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_ Alguém já contou pra você que tu dorme com a boca aberta? _ Marcus disse tranquilamente sentando ao pé da minha escrivaninha lendo um livro laranja.

Abri lentamente os olhos e percebi que desta vez estava em minha casa, no meu quarto.

_ O que você tá fazendo aqui? _ perguntei, esfregando os olhos.

_ Bom, sua mãe precisou sair então pediu que eu cuidasse de você. Eu e a Desteny.

_ Tá bom. Já pode desamordaçar minha mãe. Ela nunca deixaria minha vida nas mãos da Desteny.

Desteny era histérica. Muito histérica. Sempre que eu ficava sem ar perto dela ela fazia disso um enorme problema; o que poderia acabar piorando a situação.

_ E ela não deixou. Ela deixou nas minhas mãos. A Destany só está aqui pra te ajudar com coisas que eu não vou poder. _ ele sequer me encarou.

_ E porquê ela deixaria minha vida nas suas mãos?_ estreitei os olhos.

_ Sei lá. Talvez seja porque eu salvei sua vida mês passado.

_ Mês passado? _ arregalei os olhos. Havia pedido completamente a noção do tempo.

_ Pois é.

_ Porquê vocês me deixaram desmaiada por tanto tempo? _ meu coração de repente pareceu parar e no segundo seguinte voltar a bater. Rapidamente.

_ Ei, tá tudo bem? _ ele se aproximou da minha cama e agarrou minha mão _ não desmaia de novo, por favor. Respira, vai. _ ele me entregou um copo com água e tremendo, eu tomei.

_ Obrigada.

_ Não me agradeça. Você precisa se acalmar. Não pensa no quanto tempo você perdeu desmaiada nem em como você está atrasada com as aulas e que se continuar assim provavelmente vai repetir de ano.

_ Era pra me fazer pensar menos? _ arqueei a sobrancelha e pela primeira vez, ele abriu um leve sorriso. _ cadê a Desteny?

_ Foi falar no celular.

_ Espera, eu estou desacordada a quanto tempo?

_ Quatro semanas.

_ Eu estou a quatro semanas sem tomar banho? _ arregalei os olhos e pulei da cama, cambaleando logo em seguida e caindo de volta na cama.

Senti todos os membros do meu corpo estalarem de uma vez e me lembrei de que provavelmente, teria que fazer algumas secções de fisioterapia.

_ Tenha calma, garota. A pressa é inimiga da perfeição. _ ele disse calmamente enquanto voltava a abrir seu livro.

Revirei os olhos e voltei a me levantar.

(...)

_ Me sinto tão melhor agora _ saí do banheiro com um sorriso, achando que Marcus ainda estava ali. Mas não.

Olhei ao redor do quarto a ver se havia algum sinal dele e encontrei um post it no meu espelho.

Removi-o, achando que ele tinha escrito algo bonitinho, mas eu devia saber que não.

'Tchau'.

Era a única coisa escrita no post it. Revirei os olhos com tamanha ignorância dele. Se ele vai ficar cuidando de mim a gente vai ter que trabalhar nisso.

Perdida em meus pensamentos, me surpreendi ao ver Desteny entrar no quarto com uma bandeja de comida.

_ Amiga _ ela me apertou em seus braços e destrubuiu beijos por meu rosto._ eu nunca senti tanto a sua falta. Você nunca ficou desacordada durante tanto tempo.

_ Pois é. _ dei com os ombros. Não queria pensar no facto de que não estava melhorando. Não hoje.

_ Ainda na fila do transplante né?

_ É.

_ Vai dar tudo certo amiga. Eu tenho orado por você. Deus vai te ajudar.

Eu sorri. O nome da Destany não combinava em nada com o que ela acreditava e por muitas vezes eu zoei ela por isso.

Ela era cristã. Sempre me incentivava a orar e as vezes eu orava junto com ela. Mas eu não sabia se conseguiria acreditar em alguém que não vejo.

Ela era completamente devota a Deus. E eu admirava o quanto ela parecia feliz assim; o quanto ela se dedicava.

Ser feliz não parecia ser um enorme esforço pra ela.

Mas nem sempre foi assim.

_ Bom, você ficou semanas se alimentando pela veia então provavelmente nem conhece mais a sensação de ter comida na boca. Se alimente.

_ Você sabe onde foi o Marcus?

_ Ele disse que precisava sair. Só isso. Mas sua mãe chega daqui a pouco.

_ O que você sabe sobre ele?

_ Ele quem?

_ O Marcus.

_ Nada que você também não saiba. Sei que ele trabalha em uma bomba de gasolina, tem notas excelentes e é um ogro. Frio, calculista e sombrio. Mas no fundo ele parece ser legal. Porquê a pergunta?

_ Sei lá. Ele desperta curiosidade em mim.

_Val, tudo desperta curiosidade em você. _ ela sorriu.

_ Eu sei. Mas eu nunca fiquei tão curiosa. Tipo, porquê ele ainda estava na escola naquele dia se ele sabia da passagem? E porquê que de todo mundo, ele decidiu me ajudar? Além disso, tenho a certeza que ele tem coisas melhores pra fazer do que ficar aqui cuidando de mim. Com quem ele mora? Ele tem amigos? Porquê anda sempre sozinho?

_ Calma amiga. Guarda essas perguntas pra ele quando vocês voltarem a se ver.

_cEle quem? _ minha mãe perguntou da porta e logo a seguir me abraçou ternamente.

Passamos o resto da noite conversando e rindo muito. Até que, pelo cansaço minha mãe adormeceu e Desteny também.

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Todo O Sangue Que Meu Coração Não Pôde BombearOnde histórias criam vida. Descubra agora