Capítulo 7- O plano

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Lourenço

Encarava o homem que eu mais odiava na face da terra com um charuto na mão, sentado no cadeirão como se de um trono se tratasse, um trono que não pertencia a ele, que era meu por direito.

— Irmão.— dei um sorriso amarelo e entreguei para ele o envelope de papelão castanho, Mário largou o charuto no cinzeiro entusiasmado,  rasgou o envelope sem cuidado e espalhou as fotos na mesa como se escolhesse amendoim. Beliscava a bochecha nervoso esperando que ele caisse na cilada, ele só precisava escolher a rapariga certa, ele precisava escolhê-la, ela era perfeita para o meu plano.

Mário havia pedido a minha ajuda para encontrar uma noiva jovem e saudável para ter um herdeiro rápido e continuar a sua linhagem, não só isso, como também para garantir que mantivesse o património do nosso pai em sua posse, pois o seu testamento era claro: apenas um homem, de seu sangue, poderia gerir os negócios da família e quando este viesse a falecer ou padecesse de uma doença incurável, apenas outro homem sangue do sangue do antecessor poderia continuar a sucessão. Isso significava que se Mário não tivesse um filho em breve, os negócios da família estariam em risco e muitos já aguardavam por este momento para fazer um golpe, é por isso que eu precisava agir antes disso, de forma singela e não intencional, fazendo com que todos acreditassem que eles próprios é que me colocaram no poder quando na verdade eram apenas marionetas do meu jogo.

— Todas elas são virgens?— perguntou como se fossem vacas novilhas para serem abatidas.

— Não, só duas delas.— respondi enojado trancando a mandíbula.

— Quais?— perguntou não parecendo se impressionar com nenhuma delas, apressei-me a mostrar as fotos das duas raparigas virgens tentando cativar a sua atenção.— Esta é Lola.— mostrei a rapariga de xiquenheta¹ e uma capulana² de tons azuis e vermelho cultivando a terra.— ela é filha de um dos nossos trabalhadores dos campos de chá e está na idade de casar.— Mário abanou a cabeça para os lados em reprovação, eu já sabia que ele iria vetar qualquer rapariga que tivesse alguma conexão com os nossos negócios, o que iria nos levar à última candidata:— E temos esta. — apontei.—O nome dela é Zahara.— arranquei a foto de Lola da mão dele para que se focasse completamente nela e da forma como se remexeu na cadeira dava para ver que o seu membro frouxo ficara imediatamente inquieto. Sorri disfarçadamente satisfeito com aquela reação, eu havia escolhido especialmente aquela foto pois sabia o quão primitivo aquele porco era, na foto ela estava a tomar banho no rio, seus mamilos erectos marcavam no vestido molhado e seus cabelos negros longos corriam pelas costas como um trajeto de mambas venenosas até ao cóccix, como ela era escultural.

— Ela não tem mãe, perdeu o pai recentemente e vive com a madrasta que está disposta a oferecê-la para quem pagar mais, sem devoluções.— continuei o discurso tentando aliciar-lhe mas não era preciso, Mário salivava enquanto devorava a coitada, se eu saísse da sala naquele momento tinha a certeza que ele se masturbaria com aquela foto e jorraria seu sémen por cima dela, queria matá-lo naquele mesmo instante, pessoas como ele não mereciam viver, mas mantive a calma com meu punho fechado controlando a vontade avassaladora de socar o seu rosto até não restar nem um dente em sua boca. Eu poderia esperar, eu só precisava esperar mais um pouco e toda a minha espera iria valer a pena, eu estava a um passo de...

— Eu vou ficar com essa.— Mário interrompeu meu monólogo entregando-me a foto de Zahara de volta, mantive o rosto impassivo mas comemorava internamente por tudo estar a ir de acordo com o meu plano.— Pode organizar tudo e fale com as suas irmãs, elas saberão como liderar a cerimónia do lobolo³.— assenti em silêncio e dei as costas para aquele tonto, ele nem imaginava o que lhe esperava.

Mas tudo quase foi abaixo quando Zahara tentou fugir no dia do casamento. Estava sentado ao fundo onde ela não pudesse me ver mas eu a via, todo o tempo: seu respirar pesado, o terror em seus olhos, o nojo quando olhava para Mário, suas mãos trémulas, as lágrimas que derramava disfarçadamente e quando se recusou a comer. Zahara era uma mulher extremamente expressiva, conseguia ler cada pensamento dela com as suas expressões faciais, como se a sua cara fosse um espelho da sua alma. E foi exatamente assim que eu percebi as suas intenções e qual era a sua rota de fuga antes mesmo dela levantar da mesa. Em parte eu já esperava por isso, depois de observá-la por pelo menos três meses haviam várias coisas que eu sabia sobre ela: que ela era aventureira, que adorava ler por cima de uma árvore estrondosa de frente para o rio, que não confiava em estranhos e não tinha muitos amigos, que era feroz e principalmente rebelde.

Mas antes que se perguntem o porquê de tê-la seguido por esse tempo todo, bem... eu poderia dizer mentir e dizer que era para verificar se ela era realmente a candidata perfeita para o meu plano mas a verdade é que eu não conseguia parar de apreciá-la desde o momento em que a vi, ela era como uma brisa fresca da manhã, saudosa e energética, queria tocar em seus cabelos e cheirar a sua pele, minhas mãos formigavam de tanta vontade que eu tinha de tocá-la.

— Senhor ajude-me por favor.— Zahara levantou-se cambaleando e correu para perto de mim, segurando-me pelo casaco com força desesperada, como se fosse o seu salvador, meu coração falhou uma batida assim que seus olhos encararam os meus e mesmo de noite, seu rosto resplandecia como um diamante.— Eu fui forçada a casar, eu preciso fugir mas eu não tenho dinheiro, eu tenho uma avó em Inhambane, será que o senhor poderia emprestar-me algum dinheiro para comprar o bilhete do machimbombo, quando eu chegar lá eu lhe pago de volta, eu juro, por favor.— as palavras saíam atropeladas umas nas outras, seus olhos pareciam assustados, engoli em seco com raiva, não dela, mas de mim mesmo. Como eu pude fazer isso com ela, se eu a deixasse fugir naquele instante, será que isso me faria um homem melhor? Será que me iria redimir de alguma forma?

— Tu não podes desistir agora, estás tão perto! — repetia o mantra tentando me recompor.— e serrando a mandíbula segurei em seus pulsos e arrastei-lhe de volta para o destino que eu mesmo traçei para ela.

— O que tu estás a fazer? Eu não posso voltar.— Zahara debatia-se em meus braços trémula, seguia firme sem olhar para ela, ignorando a poeira que seus pés faziam ao cavar buracos na areia, ela batia em meu ombro e arranhava a minha mão tentando soltar-se do meu aperto mas a dor irradiava para o meu peito, criando uma sensação estranha nas minhas entranhas, a culpa. — Larga-me por favor, eu não posso...— ela gritava sem parar, mas certo de que aquele era apenas um pequeno sacrifício para alcançar o meu objetivo, devolvi-lhe para o seu terrível destino.

— Obrigado pela ajuda irmão.— disse Mário recebendo-na com um sorriso largo, assenti sem olhar para trás, eu não poderia, se eu olhasse para ela uma vez que fosse, estava acabado, a culpa iria consumir o meu peito e estragaria tudo.

Enquanto ia embora, pisava o chão com força, tentando esmagar as lembranças que inundavam a minha mente, mas as últimas palavras da minha mãe ecoavam como um disco riscado na minha cabeça,  vezes sem conta:— Fá-los pagar e recupera o que sempre foi teu por direito, nem que tenhas que destruí-los, um por um.

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⏰ Última atualização: Jun 07 ⏰

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