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— Me desculpe, Miranda — Andreah começa a falar nervosa com receio — Você está fragilizada, eu não deveria ter beijado você.

Miranda passa as mãos no rosto e ainda sem saber como agir, ela segura firme o volante. Com o olhar aturdido, Andreah vagueia suas íris por alguns longos segundos e se despede com um tímido tchau para Miranda que nada responde.

A porta do carro é fechada, então Miranda dá partida sem conseguir pensar em nada. Ela apenas dirige focada nas ruas em uma mente completamente silenciosa como há muito tempo não esteve.

O barulho da chave girando em sua porta grande e detalhada parece ecoar por todo quarteirão. Miranda solta sua bolsa em cima da primeira mesinha que encontra, tira os sapatos, abre o cinto da sua calça e permite que seu corpo se acomode de uma melhor maneira no sofá. Com a cabeça pendida para trás, em direção ao teto, ela fecha os olhos e a imagem do beijo que deu em Andreah vem como flashes fortes em sua mente. Ela leva sua mão para seus lábios, delicadamente ela vagueia com as pontas dos dedos neles. Ela suspira ainda tentando saber o que pensar sobre o que aconteceu. Ela recorda do quase beijo que iria dar em Andreah no seu quarto em frente à cômoda onde revelou as coisas que havia roubado para Andreah. Ela recorda do selinho que a garota deu nela sem controle de suas emoções. E então percebe que queria esse beijo. Ela busca na mente o que a levou a ser sempre tão hostil com a garota que só estava ali sempre tentando dar o seu melhor, ela percebe o quanto apenas a presença da garota lhe incomodava por nada. De alguma maneira ela percebe que parece que queria esse beijo muito antes de querer.

O sorriso sem mostrar os dentes aparece no semblante sereno ao recordar da garota na sessão de terapia com ela. Ela pensa nos momentos em que mais lhe doía a alma, a Andreah apertava a sua mão relembrando que estava ali com ela. Mas, ela pensa também o quanto Andreah é apenas uma menina tentando sobreviver às adversidades da vida adulta e ela é uma velha frígida e cruel que todos correm dela. Por que Andreah faria o contrário? Ao invés de correr com medo dela, corre em direção a ela? E se Andreah não for apenas uma menina empática e sim que viu vantagens e uma brecha para entrar em sua vida para obter vantagens em cima da sua fortuna? Andreah não tem nada, Andreah não é ninguém, e Miranda nunca deu um motivo sequer para a garota gostar dela. Como a Miranda vai entender que tudo que Andreah vem fazendo por ela não é puro interesse de uma oportunista que viu uma grande chance de se dar bem na vida?

A mente da editora parece tão confusa, ela não sabe muito em qual linha de pensamento se apegar. Como um sentenciado no corredor da morte, ela se arrasta para o seu quarto, confusa.

(...)

Andreah se analisa na frente do espelho com um brilho diferente no olhar, na noite anterior ela mal conseguiu dormir pensando no beijo que ela e Miranda deram. E hoje, em particular, ela quis tentar se arrumar melhor para ser bem vista por Miranda, mas as roupas que ela tinha não eram novas e muito menos de grife, então fez o que pôde. Em seus cabelos, ela fez uma trança de lado, com atenção cuidou da sua franja para que não desse frizz, o que não foi muito difícil, já que os produtos de cabelo que Miranda havia comprado para ela estavam ajudando seus cabelos a ficarem mais alinhados, ela percebeu a mudança.

Ansiosa, ela passou um batom de tom suave, apenas para dar uma cor a mais, o que era muito raro dela fazer. Nos olhos, ela passou rímel, ela não percebeu, mas apenas aquilo nos olhos os deixou ainda mais vivos e intensos. De calça jeans, uma blusa preta de gola alta ela dar uma última olha do espelho desejando ser mais magra e com menos seios, ela pega seu casaco e bolsa e corre para o metrô. Ela não pode se atrasar de maneira alguma, ainda mais hoje, depois do que aconteceu no dia anterior.

Esbaforida, ela chega à Runway, mas o sorriso largo está em seu rosto. Emily revira os olhos, não entende porque mesmo diante do caos que é a Runway, Andreah parece sempre tão feliz.

Não demora muito para Miranda chegar ditando suas ordens sem parar, ela para em frente à Andreah, umedece seus lábios e solta seu casaco e bolsa em cima da mesa da garota que está visivelmente nervosa. E o dia se desenhou como era de se esperar, Miranda fingindo que nada aconteceu, e Andreah respeitando as escolhas da Miranda. Mas, o que Miranda não percebeu é que durante todo o dia ela não sentiu aquele vazio dentro de si que lhe desafiava a roubar para que se sentisse um pouco viva.

— Miranda, Nigel já está com tudo pronto. — Andreah informa sempre tão tímida. Miranda mais uma vez bate os olhos em Andreah, nos lábios que outrora estiveram dançando com os seus. Seu coração parecia gritar alguma coisa que ela não conseguia ou não queria entender. Ela apenas balançou a cabeça em concordância.

Não demora muito para Miranda logo se dirigir para a sala de Nigel, Andreah é claro, lhe acompanhou com a caneta e bloco em mãos.

Enquanto a editora, Nigel e sua equipe mexiam em roupas aqui, outro acolá, acessório aqui, outro ali. O ambiente estava repleto de tecidos luxuosos, manequins e sketches pendurados nas paredes, criando uma atmosfera vibrante e criativa, Andreah fazia as anotações necessárias. Sempre muito atenta a sua tarefa resignada.

— Eu preciso daquele loyalty da semana passada. — Miranda se vira para Andreah ordenando.

A garota balança a cabeça em concordância e imediatamente vai à busca do que Miranda pediu.

— Você viu como ela se veste? Jeans e trança de lado? Parece que saiu de uma revista de moda dos anos 90 em um mundo paralelo onde ser cafona era moda. É o nosso terror diário. — Ele sorri debochado.

— Sim, ela realmente não tem noção. Totalmente fora de lugar aqui. — Jocelyn complementa rindo e incentivando o colega de trabalho.

— Acho que alguém precisa dar umas dicas de moda para ela. Talvez um manual de estilo básico. — Ainda sorrindo, Nigel devolve.

— Nigel! — Miranda adverte com um sorriso e balançando a cabeça em negação pela crueldade do amigo.

— Ai Miranda, você disse que essa garota não duraria uma semana e já estamos há meses assistindo essa cafonice ambulante.

Andreah pigarreia tentando se fazer notada. Miranda percebe os olhos da garota cheios de lágrimas em uma tentativa de disfarçar que está tudo bem.

Ela entrou na sala, tentando manter a compostura, mas a dor era evidente em seus olhos. Ela entregou o loyalty a Miranda, evitando contato visual, ela estava constrangida e envergonhada. A sala ficou em silêncio por um momento, como se todos tivessem sido pegos em flagrante.

Andreah voltou para o seu canto perto da parede, mas, como uma pessoa altamente emotiva, seus olhos ainda insistiam em avermelhar e manter-se com lágrimas.

— Ah, Andreah, não leve a sério. Só estamos brincando. — Nigel pega um lenço Hermès e envolve no pescoço do manequim que estão montando o look.

Andreah apenas balança a cabeça em concordância aceitando o que vier deles. Ela sabe o seu lugar de subordinada, e que o lado mais fraco é o dela, principalmente porque ela precisa muito desse emprego. Se ela falasse algo poderia lhe prejudicar, ainda porque Miranda também estava rindo junto com eles.

Dentro de si, Miranda estava sentindo o gosto amargo daquela situação, ela sentia que Andreah estava ferida, e sabia que poderia ter defendido a garota pedindo que a respeitassem, mas o embate de permanecer sendo a chefe impassível e insensível falou mais alto que a vontade de proteger a Andreah. O ambiente se recuperou lentamente, mas a tensão permaneceu no ar.

Na penumbra do seu olhar.Onde histórias criam vida. Descubra agora