O brilho de seus pequenos olhos

× Capítulo 2 ×

Paro na mesma hora e abro os olhos, o som vinha de um beco escuro, apenas uma pequena luz podia ser vista de longe.
O choro estava alto e incessante, mas ninguém além de mim pareceu escutar.

Me levanto com dificuldade e sigo o som como em uma espécie de hipnose, seguindo a pequena luz que tremula. Ao chegar mais perto percebi uma vela acessa e ao lado da vela está um cesto, o choro vinha dali, com os bracinhos e as perninhas mexendo fervorosamente estava um neném.

Seu choro era estridente, o pequeno de aparentemente poucos meses parecia sentir algo. Me abaixo tentando examinar melhor aquele pequeno embrulho mas não consigo decifrar se é menino ou menina, apenas que seus olhinhos puxadinhos brilham sobre a pouca luz e seu cabelo preto é lisinho, ele era fofo mas não parava de chorar.

Olho de um lado para o outro mas não há sinal de mais ninguém ali naquela escuridão. Então pego o pequeno no colo. Apenas com uma fralda de pano e uma manta a sua volta estava com a pele fria.

Ele para de chorar e parece me examinar assim como eu. Ele é rechonchudo e não está tão sujo, sua fralda está pesada e não cheira muito bem, mas não parece estar sozinho a tanto tempo.

Ele esticou a mãozinha tentando tocar meu rosto, eu a peguei e a examinei, é tão pequenina. Meus olhos enchem de lágrimas novamente, sinto falta dos meus pequenos, queria saber como eles estão e queria saber como o Brasil está depois disso tudo.

Não foi uma boa ideia fazer um intercâmbio para o outro lado do mundo justamente quando tudo aconteceu, não podia ter esperado eu voltar pra casa ?

Então eu estava sozinha em um país diferente quando as pessoas começaram a cair mortas do meu lado. Lembro da gritaria, então tudo ficou sombrio.

Ali segurando aquela mini mão não consigo evitar a nostalgia, então me toco que já estou ali a alguns minutos e que provavelmente meu grupo já deve estar longe. Como voltaria sozinha pro alojamento e ainda com um bebê no colo ?

Decido ir atrás deles, quem sabe podem me ajudar ao que fazer com o pequeno. Dou um passo e então escuto uma voz que faz meu corpo todo congelar.

- Aonde pensa que vai com minha janta ?

Olho pra escuridão e de lá sai um homem de cabelo e barba grandes, iluminado pela pequena chama da vela é difícil descobrir onde está seu rosto em meio a tanto pelo e cabelo mas consigo perceber algo em suas mãos, é uma faca e bem grande por sinal.

Ele está limpando ela na blusa e sinto um cheiro bem familiar, álcool e sangue.

Ele se aproxima e eu me encolho segurando o pequeno com força em meus braços que começa a chorar novamente. Meu coração está ainda mais acelerado, penso em como sair dali, mas o velho fedorento está se aproximando cada vez mais dessa vez com a faca apontando para nós.

- O dia hoje está extremamente proveitoso, acabei de comer a mamãe e tava guardando o pequeno para amanhã, mas fui agraciado com outra mamãe.

A risada dele é alta e cruel, meus ouvidos doem. Penso em correr mas está escuro demais, a probabilidade de um tombo é enorme.

O velho continua se aproximando e o cheiro é o pior de todos.

- Aquela puta me satisfez de todas as formas possíveis e ainda implorou de joelhos que deixasse seu filho viver. Você acredita que as pessoas ainda tem esperança ? - ele cospe algo preto no chão então volta sua atenção pra mim - O mundo não era bondoso antes imagina agora, misericórdia não existe muito menos esperança. O mal corre em nossas veias desde que tudo começou e será assim no fim também.

O velho agarra meu braço e me faz cambalear pra frente, o bebê chora como se entendesse perfeitamente o que está acontecendo. Ele me analisa e passa a faca na minha bochecha virando meu rosto para si.

- Essa é nossa recompensa por seguirmos nossos extintos, por deixar nossa natureza nos guiar. Fui agraciado com uma estrangeira, você me será muito útil.

E então algo corta o ar e a mão que antes apertava meu braço ficou frouxa e caiu.

Uma espada acabara de decepar o braço do velho. Ao meu lado está Seok com a pele de aparência bronzeada naturalmente iluminada pela luz da pequena vela.

Seus olhos estão fixos no homem que cambaleia para trás em um grito sem som.

Então os dois vão pra escuridão, o barulho a seguir é algo indescritível mas o cheiro era claramente de sangue.