Capítulo 3

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Galhos quebraram à sua volta, mas seus olhos eram enganosos, o breu estendia-se até o limite de seus pés, cobrindo cada centímetro de verde ou marrom das árvores em volta. Ele só podia confiar em seus ouvidos.

Rhoe há muito crescerá além de uma criança. O jovem e forte príncipe indefeso que fugiu de Orynth, sem saber como conduzir seus amigos à segurança, já não existia. Se antes tinha a altura regular de um humano adulto, agora media o mesmo que seu pai, o queixo coçava com a barba curta platinada, os calos das mãos sujas de terra pulsavam contra o cabo da espada.

O dourado em volta de suas íris brilhou, mas nem sua magia podia dissipar a névoa que o cercava. Não havia jeito, mesmo. O turquesa desapareceu por trás das pestanas escuras, e seus outros sentidos assumiram o comando.

Não podia confiar em seu nariz, não desde o incêndio em Rosamel, quando cada centímetro de sua traqueia se queimou, e seus pulmões encheram-se da fumaça densa. Isso fazia dois anos. Ele se lembrava, porque fora na mesma época da fuga em massa de Calaculla, na mesma noite que descobrira que Evalin estivera lá, e que um rei estava morto por isso.

A cidade de Rosamel fora atacada pelos próprios mortos. Levantaram-se de suas covas e avançaram contra cada homem, mulher e criança. Foi uma sorte eles estarem lá naquela noite. O objetivo era Lorde Darrow, segundo soube uma semana e meia depois, quando começou a se atualizar novamente. Ele não foi encontrado, apenas sua cadeira de rodas abandonada à beira de uma varanda, tinha se matado, disseram, seria um destino mais digno do que o que o esperava em Orynth. Ainda assim, nunca provaram que o corpo era dele, carbonizado aos pés da torre do forte.

Seus instintos o mandaram farejar, e por costume ele o fez, os ombros largos ergueram-se no couro pesado e baixaram, não sentiu nada. Nem o cheiro das árvores, nem das ladys que o perseguiam.

Abrindo os olhos, viu o relógio de osso no pulso. Cinco minutos. Se conseguisse cinco minutos, ganharia o jogo, e uma hora a mais nos chuveiros. Hora essa, que ele pretendia trocar por ração extra para a semana.

Um galho estalou, Rhoe se moveu.

A floresta era familiar à ele. Claro, era impossível decorar com exatidão a posição das árvores ou raízes, mas já conhecia bem como o lugar funcionava para saber quando e como pular ou desviar da maioria dos obstáculos que não podia ver com antecedência. E, apesar de não poder sentir o cheiro de quem o perseguia, a névoa poderia indicar quem era.

A cada jogo, a cada treino, sempre que se pegava desprevenido contra ela, Estar surpreendia-o com um poder diferente. Nunca contara-lhe como descobria tais dons, apenas atacava-o com sombras, rastreava-o de olhos fechados, ou monitorava toda a floresta sem sair do lugar. Sua magia funcionava de forma bem diferente da de Larysa, crescia de forma diferente.

Enquanto a lady mais velha aprendera a manipular esse poder em formas físicas – cujos golpes poderiam doer bastante –, Estar usava-os como extensões de seu corpo, espiãs, ou amortecedores de sentidos. Graças à Wyrd não tentava tirar-lhe mais do que a visão nesse momento. Em um dia particularmente ruim, poderia até abafar os sons em volta dele (não que naturalmente já não tivesse a audição afetada), deixá-lo completamente sem sentidos, como um pobre animal indefeso.

Um rugido desprendeu-se de sua perseguidora, e Rhoe a identificou. Rhiannon.

O rugido era rouco com a corrida frenética atrás dele, um rosnado suave, bem diferente do que as Lochan ou Fenrys fariam, e muito mais selvagem do que um grunhidos que muitas vezes Nehemia deixava escapar enquanto corriam pela mata fechada. Ele se impediu de lembrar em que outras situações elas podiam fazer esses sons.

Que imagem linda. Sussurrou a voz de Annon em sua mente. Devagar, Rhoe diminuiu o passo e se deixou alcançar, até estar a segundos de ser pego. Então mandou-lhe uma imagem pelo vendaval que ligava suas mentes. Simplesmente soltou o momento e deixou o vento levá-lo até Rhiannon.

Os Portadores ElementaisOnde histórias criam vida. Descubra agora