Já fazia um mês. Um mês desde que Karla estava por conta própria. A morte repentina de seus pais, há cerca de dois anos, a forçou a se juntar a uma gangue do bairro. O que mais ela poderia fazer? Tinha apenas 15 anos e não podia se defender nem se sustentar. Eles eram a única opção para sobreviver, e ela não tinha escolha a não ser obedecer a tudo que quisessem, desde que isso significasse comida e abrigo.
Mas já fazia um mês que ela havia fugido da gangue. Eles a abusavam constantemente, tanto física quanto mentalmente, e ela sabia que seus pais não a queriam vivendo assim. A própria Karla também não aguentava mais aquela vida.
Então, uma noite, ela reuniu coragem e simplesmente fugiu de casa, jurando para si mesma que nunca mais voltaria. Ela se respeitava e respeitava a memória de seus pais o suficiente para nunca retornar. Levou algum tempo para que sua razão acompanhasse o seu coração, dando-lhe a força para partir de vez.
Estava horrorizada, sim, mas também se sentia finalmente livre do controle sufocante da gangue. Não precisava mais obedecer a eles. Não precisava mais sofrer abusos. Não precisava mais ser algo que não era. Na verdade, teria que mudar de identidade. Não podia correr o risco de ser encontrada pela gangue assim que percebessem sua fuga.
A decisão impulsiva de fugir não deu a Karla tempo suficiente para planejar o próximo passo. Sem destino específico, ela apenas seguiu andando pela noite, o ar carregando o perfume pungente da liberdade recém-conquistada.
[...]
— Oi, Lauren. — Mike disse para sua filha ao telefone. — Estou indo naquele mercado do outro lado da rua do trabalho e liguei para ver se você queria alguma coisa?
— Oi, pai! Uhum, se você puder comprar aquele cereal sem açúcar para mim, seria ótimo.
Mike revirou os olhos.
— Talvez eu possa pegar umas papilas gustativas para você também.
— Ha ha ha. — Lauren disse sarcasticamente. — Muito engraçado. Mas obrigada! Eu deveria voltar para a lição de casa agora. Te vejo daqui a pouco, tchau.
— Muito bem! Tudo bem, estarei em casa em breve. Tchau. — Mike então desligou o celular e colocou-o no bolso da calça jeans. Não pôde deixar de sorrir com a brincadeira entre ele e sua única filha. Desde a morte da mãe de Lauren no parto, Mike jurou que faria tudo o que pudesse para criar uma vida boa para ela. Afinal, ela era a coisa mais próxima de Clara que ele tinha agora e ele a amava todos os dias dos 18 anos que ela estava viva com cada fibra do seu ser, e ele continuaria a amá-la pelo resto da vida e além disso. Não havia um dia em que ele sentisse nada além de amor por sua filha, independentemente do fato de ela ter levado embora o amor da sua vida. Lauren era o amor da sua vida agora e ele faria qualquer coisa por ela. Ele tinha uma carreira muito bem-sucedida como gerente de uma empresa de construção e tinha orgulho de dizer que podia fornecer à filha tudo e qualquer coisa que ela precisasse, sem nenhuma preocupação.
Ele sentia tanta pena por nunca ter conseguido encontrar outra pessoa para Lauren. Simplesmente não conseguia se imaginar com outra esposa. Seu coração não estava aberto a isso e ele se culpava por Lauren ser filha única. Enquanto ele estava no trabalho, ela não tinha nenhum familiar para lhe fazer companhia. Suas amigas, Dinah, Ally e Normani, eram ótimas, mas não eram sangue do sangue dela. Não havia entre elas o vínculo que só os genes podiam criar.
Era uma noite fria e escura, e Mike tremeu enquanto apertava o casaco em volta do corpo. Ao se aproximar do mercado, percebe um movimento no canto do olho e se vira para olhar. Uma menina, da mesma idade de Lauren, estava sentada no chão frio, coberta por um cobertorzinho miserável em volta de seu corpo frágil e minúsculo. Era difícil não pensar em Lauren ao olhar para aquela pobre garota. Ela era hispânica, mas ele não sabia ao certo qual era sua etnia.
O instinto fraternal tomou conta dele enquanto se aproximava da menina. Quanto mais perto chegava, mais evidente ficava o quanto ela parecia doente, suja e exausta. Seus cabelos longos e escuros estavam embaraçados e despenteados, seus ossos estavam à mostra, e a cavidade das bochechas e o olhar morto em seus grandes olhos castanhos, cheios de medo, sugeriam desnutrição e terror absoluto. Seu corpo, coberto por roupas sujas e rasgadas, tremia levemente com o vento que começava a soprar.
Mike ergueu as mãos em sinal de rendição enquanto se curvava cuidadosamente na altura dos joelhos para ficar na altura da menina, mas mantendo alguma distância, mostrando que não queria machucá-la. Ainda assim, ela apertou o cobertor em volta de si e se afastou um pouco mais do estranho.
— Oi, querida. — ele disse o mais gentilmente possível. — Eu não vou te machucar, eu juro. Posso perguntar se você tem algum lugar para ficar? Apenas balance a cabeça para sim ou para não.
Ela balançou a cabeça negativamente, tão suavemente que Mike mal percebeu.
— Okay. Você tem algum dinheiro?
Mais uma vez, ela balançou a cabeça negativamente.
— Querida, você não pode ficar aqui esta noite. O tempo só vai piorar.
Mike ficou surpreso ao ouvi-la falar. Sua voz era baixa e assustada, combinando com sua aparência frágil.
— Eu não tenho nenhum outro lugar. — uma forte rajada de vento bateu e a menina cerrou os dentes com força.
Mike imediatamente tirou o casaco e segurou-o na frente dele.
— Aqui. — ele disse. — Por favor, pegue.
Ela hesitou, mas seu corpo implorando por calor forçou suas mãos a pegá-lo.
— Obrigada. — ela sussurrou antes de deslizar os braços no casaco folgado, seu corpo agradecendo pelo calor recém-encontrado. Ela podia sentir o cheiro do gentil estranho no casaco, e esse foi o maior conforto que teve em 2 anos.
De jeito nenhum Mike a deixaria sozinha. Era apenas uma criança... não tinha mais idade que Lauren. Como ele se sentiria se fosse Lauren nas ruas sozinha e ninguém tentasse ajudar?
— Quer ficar comigo e com a minha filha esta noite? Ou pelo tempo que você quiser. — Mike nem sabia de onde surgiu a ideia. Sua boca falava sem que seu cérebro sequer pensasse.
— O quê? — os olhos da garota se arregalaram de surpresa. Ela nunca havia recebido nenhum tipo de compaixão de ninguém. A maioria das pessoas apenas a olhavam como se fosse lixo na rua, o que, de certa forma, era exatamente como ela se sentia às vezes.
— Querida, como pai, eu me recuso a te deixar sozinha aqui fora. Se você quiser, será só por uma noite... sem compromisso. Você pode ir embora logo cedo de manhã, se quiser, e está tudo bem, mas esta noite, eu não posso te deixar aqui.
Olhou para ele com uma expressão indecifrável em seus olhos castanhos. Seus instintos gritavam perigo, mas seu coração dizia para aceitar a oferta dele. Sabia que ele estava certo. Ela não ia sobreviver naquela noite. Inferno, ela estava lutando para sobreviver o mês todo. Não sabia por quanto tempo mais aguentaria.
— Eu não sei o que dizer.
— Diga sim. Eu prometo que não vou te machucar de jeito nenhum e, se você mudar de ideia a qualquer momento, não vou te impedir de ir embora.
— Eu nem sei o seu nome. — ela respondeu.
Mike deu uma risadinha.
— É Mike. Mike Jauregui.
— Camila. Meu nome é Camila.
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An Encounter - Português (Camren)
FanfictionKarla não aguentava mais. Não podia continuar na gangue, sofrendo todo dia com os maus-tratos, mesmo que isso significasse sobrevivência. Então, uma noite, ela fugiu, prometendo a si mesma e a seus pais falecidos que nunca voltaria. Mas a vida nas r...