Passaram se dias com esse desrespeito mútuo. Ameaças vazias. Era um jeito que a delegada aprendeu a lidar com a situação, piorando a mesma. Típico.
Nessa linda manhã cinzenta e fria de segunda-feira, Anita desejava não ter saído da cama. Com o caos instaurado na delegacia, casos de agressões sem sentido, pessoas mortas, a delegada jurava que ficaria careca de estresse. Porém, tudo isso se escondia atrás de sua fachada quieta e ríspida, que só soltava palavras e afirmações firmes.
Era normal da loira mudar o que sente na frente de outros, ainda mais quem queria que lhe respeitasse. Manter o visual de inabalável era difícil, e, infelizmente, Anita adoraria qualquer tipo de contato físico nesse momento.
Entrando no banheiro, soltou um suspiro prolongado. Preferia há um tempo atrás, mesmo que com uma mulher marrenta e meio idiota, preferia saber que tinha a noite garantida. Era engraçado pensar que quem ela tentava fixamente matar também era a mesma que tomou algumas taças e admitiu coisas que nunca imaginou sair da boca da morena.
Se encarando no espelho, Anita refletiu.
Por que ela? Posso ter quem eu quiser.
Mas nunca seria a mesma coisa. Do que serve arranjar alguém melhor se não terá as mesmas qualidades e defeitos? Afinal, o interessante de Verônica era que a delegada pode desprezar e retratar seu comportamento como inútil e, ao fim, ainda conseguir uns beijos. Não eram todas que aguentavam ser humilhadas assim, Anita, sabe que é errado, mas... Era satisfatório. Não só ser grossa, mas ouvir as respostas que a escrivã sempre tinha na ponta da língua, ou melhor, respostas que se tornavam piadas ou flertes.
Que maldição. Anita sentia falta de Verônica. Não, não de Verônica. De sua situação sadomasoquista e bem humorada. É uma coisa deprimente, como um vício, depois de se sentir assim uma vez, deu corpo e mente anseiam por mais, por algo que cesse essa vontade.
Mas eis a situação. Verônica lhe odiava. E assim os dias se passavam.
De novo.
E de novo.
E de novo...
Cada dia, a delegada via a escrivã virando outra pessoa, ao menos, uma que nunca conhecera. Não que Anita sequer conhecesse a mesma tão bem assim, mas notou as diferenças gritantes.
Há pouco tempo, coincidentemente, havia conversado com Matias por celular, relatou que Verônica tinha matado o outro enviado, que de fato, ela faria algo. Não sabia quando, nem como, mas faria. Receosa, comentou que chegou a conquistar a confiança da escrivã, mas isso já fora perdido.
Encarando as costas da morena, apenas com uma regata escura, via a mesma massagear sua nuca e tensionar os músculos.
Desgraçada.
*
Anita estava de plantão na casa de Verônica há algum tempo, escondida entre carros estacionados perto. Encarava a imagem da morena que casualmente aparecia pela janela. A loira entendeu que, felizmente, com a situação entre ambas, seria o melhor momento para finalmente acabar com isso. Afinal, ela tinha a vantagem.
Ao menos imaginava isso.
Verônica olhava para o carro caro e limpo pela sua janela, fingindo fazer qualquer outra coisa. As vezes, Anita era previsível. Não percebera nas primeiras duas horas, mas quando notou carros vindo e saindo e o mesmo parado, só conseguiu concluir que havia algo errado. Então, fez o que deu na telha. Deixou a casa ligada, com a televisão fazendo sons e iluminação, desceu discretamente pelos corredores de seu prédio e se escondeu entre os vidros da portaria, tendo uma visão melhor do carro.
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OBSCURO - Veronita. (Em pausa)
RomanceA vida pacata de Verônica não era mais tão entediante desde seu divórcio, que aprofundou a mesma em seu trabalho. Entre essas e outras, a presença da Delegada Berlinger era necessária em grande parte, já que mesmo contando com sua facilidade e boa c...