08 | cocaine

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É, definitivamente, nunca irei conseguir ficar sóbria.

Bato a porta do carro e sinto minhas pernas por um momento fraquejar, me obrigando a encostar numa parede suja qualquer para respirar. Algo dentro de mim parece gostar dessa tortura, das mãos trêmulas, do suor, da sensação de boca seca. Estou tão fodida que parece que sofrer, é uma boa opção.

Deixo meus passos me levar até a rua escura que eu já estava tão familiarizada. O lugar é tão familiar, as casas mal cuidadas com o gramado grande, os trailers cheirando a xixi e cigarro, cachorros latindo e conversas sendo jogadas fora na calçada mal iluminada.

A rua estava como sempre: suja, mal cheiro, mas tão familiar.

Paro em frente à porta e enfio as mãos trêmulas dentro do bolso, sentindo as pedras minúsculas de heroína que não durará uma semana. Meu coração bate mais rápido agora, mas por um motivo diferente. Sei que em breve, toda essa maldita dor e frustração irá sumir como um borrão distante.

Dou três batidas na porta enferrujada, ouvindo por um momento o rock alto e antigo que saía de dentro do enorme trailer.

— Ah, Billie. — a voz feminina e minimamente rouca ocupou meus ouvidos. — Você mudou muito desde a última vez que te vi, está mais forte, mais bonita.

A última vez que vim aqui foi exatamente pelo mesmo motivo, drogas. Porém, exagerei na dose e como estão cansados de saber, fiquei na reabilitação.

— Obrigado, Odessa. — mordo o lábio inferior com uma certa força. — Posso entrar?

— Mi casa, su casa, gata. — deu espaço para que eu podesse entrar enquanto levava um baseado até os lábios.

O trailer nunca muda, quer dizer, quadros antigos, um sofá vinho com um abajur ao lado, uma mesinha no centro com um cinzeiro e uma televisão desligada logo à frente. O lugar cheira a álcool e ovo frito, provavelmente sua janta, já que há os dois na pia no outro cômodo.

— Senta aí. — ordenou, se jogando no sofá e tirando um isqueiro do bolso, acendendo o baseado.

Sento no sofá confortável, aproveitando para me servir uma dose de Dreher. Não gosto de beber, mas por que não?

— Como anda sua vida, Billie? — encostou-se e esticou o braço por cima do sofá, brincando com alguns fios do meu cabelo.

— Boa. Quer dizer, não tem muito o que falar. — forço um sorriso e dou um gole curto na bebida. — Vi que reformou a cozinha.

— A polícia parece amar essa rua, uma boa aparência esconde coisas ruins. — desceu os dedos até minha clavícula.

Uma boa aparência esconde coisas ruins.

— Por que veio me ver em uma sexta à noite? Com toda certeza não foi para pedir dinheiro. — riu, tragando o baseado devagar.

Me sinto uma tola em vim aqui só quando preciso de drogas ou de uma distração. Odessa é como um colo amigo, minha traficante com benefícios. Conheci ela em uma boate, quando ainda estava entrando no mundo da fama. Ela me apresentou o paraíso – heroína. – e cá estou eu.

— Fala, meu bem, não fica tímida. — se aproximou, assoprando a fumaça na minha direção. — Quando saímos daquele lugar, pensamos que estamos curados, que vamos conseguir recomeçar e vamos viver como filhinhos mimados de vereadores. — riu. — Mas é um conto de fadas, uma mentira, acreditar nisso é escolher... Se matar.

— Você parece que ler meus pensamentos. — encosto a cabeça no sofá, aproveitando sua mão gelada acariciando meu pescoço. — Eu preciso de mais, D. Preciso de mais pílulas, mais tudo.

dopamina | billie eilish Onde histórias criam vida. Descubra agora