A luz da manhã recém chegada invade o quarto pela pequena fecha da persiana branca, clareando diretamente as minhas pálpebras fechadas. Entreabrindo gradualmente meus olhos, a imagem do espaço torna-se nítida aos poucos. Tateio a pequena mesa lateral em busca do meu celular.6:49
Apesar precisar estar no hospital apenas às 8:30, decido adiantar os procedimentos matinais para a minha saída.
Sento-me no colchão macio e espreguiço o corpo, tentando dispersar toda a tensão da noite mal dormida. Pensar no sono conturbado faz-me lembrar da causadora dele.
A filha de meu quase chefe pareceu tirar minha paz sem a necessidade de sua presença. Até mesmo em meu aposento particular, a morena dos olhos profundos arrancava toda a sanidade que, por tantos anos, orgulhava-me de possuir.
Ainda parece inacreditável a sequência de acontecimentos do jantar passado. Pensar sobre causava-me uma enxaqueca infernal.
E se alguém tivesse nos visto? O que o seu pai, claramente pouco tolerante, faria?
Foi inaceitável ter me deixado levar por aquele beijo. Talvez, se aqueles lábios não fossem tão macios e saboroso, se o seu gosto não fosse absurdamente delicioso de provar ou se aquele infeliz perfume crítico não rouba-se completamente o controle dos meus sentidos, eu tivesse conseguido reagir contrariamente à sua ação inesperada.
Mas não, rejeitar aquela mulher parecia humanamente impossível.
Balanço a cabeça, em busca de limpar minha mente daquelas memórias confusas e sigo para o banheiro. Opto por um banho gelado, que acelera repentinamente o metabolismo lento pelas horas de sono, e início todo o processo de higiene pessoal diária.
Saindo do espaço, dirijo-me ao armário cinza, já com todas as minha roupas organizadas, e procuro por uma das minhas inseparáveis camisas sociais. O conforto e a elegância oferecidos por esse tipo de peça sempre me atraiu bastante.
Escolhendo uma azul caribe de seda, combino-a com uma calça cintura alta de tecido crepe escuro e um cinto de mesma tonalidade com detalhes dourados. Nos pés, decido por uma sandália de salto fino, também preta.
Desde os primeiros anos de formada, sempre esforcei-me para apresentar um estilo sério e elegante. Apesar de retrógrado, a imagem, as vezes, pesava mais do que a competência, então, eu presava por exibir os dois.
Já com uma maquiagem leve no rosto e, devidamente, perfumada, recolho meus pertences essenciais para o trabalho e me dirijo ao elevador. Pelo horário, meus colegas já deveriam estar percorrendo o mesmo caminho até o saguão.
Dentro da caixa metálica, revisto todo o traje escolhido sobre o espelho central até sentir a movimentação vertical parar, de repente, alguns andares abaixo. Viro-me para frente e observo as portas se separando e permitindo a visão de uma mulher atenta ao celular em suas mãos.
Seu cabelo de corte médio, composto por madeixas claras e sedosas, possui um movimento atraente devido à corrente de ar presente no corredor espaçoso.
Após breves segundos, finalmente parece perceber que a sua solicitação pelo transporte foi atendida e levanta o olhar até encontrar o meu.
Por um momento, penso ter visto surpresa em suas íris.
— Bom dia. - emito o cumprimento em educação.
— Bom dia. - responde sucinta ao entrar no espaço pequeno.
Encostada na parede lateral, observo-a guardar o aparelho, antes em sua mão, dentro da bolsa de couro caro. Seu olhar verde claro direciona-se novamente ao meu rosto e parece efetuar uma breve análise silenciosa. Sinto-me um pouco desconfortável sobre sua vista julgadora, e remexo em minha posição.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Yatra - Um Amor Inesperado
RomanceEm busca de melhorias no precário sistema de saúde do seu país, Helena Castellani, uma renomada cirurgiã cardiovascular hispano-brasileira, abandona o seu cargo como chefe do setor de cirurgia no Brasil e se dirige à India quando um complexo hospita...