Capítulo 4

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Marina

Faltavam apenas uns dez minutos pra que chegássemos no apartamento da Thata e minha ansiedade crescia cada vez conforme os segundos iam se passando.

Tudo tinha que ser perfeito.

Ela merecia ter a surpresa perfeita para o Dia dos Namorados e eu havia planejado cada detalhezinho pra que fosse exatamente assim.

Sabrina tava certa, eu sou super perfeccionista e se alguma coisa der errado eu vou entrar em curto circuito ou dar uma pane, definitivamente vou ter um troço e com certeza cair dura, totalmente morta, no chão.

– Dá pra ouvir as engrenagens do seu cérebro funcionando – minha maravilhosa irmã gêmea fez o favor de se pronunciar e me dar o ar da graça de sua bela voz enquanto ainda devorava seu amado balde de pipoca (essa frase contém ironia).

– Cala a boca – respondi, mais agressivamente do que pretendia.

Isso sempre acontecia quando eu ficava muito bitolada com alguma coisa, toda vez que eu ficava muito fixada em um projeto e tinha essas paranoias sobre tudo ter que estar perfeito e não poder haver um único defeitinho sequer, por menor que ele seja, começo a externar minhas frustrações e descontar sendo extremamente grossas com as pessoas.

Um silêncio se instalou no nosso carro, sendo cortado apenas pelo barulho da mastigação de Brina (que continuava comendo a maldita pipoca), e comecei a me sentir culpada pelo modo como falei com a minha irmã. Afinal, era sempre ela que está do meu lado quando eu mais preciso, inclusive foi a única que se ofereceu pra me ajudar a organizar a surpresa da Agatha (além da Clara, minha melhor amiga e vizinha da minha namorada), e não é justo eu surtar pra cima dela por causa de uma coisa que é um traço tóxico meu.

– Me desculpa – pedi, não aguentando mais aquele silêncio ensurdecedor – eu não devia ter sido grossa e te mandado calar a boca.

– Tá tudo bem, Mari – ela falou, em um tom de voz relativamente tranquilizante – relaxa, eu sei que não quis ser grossa comigo e que esse é o seu jeito de demonstrar que tá muito estressada revendo cada detalhe do seu plano pra que nada dê errado – disse, voltando a comer sua pipoca logo em seguida, e eu sabia que ela não teva mentindo só pra que eu me sentisse melhor.

Esse era o lado bom de se ter uma irmã gêmea, passamos tanto tempo juntas que conhecemos cada aspecto da personalidade uma da outra, além de todos os segredos e de termos uma conexão única e especial que é apenas nossa. Sabrina me entendia de um jeito que ninguém mais conseguia.

– Valeu por me entender, Brina – agradeci, realmente me sentindo genuinamente grata por sua compreensão em relação a minha atual situação.

– Que isso, maninha – falou de forma relaxada, ou seja, seu tom de voz habitual – não foi nada demais – a loira idêntica a mim garantiu – eu sei o quanto você é dodói da cabeça e te aceito mesmo você tendo esse jeito maluquinho de ser – disse de um jeito brincalhão, arrancando uma risada do fundo da minha garganta.

– Filha da puta – murmurei audivelmente, ainda rindo um pouco da brincadeira dela.

– Você sabe que eu te amo – falou, se inclinando para a esquerda pra conseguir se aproximar de mim e, assim que alcançou seu objetivo, me deu um beijinho estalado e extremamente babado na minha bochecha.

– Nojenta – eu disse, fazendo uma careta e botando a língua pra fora – mas eu também te amo, coisinha irritante – respondi, sorrindo de forma inocente  – mesmo que às vezes você torre tanto a minha paciência e me tire do sério ao ponto de eu ter desejado ter te matado quando ainda estávamos dentro do útero da nossa mãe – completei, franzindo o nariz e balançando o rosto de uma lado pro outro em uma demonstração de carinho, já que eu não podia desviar o olhar da estrada pra não correr o risco de acabar batendo o carro.

Carro esse que levou meses e mais meses economizando dinheiro enquanto a gente se matava de tanto trabalhar pra que finalmente conseguíssemos pagar por ele.

Exatamente, Sabrina e eu somos tão ligadas que dividimos as prestações do carro (apesar dele estar no meu nome enquanto o apartamento tá no nome da Brina) e também dividimos as contas do apartamento em que moramos juntas pra podermos economizar e sair logo da casa dos nossos pais, já que arcar com as despesas que um apartamento gera sozinho ia ficar muito pesado. Então, ao invés de cada uma alugar um apartamento minúsculo e pagar um aluguel absurdo de caro por causa disso, decidimos comprar um apartamento, morar juntas e dividirmos todos os custos entre a gente.

Por isso, toda vez que quero ficar sozinha com a Thata, nós vamos pro apartamento dela e eu acabo dormindo lá mesmo. Eu tenho até algumas roupas, calcinhas e sutiãs guardadas lá, ganhei até uma gaveta no guarda-roupa dela pra guardar as minhas coisas.

– Awwwwn – minha gêmea fez – assim você me emociona, praguinha do meu coração – falou, fungando e fingindo estar prestes a cair no choro.

– Cala a maldita boca e termina logo essa pipoca – rebati, rindo do jeito engraçado dela enquanto um sorriso brincalhão surgia em meus lábios.

– Sim, senhora! – Sabrina exclamou e pude ver ela batendo continência pelo canto dos olhos.

Novamente, o silêncio se instalou entre nós, mas dessa vez era um silêncio confortável que dominava o ambiente do carro.

Levou apenas mais uns cinco minutos, mais ou menos, pra finalmente chegarmos no apartamento da Thata. Quando o prédio surgiu no meu campo de visão, voltei a sentir naquele instante a mesma ansiedade e o mesmo nervosismo que tava sentindo antes de deixar o meu apartamento e entrar no carro. Todos os pensamentos inseguros e temerosos de que todo o meu planejamento fosse por água abaixo e minha surpresa desse errado, indo tudo pro ralo.

Respirei fundo antes de estacionar do outro lado da rua e comecei a morder o meu lábio inferior novamente assim que nós atravessavamos a rua, entrávamos no prédio, pegávamos o elevador e subiamos até o andar em que ficava o apartamento da minha namorada.

As portas do elevador se abriram e nos dirigimos para o apartamento de Clara, que já nos esperava recostada no batente da porta com os braços cruzados e um sorriso gentil, sem mostrar os dentes, estampado no rosto.

– Uau, chegaram rápido – a mulher de pele parda, olhos azuis cabelos pretos curtos, um pouco acima dos ombros, e cacheados disse, fingindo olhar a hora em um relógio imaginário em seu pulso e fazendo cara de espantada – não faz nem trinta minutos que te mandei mensagem e olha que ainda esperei fazer dez minutos que eles haviam saído.

– A pé de chumbo aqui que dirigiu – Sabrina falou, abraçada ao seu balde de pipoca de uma forma tão amorosa que parecia que eles estavam casados há vinte anos.

– Imaginei – minha melhor amiga respondeu para minha irmã e as duas riram da minha cara.

– Será que dá pra vocês pararem de questionar a forma como eu dirijo pra nós podermos começar a organizar a surpresa pra minha namorada? – perguntei, cruzando os braços e arqueando uma de minhas sobrancelhas, lançando pra elas um olhar incisivo.

– Sim, senhora! – exclamaram em uníssono e revirei os olhos em resposta.

Presente de dia dos namorados atrasadoOnde histórias criam vida. Descubra agora