O interrogatório

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Pov Daniela:
Devia pelo menos ter umas duas horas que eu estava esperando sentada naquela sala, sem falar com ninguém naquela delegacia, eles estavam me deixando esperando na tentativa que rachasse. Falasse alguma coisa ou entrasse em pânico, mas depois de mais de quarenta minutos naquela sala cinza e fechada, eu só conseguia pensar em o quão sufocante aquele amontoado de cinza escuro numa sala tornava o ambiente extremamente desconfortável. Tinha somente uma mesa na sala, uma cadeira, um copo de água. Um médico assim que entrei havia vindo me examinar e limpou meus machucados do espelho que explodiu em mil pedaços e havia enfaixado os dois pés dizendo que era para eu manter os dois pés longe do chão enquanto estivesse cicatrizando. Como se isso fosse possível.... Eu ia andar como? Me deram uma blusa moletom do Bope operações especiais com a faca da caveira estampada bem grande, não haviam me entregados minhas coisas e eu mal podia esperar pra olhar para meu celular para saber se Dinho estava bem, se eu ainda conseguiria saber o paradeiro de minha irmã e a indignação começou a preencher meu corpo. Realmente o tal capitão nervosinho estava certo, como aquele cara teve a coragem de me largar lá sem mais nem menos? Se eles estavam o procurando era provável que não estava na pilha de corpos caidos no andar de cima. Mordi meus lábios nervosa reelebrando a cena enquanto um tal sarjento lá me arrastava para cima o que me gerou um belo ataque de pânico. Eu nunca havia presenciado ou visto pessoalmente o banho de sangue que ae alastrava por aquele morro e quando fui levada para dentro da viatura pude ver aonde infernos eu me metera. Lá em cima do quarto que eu acordara era basicamente um covil de drogas, um laboratório de drogas realmente pesadas onde eles estavam profuzindo o que deduzia ser K9 e tinham varios produtos químicos em cima das mesas sendo juntasos e luzes de laboratórios iluminando o processo de mistura.
  O lugar era um laboratório fechado em cima do morro, tinham varios produtos químicos jogados no chão no meio do tiroteio, pesticidas, anabolizantes de cavalos, até gasolina. Nos cantos tinham tabuas e tábuas de droga empacotadas como se fossem tijolos, algumas folhas estavam jogadas e sujas de sangue com anotações das drogas e alguns corpos ainda  tinham óculos e luvas de proteção. Haviam balas no chão e alguns gemidos dos caras deitados no chão, não conseguia ver nada da planta. Havia fumaça e tabaco para todo lado, um cheiro insuportável ferroso no ar. Sangue misturado com bombas de gás e perguntei novamente como eu não havia sentido o cheiro do gás na hora do desespero e meus olhos arderam ao atravessar o laboratório.
   Dinho. Eu sabia que ele vendia maconha, mas eu achava que era apenas isso. Um cara vendendo maconha, nunca havia o visto vendendo. Não achava que seria algo de proporções tão grandes, se soubesse não teria me aproximado tão rápido do rapaz. Engoli em seco por um segundo, eu havia dito o bairro onde morava, ele sabia meus horários e os lugares que eu frequentava. Fazia duas semanas que ficávamos e eu não sabia praticamente nada da vida dele, nem quantos anos direito eu sabia. Sabia que seu nome era Dinho, era animado, adorava baile funk, era divertido, extrovertido, educado, ligeiramente mais inteligente que o restante dos amigos, não extravassava com dinheiro e nem ostentava. Afirmava que trabalhava como motoboy em um escritório de advocacia e fazia turnos de entregas para aplicativos entregando maconha na casa de playboys da Zona Sul, o que recebia muito bem. Ele tinha dois irmãos mais novos e seus melhores amigos tinham virado meus amigos, beijava bem e eu nunca tinha ido a sua casa ou saído dos beijos com ele. Agora percebia que os amigos dele o tinham respeito demais e seguiam suas ordens o tempo todo, eu devia ser muito inocente mesmo ou apenas não ligava o suficiente para a questão social da favela, apenas queria saber da minha irmã. Era estranho também meu nome ter ficado falado na comunidade, entretanto, Joaquim havia dito que não era comum patricinhas da Zona Sul com a vida ganha ,se meter em favela para baile funk.

  Olho sobre a persiana branca que cobria os vidros da delegacia e vejo Sargente Alves e Gonçalo, capitão Fabio Barbosa, Capitão Nascimento, Soldado Neto Gouveia e André Mathias, tento decorar seus nomes já que provavelmente eles viriam até mim novamente e eu precisaria estar preparada. Escuto vozes se aproximando, Capitão Nascimento ordena gritando como de custume, aparentemente tudo para ele se resolvia em grito e violência:
   " Alves, se livra dos maiorais na casa do desgraçado do Dinho. Joga os corpos na praia."
  " Na praia, senhor?"
  " Sim, morte na praia é afogamento, filho da puta. Manda o médico do IML fazer o laudo da morte por afogamento.  Gonçalo, vigia essa patricinha aí na sala de interrogatório, vamo deixar ela de molho pra ver se vai entregar o cafetão Dinho dela. Sargento Rocha, liga pro governador e avisa que a missão deu merda, não deixa sair na imprensa que os PM foram pro saco. Eu cuido do humor do governador quando escutar essa história ridícula, o coronel vai explodir merda na minha cabeça quando ouvir essa palhaçada, tá entendendo? Oliveira caralho, já entregou o relatório de mortos? Quero esse documento na minha mesa antes que o governador chegar."

Sua cachorraOnde histórias criam vida. Descubra agora