Dor, remorso e arrependimento

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    Joaquim olha para mim assustado e eu peço para ele me seguir, ele pega uma bolsa de mão enorme super pesada e vamos em direção ao terraço correndo o máximo possível:
" Você já assistiu algo sobre hotel Cecil? Foi encontrado um corpo na caixa da água. Elisa Lam desapareceu no hotel. Eles revistaram aquele hotel de ponta cabeça inúmeras vezes com várias equipes. O corpo dela foi encontrado na caixa da água vinte dias depois, as torneiras comecaram a sair . A equipe de manutenção foi, então, checar a caixa d'água localizada no terraço do último andar e  o corpo de Elisa nu, flutuando, sem vida, ao lado de suas roupas que também flutuavam. Você sabe nadar, né?"
  Escuto os primeiros pingos de chuva cairem e ressoarem sobre as janelas e irem aumentando de intensidade aos poucos e isso deixa Joaquim mais agitado e furioso com toda a situação.
   " Vou me esconder na porra de uma caixa da água, Danizinha?"
  " Só até eles irem embora... Melhor saber nadar."
  " Danizinha, vei, você é maluquinha das ideia."
   "A caixa fica no terraço, tem um escada que leva para olhar o nível da água entra lá dentro... São seis andares nesse prédio, muitos moradores deve ser grande o suficiente para você entrar... Senão conseguir fique lá escondido e espere pelo melhor, porque eles vão subir. Aqui está a chave do terraço."
  Entrego um molho de chaves e pego a única que não era treta chave e ele concorda indagando baixinho:
  " Valeu, Danizinha. Vou fazer um passeio na piscina das suas torneiras, vo mandar a braba. Qual é a caminhada?" 
   " Eles estão chegando....No final do corredor tem uma escada, do lado da saída de emergência, tem uma porta com uma escada sobe lá  e vai dar direto com o terraço e a caixa."
   Saio correndo em disparada de volta a meu apartamento e coloco uma série na Tv de relance, visto um pijama de seda de duas peças rapidamente, jogo o cobertor no sofá e deito deixando o som da chuva arrastar qualquer medo de não dar certo de meu corpo. Deito e fecho os olhos, ainda escutando o barulho do trinco da porta girando e o pelotão atrás da porta ouvindo ordens disparada e fecho os olhos novamente. De repente, um estalo alto e escuto a porta ser arremessada em um chute em direção a parede fazendo um barulho absurdamente alto, Capitão Nascimento e seus homem adrentam a sala de estar invadindo e fazendo uma limpa no apartamento a procurar de Joaquim ou o que quer que estavam procurando....
Abro os olhos fingindo dificuldade  com as luzes da sala, que eles ascenderam, e sou recebida com um Capitão Nascimento com uma arma apontada para minha cabeça:
" Bom dia atrasado, bela adormecida. Acorda. Queria lhe pedir permissão para revistar a sua casa."
  Como  alguém em sã conciencia diria não para uma arma de mais de doze centímetros apontada para seu rosto?
  " Sim, senhor."
  " Capitão, permissão para adentrar?" O capitão murmurrou que era positivo ao tenente e assentiu." Mais algo, senhor?"
  " Senhores, revirem a porcaria desse prédio, ninguém para até achar alguma coisa..."
  Ele faz gesto com a mão para todos circularem e revirarem o apartamento começando uma revista completa deixando meu apartamento uma bagunça. Eles tiram e jogam tudo no chão arremessando tudo como senão fosse nada e um dos soldados pegou com cuidados as louças e xícaras do armário ao contrário dos outros..... Eu cheguei perto dele lendo seu uniforme, seu nome era André, murmurei que eu o ajudaria. Ele passava as xícaras para mim e botava na mesa abaixo do armário. Capitão Nascimento vem em nossa direção e da uma conferida na vista para o térreo pela janela.
     " Se der para completar nessas ordens ai para não assustar a Vera, por gentileza. Tadinha ia ficar apavorada"
   Eu olhei tentando disfarçar o nervosismo, não é possível que eles iriam olhar a merda da caixa da água. Não era possível que eles iriam fazer algo assim, qual seria o pertubado que pensaria que alguem se esconderia na caixa da água? Eu seguia cada movimento dos soldados com os olhos vigiando cada movimento e vi uma patrulha ser mandada para os outros andarem do prédio e mordi o lábio. Se eles viesse qualquer coisa estranha em torno da caixa da água ou ocorresse um tiroteio não tinha como Joaquim se proteger dentro de um enorme tubo de água. Iria o furar inteiro com tiros.
   " Quem é caralhos é Vera?"
   " A Vera é funcionária da minha família, minha segunda mãe, agradeceria se seguissem com a minha desculpa. Ela não precisa ser envolvida em nada disso. "
  Ele concordou com a cabeça assentindo brevemente e pedi que tentassem ou não deixem que ela visse as armas.
   " Senhores, revirem a porcaria desse prédio, ninguém para até achar alguma coisa... A patracinha dona do morro pediu com educação, pela primeira vez em sua existência,não assustem a tal da Vera. Vamos respeitar a bondade da moça."
   A Vera escuta a barulheira e sai de seu quarto assustada ao ver os homens de preto fica maravilhada relembrando a época que meu pai ainda era Coronel do Bope. Olhando de modo reepreendor para mim e vejo seu olhar procurar pelo Joaquim pelo ambiente e automaticamente nego com a cabeça,ela entende que algo estava errado e era melhor não interferir. Vera já havia me salvado um milhão de vezes de mil encrencas e confusões e ela sabia muuito bem quando eu estava envolvida até o pescoço.....Fugidas de casa para beijar garotos durante a madrugada, sair de fininho meia noite quando estava de castigo, me deu banho no meu primeiro pt quando eu ainda era menor de idade e não sabia os estragos que uma bebida docinha alcoolica com teor alcoólico duvidoso. Ela se aproximou exibindo o sorriso mais acolhedor que ela conseguia exibir:
   " Veraaa, estes são amigos do meu pai, a antiga equipe dele no Bope. " Meu nariz poderia até ter crescido de tanta mentira que eu estava contando ultimamente." Eles vieram lanchar conosco."
   Vera deu uma rápida analisada nas armas em suas mão e piscou duas vezes. Eu sabia o que significava, ela iria encobrir a merda que eu estivesee envolvida como de custume. Ela disse toda alegre vendo aqueles homens altos, fortes e bonitos espalhados pela casa:
   " Olá rapazes, como vocês são bonitos e bem vestidos..... Venham... venham comam um bolinho, lá dentro tem muuito mais. " Ela arrastou os homens a mesa os obrigando a sentar e foi os servindo sem os deixar dizer uma palavra." As roscas e doces foram eu que fiz, já os pães e quitutes são da padaria da esquina. Dona Dani não avisou que teríamos tantas visitas..."
   Ela lançou um olhar suspeitoso e fingi uma certa demência.
  " Vou buscar mais copos e pratos, Vera, só um minuto."
   Onde caralhos estava Nascimento?
  O moreno estava sentado na ilha da cozinha junto a uma xícara de café e mais dois homens procurando drogas ou armas na cozinha. Resolvi pertubar sua paz um pouco, talvez assim eu conseguisse um pouco mais de tempo.
  " Está bem a vontade né,? Entrando na casa dos outros sem ao menos bater na merda da porta, já vão entrando, depois pedem licença, que educado da sua parte, Capitão."
   Ele se serviu de café e deu um belo gole na bebida quente ainda escarando o nada.  O que ele tinha? Eu podia passar um milhão de vezes em sua frente pegando fogo que o moreno não notaria.
   " Cacete, já não se meteu em merda o suficiente para vim me encher o saco aqui na cozinha também."
  Eu sorri conseguindo alguma reação dele finalmente. Ele olhou de cima para baixo dos meus pés a minha cabeça com cuidado e perguntou bravo:
   " Qual a tua idade do bebe... digo da criança para fazer tanta birra, garota?"
   " O que?"
   " Qual sua idade, porra, criança para caralho. Me deixa fazer a merda do meu trabalho e você faz o seu."
   Eu revirei os olhos e automaticamente olho seu rosto, ele estava todo cortado, sua roupa toda manchada de sangue e furada na entre a linha axilar e o ombro direito.
   " O que caralhos aconteceu com a sua cara? E sua roupa?"
   " Tomei um tiro de raspão, uma lâmina afiada na altura do olho. Nada da sua conta."
   " Um tiro de raspão? Um tiro de verdade e nem se deu o trabalho de trocar a farda? Você ao menos desinfectou essa merda?"
   " Os vagabundo tentaram retomar o controle do Babilônia ontem, não conseguiram. Morreram tudo. Tenho tempo para ficar na moda que nem vocês não, ohh patricinha."
  Era obvio que ele havia limpado a ferida e eu secretamente julgada que havia sido obrigado pela equipe médica a limpá-la.
   " E qual o motivo para tantoo mal humor assim? Conheço seu caráter, bandido bom é bandido morto, deve estar dando pulinhos de felicidade."
   " Hoje não, loira. Hoje não estou para tagarelar como você. Estou puto ." Ele se levantou irritado. E eu me aproximei analisando sua ferida no ombro não parecia encaixada ou nada parecido.
   "  Está tudo bem com o senhor? O senhor parece péssimo, terrível, você lá dormiu essa noite? Virou a noite em beco de favela atirando nos outros de novo?"
  Ele deu de ombros obviamente irritado, como se aquilo fosse da minha conta. Realmente não era, mas eu estava curiosa e ansiosa para saber o que caralhos aconteceu com Capitão para o deixar com olhos tão vazios e sombrios.
    " O que é isso? Virou minha mulher agora com mil perguntas? Porra. Cala a boca, cacete..... " Ele ficou alguns segundos em silêncio e depois se arrependeu da grosseria de graça." Um soldado meu está na sala de cirurgia, está morrendo, tenho razões para acreditar que tem que dedo da senhorita nisso."
   Eu revirei os olhos e ele disse que não era para eu me atrever a revirar os olhos para ele daquela maneira...
   " Eu? Só se for no mundo mágico da sua cabeça né. Meu Deus, você está todo ferido, veio direto para cá?"
  " O dever não espera... Vai nos deixar revirar tudo ou vou ter que começar a quebralheira?"
   Insuportável. Esse insuportável voltou a agir normalmente, embora, ainda estivesse petrificado em seu lugar queito. Ele começa a abrir potes e mais potes, potes de farinha, arroz e feijão. E rapidamente passa para o armário das taças de cristal me deixando levemente nervosa, ele não teria a mesma paciência que André. Por mais que eu temia pela vida de Joaquim, se eles arremessasem minhas taças que nem fizeram com os  toalhas de mesa, roupas do meu armário, meias e calcinhas, eu ia jogar as taças na cabeça deles.
  " Procura o que quiser, não quebra nada. Se quebrar....." Ele olhou incrédulo e sussurou estressado:
    " Vai fazer o quê, sua cachorra? Contar pra seu papai de novo?"
   " O que caralhos está acontecendo acontecendo aqui? Estão procurando o quê?"
  Ele ignora e sai andando pelo corredor sem dar nenhuma resposta e vou atrás esperando a merda de uma resposta e ele para na sala de jantar e ve a mesa toda posta e pergunta:
   " Que merda é esta? Um café colonial para ninguém?"
   " Vi vocês lá em baixo me seguindo e a Vera quiz fazer um café para vocês. Trabalharam um dia inteiro e estão me seguindo para lá e para cá."
  " Não fode, garota. Está querendo alimentar o que um exército com tanta comida assim?"
   " Eu achava que seria somente vocês quatro, não esperava outra viatura, mas irei colocar mais pratos na mesa.... Depois de terminarem o que caralhos vieram fazer aqui podem comer."
   Um dos soldados entra encharcado da chuva e confirma ao comandante que não encontraram lá fora absolutamente nada informando que o predio estava limpo. Respiro aliviada, eles não haviam o encontrado, não havia achado Joaquim ainda. O Capitão não diz uma palavra e nem fica bravo, apenas assiste os outros soldados serem servidos por Vera. Eles também não haviam encontrado absolutamente nada, fiquei surpresa por Capitão Nascimento os deixarem comer sem acabar com a raça deles e ele apenas encosta contra a parede da sala e permanece encarrando o nada preocupado. André se aproxima de mim e também fica analisando pesarosamente o superior e automaticamente com a pequena   não ininemizade recém adiquirida por nós dois:
   " O que caralhos aconteceu com ele? Ele está passando bem?"
   " Eu também nunca o vi assim. O Capitão é duro na queda, ele está assim desde que voltou da missão, um dos nossos parceiros do batalhão atirou em um bebê de cinco meses durante uma negociação. Prendemos o maior chefe do terceiro comando, mas o vagabundo estava com a mulher e os filhos os usando como escudo humano. Temos as imagens das câmeras de segurança. Quer ver? Esse é o pai da criança"
   Ele passa a mão pelos mil bolsos da farda e encontra seu celular, procura em sua galeria um video e o liga o que vejo que é uma gravação de uma câmera de segurança de um poste de luz. É a cena de um traficante rodeado de soldados do Bope acompanhado de sua mulher e um bebe e em questões de segundos o traficante escapa de uma bala aos botar o seu filho de alguns meses na frente da bala a fim de se defender sem pensar duas vezes. Engulo em seco, era um cena horrível de se assistir mesmo com imagens pouco nítidas dava para se ver o sangue escorrendo pelo macacão da criança e seu choro parando de existir em alguns instantes após a bala e a mancha de sangue irem crescendo na barriguinha do neném e a mãe se contorcendo em gritos atrás do marido.
   " Jesus. Que crueldade. Como ele consegue fazer algo assim? É o pior  pai do universo. "
   Ele contou que a mãe ficou gritando desesperada gritando que eles tinham matado o filho dela em prantos por dez minutos e agora agora o Capitão estava assim desde do ocorrido.
  " Não sei o que deu nele, não é como se tivesse sido planejado. Foi um erro e um risco que não iríamos assumir."
   Não era possível. Como ele havia ordenado aquilo? Ele mandou atirarem quando o bebê estava a vinte centímetros do cara que era o alvo? Como ele teve a coragem? Como ele teve a audácia e o sangue frio? Aquilo só podia ser coisa de um monstro....
   " Ele mandou atirarem mesmo podendo acertar a criança do lado dele?"
   " Não. Ele não autorizou e o treineiro atirou mesmo assim, ele estava no treinamento há nove meses.... O Coronel viu que esta equipe estava com o desempenho incomparável a outras anteriores e exigiu que eles fossem para campo de verdade imediatamente, achando que seria uma boa prova de resistência e ótimo aprendizado. Ideia maluca do cacete.... São todos um bando de Pmzinho que não pensa, não são casados, não tem filhos, não tem muuito o que perderem ao morrerem em combate. Os melhores candidatos para o Bope são o que possuem essas características, são os mais cuidadores, menos impulsivos e mais preparados. O medo é um aliado da polícia, disciplina soldados como ninguém."
  Fazia sentido. Seriam políciais com medo de morrerem e não se colocadia em risco a toa.
   " E o soldado que atirou? Foi punido?"
  Ele fez com que eu o acompanhasse com a cabeça afastando para fora dos ouvidos dos outros homens da sala e cochichou em meu ouvido:
   " Primeiro, todos os cinco traficantes que estavam lá foram fuzilados, todos mortos sem mais nenhum pezar. A mulher ficou chorando e gritando com os filhos nos braços dizendo que o Capitão havia matado o filho dela e que ela desejava que fosse o filho ou a filha dele naquele lugar. Ela disse que iria colocar uma maldição no filho dele para morrer da mesma forma nos braços dele para que ele pudesse assistir a vida saindo do cadáver frio dele aos poucos.... O moleque que aprontou essa confusão toda tinha uma função, uma função, aguardar ordem positiva de disparado, ele recebeu um negativo, ele meteu o dedo no gatilho e isso aconteceu. O Capitão perdeu completamente a calma e depois que tudo acabou meteu porrada no treineiro e o espancou até ele pedir para desistir do curso enquanto a manta que cobria o bebê ficava mais suja de sangue e a mãe amaldiçoava o filho do capitão."
   Ele ter perdido a calma com o treineiro não me surpreendia mais. Ele merecia a merda da surra, o risco de errar o alvo ou bala perdida na mãe ou na criança era grande devido a pequena distância entre os dois. Todavia, não era responsabilidade dele o que havia acontecido.
   " E os outros treineiros?"
   " O Capitão liberou todos eles menos o Duarte, que resolveu ir não segurar a emoção e botou o dedo no gatilho e matou a criancinha. Para os outros que viram a cena liberaram eles do treinamento por dois dias para esfriarem a cabeça. Os liberou pra passarem um tempo com suas famílias. Alguns tentaram continuar treinando ou trabalhando para não lembrar a cena horrorosa que viram, todavia, você conhece o Capitão ele é categórico em suas ordens. Ele é o único que permaneceu em serviço desde do inciente.... Bom, ele e o Mathias, ne..."
    " Mathias? Quem é Mathias?"
    " Nosso colega do batalhão. Ele é um auxiliador do treinamento, ajuda o Capitão a estar 100% atento a todos sem deixar nada passar batido. Ele foi atingido na saída do morro na cabeça e está passando por cirurgia nesse exato momento. Ele é um dos nosso amigos mais próximos... O médico disse que ele não vai sobreviver..."
    Respirei fundo olhando  os soldados sentados a mesa com Vera comendo, eles estavam completamente aliviados por terem uma pausa. Aquele havia sido um dia mais que estressante e seu amigo estava a beira da morte....
   " Eu sinto muuito mesmo. " Eu disse pousando a mão sobre seu ombro em um ato de empatia e ele agradeceu." Eu sei que pode parecer falso já que vocês cismaram que sou uma mulher de traficante. Eu realmente sinto muito e é tudo muuito horrível o que aconteceu."
  Ele ficou em silêncio por alguns minutos pensativos e disse com angústia e pesar na voz:
   " O Capitão havia avisado e tentado proibir essa missão ridícula com treineiros em zona de guerra, ele realmente tentou de tudo dizendo que ia dar merda... O Coronel não escutou estava mais interresado em saber qual cerveja ele encheria a barriga mais tarde."
   " Você e Mathias são proximos? desculpe a pergunta."
   Ele disse que eram melhores amigos juntamente com o Capitão e que todos se conheceram no treinamento juntos . O Capitão havia os treinado também.
   " Vocês amigos do Capitão? Ele manda em vocês."
  " Ele já salvou as nossas vidas mais vezes que podemos contar, nos devemos tudo a ele e ele é um ótimo amigo, principalmente fora do batalhão... Acredite ou não, temos vidas fora do trabalho."
   " Claro.Ficam me seguindo de viatura para qualquer lugar que eu vá."
  Ele riu com o comentário inesperado e desabafou sentando na mesa de jantar e eu o acompanhei colocando mais um prato, talheres e copos para ele comer:
   " Eu apenas fico feliz de sair do batalhão. O clima desde do episódio do bebê está insuportável lá dentro. Todos se sentem culpados e a cirurgia do Mathias não tem boas previsões. É bom distrair um pouco..."
  Eu tentei pensar em qualquer coisa que o fosse se sentir melhor, talvez jogar conversa dora fosse o distrair um pouco.
  " O que fazem fora dos batalhões quando não estão invadindo casas e me seguindo por ai?"
   " Somos grandes fãs de churrasco, um pagode, cerveja gelada e um bar. Temos um time de futebol do batalhão e jogamos todas as quartas á noite quando não estamos de plantão, as mulheres vem assistir junto com as crianças é sempre muito bom."
  Parecia divertido e uma boa maneira de manter a equipe unida. Não conseguia imaginar o capitão sem aquele uniforme e a arma na mão 24 horas por dia.
   " Imagino. Pagode? Não acho que o Capitão Nascimento faça o estilo de pagode."
   Ele pegou um pão de queijo e cortou uma fatia de queijo fazendo um sanduíche dando uma mordida feliz de estar comendo distraido:
   " Não se engane ele está ali pela carne e cerveja e nos mandar não estarmos com ressaca no outro dia ,senão teremos que fazer  exercícios físicos até cairmos de exaustão."
   " E ele pode beber a vontade?"
   " É.... Tem alguns malefícios ser melhor amigo do Capitão do seu pelotão."
  Mais soldados chegam e informam ao Capitão que não encontraram nada ao revistar novamente o condomínio e a quadra de minha casa e rapidamente pergunto:
  " Estão com fome? "
  " Não podemos comer sem autorização do nosso superior."
  " Tem certeza que não quer comer alguma coisa? Duvido que nesse estado o Capitão Nascimento irá perceber algo. Sentem-se. Podem servir, na minha casa esse homem não manda em nada não. Andem parecem famintos."
   Um deles pega um pastel da mesa e observa o Capitão não expressar reação nenhuma. Ele estava perdido em seus próprios pensamentos e tira um cigarro do bolso e o acende saindo do cômodo.
    Aproveitei a deixa para desaparecer, sair do apartamento e ver se eles haviam ido ao maldito terraço. Vejo a porta do terraço arrombada e me desespero. Vou correndo para fora enquanto a chuva bloqueia minha visão e vai inharcando cada centímetro de meu corpo e ouço um tiro vir em minha direção. E outro. E mais outro....Tiros em minha direção abafados pelo som dos trovões e o som da chuva.
  Saio correndo em disparada, e de quebra esbarro com um homem grande vestido de preto e dei de cara batendo meu rosto em seu peito. A colisão dos dois corpos deu impacto, um impacto gigantesco. Capitão Nascimento é jogado para atrás segurando o cano da arma e me agarra  com força, me agarra tão forte, que era capaz de segurar o  peso do meu corpo com apenas um braço e o outro permanece segurando o cano da arma.  Eu continuei o abraçando forte assustada com os tiros mirando a minha cabeça e ele retribuiu surpreso. Ele não falou nada. Eu não disse nada.
  Um silêncio reconfortante invadiu o ambiente enquanto ele checava se havia alguém no corredor. Ele tentou me perguntar algo, entretanto, sua voz saiu trêmula, mais como um sussuro, uma súplica,  soou quase como um pedido para que eu ficasse perto e não saisse de seus braços. Deixei o cheiro maravilhoso do Capitão Nascimento adrentar minhas narinas e ele respirou fundo aliviado ao ver que realmente não tinha mais ninguém. Eu estava tremendo, tremendo de novo em choque, eu tentava não parecer tão pertubada, mas era nítido nos meus olhos o quão assustada eu estava. Eu não esperava que uma bala passasse há cinco cêntimetros de minha cabeça e outras duas viessem em seguida fazendo meu cabelo voar de tão próximo e furar a parede atrás de mim com toda a velocidade. Devia ser Joaquim, devia ser Joaquim... Quem mais estaria no terraço a esta hora e atirando ao alguém entrar? Ele devia ter saido da caixa de água achando que os policiais haviam ido embora.
  O Capitão podia ter corrido atrás dele, podia ter o prendido, podia ter prendido quem ele veio buscar no meu apartamento. Todavia, não.  Podia terem trocado um monte de tiros. Ele não o fez. Vejo que eu estava sangrando, sangrando bastante e algo ardia em minha orelha e ,por um momento, sinto uma faísca de dor visceral atingir na nuca lateral da minha cabeça. Olho para o Capitão conferindo se ele que não estava sangrando e vejo meu cabelo se embolar em sangue. O moreno  decidiu ficar ali me segurando, tentando me acalmar e ele perguntou quebrando a paz velada que tinha se instalado:
   " Loira, porra, está tudo bem? Está tudo bem, porra?....  A próxima vez que alguém enfiar a porra da mão em você vai ser a ultima vez que esse sujeito vai ter dedos, está escutando? Tá me escutando? O que ele fez com você, caralho? A bala está ai?" Eu tentei dizer alguma coisa, entretanto, meus pulmões faltavam ar.  Eu estava tremendo de frio e batendo o queixo que nem doida, que droga de vento do caralho era aquele. Ele começava a procurar desesperadamente por machucados pelo meu corpo, vira meu rosto de lado analisando o soco e a severidade dos ferimentos. Eu não parava de tremer por um minuto. " Você está segura, caralho. Eu estou aqui com você e nada vai acontecer com você, Daniela. "
  Eu percebo minhas mãos tremerem e eu suar frio enquanto o sangue gotejava perto do canto dos meus olhos:
   " Estou bem, é que realmente está gelado aqui em cima."
  " Você só complica a minha vida, garota." Ele diz resmungando analisando minha orelha e se eu ainda estava ferida em algum lugar. Ele pega um pedaço de pano e passa uma mecha do meu cabelo para trás estancando a ferida. Vejo ele rígido e nervoso pressionando a ferida, normalmente eu reclamaria da dor, mas eu não o daria esse gostinho com sua postura todo machão.
    " não dá uma dentro, na próxima vez que você for em algum lugar eu vou junto. Parece que a merda te acompanha aonde quer que você se enfia, loira." O capitão com todo o cuidado do mundo colocou o revólver na cintura e me puxou mais para si com cuidado, como se em um ato brusco eu fosse quebrar, como se eu fosse feita de porcelana.
  Sinto meu coração disparado com tanta adrenalina e meus pulmões queimarem, a falta de ar junto com a água que eu havia engolido estava dificultando a respiração. Olho em seus olhos, eram os olhos mais tristes, perdidos e desolados de todos, ele não ligava o suficiente se Joaquim havia fugido neste minuto, seus pensamentos estavam perdidos no bebe de sete meses. Seus olhos estavam cheios de lágrimas que ele não deixava cair e sua expressão era de total perdição, ele não conseguia se perdoar. Ele estava triste, destruído e cansado, parecia que carregava todo o peso do mundo sobre os ombros...
  " Eu sinto muito, loira. Eu assumo a responsabilidade por isso também, eu estava... eu estava... pensando nele. Eu matei.... Eu matei um bebe de cinco meses, um bebe de colo em fogo cruzado. Eu não estava no meu melhor, eu devia estar mais atento..." O capitão já não consegue mais controlar as lágrimas, elas descem lentamente sobre o seu rosto."  Eu sinto muito."
   Ele sabia.... Ele sabia que eu havia visto a gravação das câmeras de segurança. Eu sabia que aquela gravação era provavelmente uma das últimas disponíveis porque, o Bope já estava na função de apagar todos os rastros daquele acontecimento para que não vazasse algo assim na internet e na imprensa. Eu estava começando a entender demais dos sistemas operacionais da mídia e do Bope nos últimos dias. Fazer, apagar os rastros e deletar da mente de quem viu que algo assim aconteceu.
   " Escuta aqui." Eu o forço a olhar para mim já que seu rígido rosto desviava o olhar com todas as forças." Não foi sua culpa. Aquela merda toda não foi sua culpa....Não foi você quem atirou. Não foi você quem deu as ordens. Não foi você quem apertou o gatilho, não é sua culpa se ele pegou o próprio filho do colo da mãe para não atirarem nele e quando viu a oportunidade enfiou o menino na frente que nem um colete de balas...Não é culpa sua."
  " A mulher dele viu tudo, a mulher dele viu o pai arrancar o filho de cinco meses da proteção do colo da mãe achando que ele iria se render, ela achava que ,pelo menos, o marido não iria morrer... Que ele iria apenas ser preso... A mulher achava que ele estava se rendendo... Eu prometi, Daniela. Eu prometi para mulher dele que ela e o filho ficariam bem se ela me contasse aonde o filho da puta daquele marido dela tava..."
  Eu o abracei mais forte e ele se aconchegou em meus ombros, pela primeira vez eu estava vendo aquele homem sendo vunerável, sendo humano e não uma máquina do pelotão. Era a primeira vez que eu via realmente sentimentos reais naquele homem e quanto mais eu via ele se abrir em meu colo,mais eu sentia que ele precisava daquilo. Ele precisava de desabafar no colo de alguém e não se permitia que as aparências caírem para ninguém. Ele passou a mão pelo rosto e deu um passo para trás encarrando o nada e completou." Não consigo tirar da minha cabeça o rostinho dele, era igual o meu filho... Igual o meu filho quando tinha cinco meses de idade, os mesmos olhinhos, as mãozinhas gordas... o mesmo choro interminável e estridente eu não consigo me perdoar.... Podia ser a porra do meu filho ali, caralho. A porra do meu filho. "
" Não foi você, eu escutei os outros soldados do batalhão, não foi você que atirou. Não foi você que resolveu correr o risco. Você mandou ele não atirar, você mandou ele não fazer. Se ele atirou no cara e ele colocou o filho dele para levar bala como a merda de um escudo,a culpa é dele. Ele matou a merda do filho dele, ele matou porque prefiriu a bala cair numa criancinha de colo inocente do que nele. O culpado é ele. Somente ele. Não é sua culpa."
  " Desculpe. Eu não consigo me perdoar, é a minha equipe, minha responsabilidade, minha função. Meu soldado atirou e eu disse para ele não atirar, porra. Eu queria matar aquele filho de uma puta, a vida dele dentro do Bope acabou. O filho da puta fez o que eu ensinei, ele fez o que eu ensinei para ele no Bope... quando tiver a chance, você atira a qualquer distração e o vagabundo usou o próprio filho pra se proteger do tiro.  É culpa minha e agora ele ter te batido é responsabilidade minha também. Se eu tivesse tirado essa merda da minha cabeça por um segundo eu conseguiria prestar atenção na porra do meu trabalho e sto não teria acontecido com você."
   " Está tudo bem comigo. Estou bem, com frio, molhada e machucada mas está bem. Sabe como é mulher de vagabundo tá acustumada a levar bala."Ele abriu um mínimo riso de lado, aparentemente era o máximo de um sorriso que eu iria conseguie ali.
"É de perdão que você precisar? Eu te perdoo. Não é culpa sua, você não pode controlar o caos que domina o mundo inteiro a sua volta. Não pode carregar todo o peso do mundo em suas costas.... Não é sua culpa e eu vou bater num Capitão do Bope se repetir isto. Se seu soldado não tivesse atirado ele ainda teria usado o filho como escudo humano... Se seu soldado atirasse e o cara não tivesse o pegado do colo da mãe não teria acontecido. Está fora do seu controle. Não adianta se culpar por isso. Meu amigo... o Vitor, ele nunca tinha ido num baile funk, nunca tinha subido favela conosco, a gente estava acustumado a ir e beber, curtir a festa quase toda semana, sabíamos as regras, com quem brincar, com quem conversar. Ele não. Se eu não tivesse o chamado na sexta feira, ele estaria vivo... As imagens do baile funk monstram que ele ouviu os tiros e a correria começou... Ele viu os carros da polícia e foi correndo que nem doido em direção a viatura achando que estaria a salvo e levou uma chuva de fuzilamento.....Não é culpa minha. Ele poderia ter ido sozinho pro baile funk, a Bia ou a Carol o convidariam de todo jeito para a festa, ele poderia ter dito não ou sim, ele poderia não ter corrido em direção aos disparados....eu não tenho controle sobre as pessoas e o que elas fazem ou não e o senhor também não, capitão. Não é nossa culpa."
    " Não tem como você saber. Você não estava lá."
   " Eu vi as filmagens. O André me monstrou. Eu tenho certeza que não é sua culpa, você não deixaria seu filho levar tiro por você, Capitão."
  Ele suspira frustado e diz exitante:
   " Meu nome é Roberto. Pode me chamar de Roberto.... ." Ele me puxa em sua direção, as nossas bocas estavam separadas por pequenos e minúsculos cinco centímetros, as testas encaixadas, os olhos se encontrando com uma eletricidade imensa que era capaz de sair faíscas.
  " Eu sei que você tem vinte menos do que eu, é da idade do meu filho, é a mulher do bandido que eu estou tentando pegar, mas cacete eu não consigo mais me controlar, sua cachorra ."Ele sussura contra meus lábios antes de capturá-los em um beijo profundo, intenso e cheio de remorso e arrependimento enquanto suas lágrimas salgadas molham o meu rosto....

Sua cachorraOnde histórias criam vida. Descubra agora