é um plano que jamais incluiu alguém ao meu lado. Não sei por quê.

Simplesmente nunca pensei nisso.

Pessoas foram feitas para... distrações. E isso é fácil de conseguir e fácil de largar. Ou, pelo menos, era fácil de largar. Agora, não tanto, porque a ideia de não ter Nat me ensinando francês todo dia, fazendo o biquinho em seus lábios para pronunciar as palavras, ou ouvir suas piadas ridículas, ou até passar um dia sem ver seu sorrisinho de criança, forma um nó na minha barriga que logo se transforma numa pedra. Na verdade, esse nó está me dando enjoo hoje.

O dia foi tão cheio, tão cheio que me sinto mal, fraca e tonta. Não tive tempo de comer nada, porque meu pai simplesmente não se importa. Tudo o que é relevante para ele, é que eu tenha conseguido passar o dia inteiro, sem pausas, divulgando a mim mesma para o Baile de Inverno. Com a ajuda de Jackie e Nick, consegui passar o dia apenas com água e algumas barras de cereal, enquanto saímos distribuindo fotos ridículas com sorrisos ridículos e apelos ridículos porque meu pai tem essa necessidade ridícula de me apresentar como um prêmio ridículo.

Inspiro fundo algumas vezes e tento me lembrar da última vez que comi alguma coisa enquanto ergo meu pulso desnudo - pelo fato de eu já estar vestida com as roupas de líder de torcida para o jogo de futebol que acontecerá logo após a prova de atletismo. O relógio aponta seis da noite, e pelas minhas contas, faz dez horas que eu não como nada.

Fecho os olhos e inspiro fundo várias vezes, sentindo a brisa fria do anoitecer ao que olho para o horizonte, procurando por Nat em volta no campo. Exceto por ela, o time está espalhado pela quadra arredondada de corredores treinando alguns movimentos e alongamentos. Tendo em vista que já começa a fazer frio por aqui, parece uma boa ideia colocar seu casaco, que por um acaso, não foi devolvido e se encontra dobrado em minha bolsa. Que está pendurada em meu ombro agora mesmo.

Coloco, ou não? Todas as amigas dela estão aqui, e como se soubessem que estou pensando exatamente nisso, quando me aproximo o bastante para ser notada, elas me olham todas desconfiadas. Shauna Shipman incluída.

Hoje em questão ela parece muito concentrada e focada para vir me dar esporro por estar aqui, mas ainda assim consegue mostrar sua desaprovação pela minha presença enquanto puxa o joelho contra a barriga em alongamento. As sobrancelhas franzidas e os lábios fechados numa linha reta estão rigidamente direcionados a mim. Seu cabelo amarrado a deixa ainda mais séria quando olha para mim, porque estou acostumada a vê-la com os fios castanhos e comportados, mas soltos.