Sábado. Um ótimo dia para dormir até mais tarde. É o que eu diria se não fosse pelas batidas incessantes na porta.
Quando minha impaciência vence a insistência de quem quer que esteja lá, eu levanto.
Abro a porta e encontro um Willian sorridente parado. O sol teria inveja desse brilho.
- Ei David, que belo dia, não? - Seu entusiasmo é palpável.
- Por que está tão cedo aqui em pleno sábado? - Não consigo esconder meu mau humor, também nem quero.
- Sábado? Não, hoje é domingo. - Ri alto.
- Domingo? - Olho para a tela do celular.
É realmente domingo. Quando foi que eu comecei a perder a noção do tempo?
- Acredito que vai gostar do motivo pelo qual eu vim aqui. Encontrei o lugar perfeito para montar nosso mercado. Na verdade eu já aluguei. - Explica empolgado.
- E no que eu posso te ajudar? - Pergunto já aceitando que não vou poder voltar a dormir.
- Então, está um pouco bagunçado lá e eu gostaria de saber se você não quer ir me ajudar a limpar.
Eu o encaro por alguns segundos.
- Tudo bem, só deixa eu me arrumar primeiro. Espere aqui.
Willian balança a cabeça e eu fecho a porta.
Quando ele me contou sobre essa ideia naquele dia, eu não imaginei que levaria tão a sério.
- Estou pronto. - Digo após abrir a porta.
- Vamos, vamos. Está um pouco bagunçado lá, mas acho que conseguimos arrumar até meio dia. - Explica.
Seguimos o mesmo caminho de sempre, mas em silêncio, o que me incomoda um pouco, sabendo que quem está do meu lado é o Willian.
- Algo para me contar sobre esse lugar que você alugou? - Eu o encaro.
- Bom, vejamos...
Ele parece pensar.
- Esse lugar pertencia a uma senhora que vendia produtos de sua fazenda também. Pelo que parece ela saiu poucos anos antes de eu vir pra cá. Na época nem mesmo o Dinkley vivia aqui.
Estou um pouco surpreso com essa última parte.
- Veja! Chegamos. - Chama minha atenção.
- Willian...
- Sim, David.
- Você disse que a antiga dona saiu daqui poucos anos antes de você chegar...
- Sim, foi oque eu disse. - Ele sorri.
- Agora me diz, quando você diz poucos anos, quanto tempo quer dizer?
- Ah, não sei, dez... vinte... algo assim.
A fachada toda destruída diz tudo. Não seria um exagero dizer que passou um furacão aqui.
- Esse lugar deveria ser interditado, é um perigo para as pessoas. - Olho em volta.
- Ah, para com isso David, você está exagerando. - Balança a mão.
Quase que imediatamente, a placa pendurada por um dos lados cai com tudo no chão. O estrondo faz com que as pessoas na rua parem assustadas.
- Bom, eu vou lá em casa pegar algumas ferramentas. Enquanto isso vai dando uma olhada lá dentro. - Willian me entrega um molho de chaves antes de sair.
Analiso o objeto em minha mão. Já estão bem gastos e eu não faço a menor ideia de qual é a chave certa.
Fico um tempo ali até conseguir abrir a fechadura. Pensando que não haveria mais nada em meu caminho, me deparo com a porta emperrada. No fim acabei tendo que empurrá-la com meu ombro.
O lugar está bem acabado, mas eu consigo imaginar como era antes da antiga dona sair. Não precisa ser um especialista em layout pra saber reconhecer isso.
Enquanto espero por Willian, começo a juntar em um canto alguns entulhos. Acabo dando um pequeno sorriso. Desde que cheguei aqui, o que mais fiz foi limpar entulho.
- O futuro tem cheiro de... mofo. - Willian tosse ao entrar.
Olho para ele que segura duas vassouras.
- Aqui, trouxe para você. Além disso, pode colocar esse monte de lixo na caminhonete ali fora. - Aponta para o veículo na rua.
- É seu? - Pergunto surpreso.
Willian dá um sorriso convencido.
- O interior nos proporciona algumas maravilhas, sabe.
- Sei... - Respondo o encarando.
- Aqui, pegue isso. - Me entrega uma vassoura.
- Mãos a obra, né. - Resmungo.
Enquanto vou varrendo o chão, Willian começa a levar o que quer que seja lixo para a caminhonete. Em pouco tempo conseguimos limpar a maior parte daquele antigo mercado.
Não é um lugar grande. Tem o formato de um L, com o balcão de madeira escura de frente pra entrada. Além disso há também o pequeno depósito para se guardar alguns produtos.
- Ei, fizemos um ótimo trabalho, não acha? - Pergunta Willian apoiado na vassoura.
- É, você tem razão. Nem acredito que já vai ser meio dia. - Respondo olhando para o relógio.
Mais uma vez quero te agradecer David. Sabe, por ter aceitado essa proposta do nada. - Diz olhando para mim.
Sou pego de surpresa por esse comentário.
- Que nada. Eu acho isso tudo só aconteceu porque você não desistiu de tentar. - Balanço a mão no ar.
Willian ri.
- Meu histórico de desistências é nulo. Apesar de que quase houve uma vez em que eu desisti de algo.
- Ah é? Me conta. - Peço. Sentando em um banquinho que há ali.
- Isso foi há alguns anos. 10 para ser mais exato. Nessa época eu já namorava a Ester, mesmo que seus pais não aprovassem nosso relacionamento.
- E o que vocês fizeram? - Fico surpreso com minha curiosidade a respeito disso.
Não sei ao certo porquê quero saber sobre o passado de Willian.
- Até então nada. Saímos as escondidas e só. O problema veio depois, quando ela acabou engravidando.
Arregalo os olhos. Tudo bem, eu sei que ambos têm duas filhas, mas não fazia ideia de que teriam vindo tão cedo.
Mas parando pra pensar agora, a mais velha não aparenta ter 10 anos, a história não bate.
- Eu sei porquê está fazendo essa cara, você percebeu né? - Sua pergunta me tira de meu devaneio.
- O que aconteceu depois?
- Ester foi expulsa de casa. Já tinha 18 anos, então para eles, ela já podia ir embora de lá. - Consigo sentir o pesar de sua voz.
Uma informação bem chocante para dizer o mínimo.
- Foi ai que viemos para cá. Conversei com um tio meu e ele conseguiu um emprego pra mim na fazenda de seu amigo. Trabalhei muito para ter um lugar onde nós 3 pudéssemos viver.
Willian dá uma pausa. Sinto que algo de muito ruim vem a seguir.
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Fios do Destino
RomanceComo sair de uma rotina cansativa e monótona? Essa é a pergunta que David vem se fazendo há um tempo. Como um robô em sua empresa, ele segue ordens e excede seus limites sem se importar com as consequências. Porém, ao encontrar repentinamente uma ca...