Capítulo 11 - Sopro

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Após dias e dias empolgado com a produção de novas músicas, me sentia preenchido de uma certeza que tornou meu sorriso frouxo. Era sentir que eu estava fazendo o que nasci para fazer. E a cada hora isso me confirmava mais, o apoio que recebia, como nunca antes. 

E então comecei a sentir que algo estava estranho em mim, desconhecia aquela certeza.

É seguro ter certeza? Eu posso me sentir assim? E me veio um bloqueio criativo, no qual eu sentia as coisas, e vias as coisas, e as deixava passar. Assistindo-as apenas. Existindo ali.

O céu amanheceu fechado, cheio de nuvens e me enxerguei nele. Era como se nós estivéssemos farto de tantas nuvens. São muitas incertezas, são muito mais sonhos não realizados do que vividos, é muita covardia, é uma vida. Muito mais que as incertezas e os medos, os receios e a pressão que me preenchiam, a maior parte do meu nublado vinha da minha insatisfação de viver somente uma vida.

E não só, mas uma vida com limitados sonhos.

Passo a mão na cabeça, soltando lentamente um suspiro. Sinto sinais do meu coração apertando, e coloco a mão direita no peito. "se acalme, por favor, se acalme" sussurro.

Lembro de uma poesia que li sobre estar presente, se sentir presente, viver no agora. O que me chamara a atenção foi um verso que falava sobre viver pequenas vidas de 24 horas, e eu ainda estou pensando sobre isso, me soou como um lembrete, um convite, uma pequena certeza.

Olho distante para o ambiente, estamos com alguns dias de folga até o próximo show da tour, e me decido de prontidão ir ver o céu durante à noite. 

Observo os membros empolgados, se dedicando; Hoseok focado na sua mixtape acabou por perder peso. Preciso puxar sua orelha depois. Yoongi observador, parecia sentir de longe o que estava passando por minha mente, mas eu ignorei, e ele se concentrou em Hobi. A maknae line se preparava para ir jogar Overwatch, e quando passei os olhos por eles, Jeon sorriu para mim, e depois voltou sua atenção para os outros. Cadê o Jin? Meu coração dá um pulo sem que eu perceba. Hoje não. Não posso vê-lo.

Não é como se eu fosse chorar, afirmo para meu coração entender, apenas estou me sentido entorpecido, como se tivesse colado no tempo, onde parei e estou me perguntando que porra disso tudo faz sentido, se precisa fazer, se vai dar tempo, se vale a pena, o que acontecerá com os sonhos que eu não viver.

Caminho até meu quarto de hotel, e me jogo cama. Solto um suspiro involuntário. Encaro os equipamentos na mesa, e não sinto vontade de produzir, de escrever. Antes de fechar os olhos, tenho a vista do teto uma última vez, e me permito dormir mesmo com meu peito pesando tanto.

Acordo com um barulho que me conforta assim que me dou conta do que é. Chuva. Levanto, e passo as mãos no rosto, tomando coragem. E vou até a saída do hotel, decidido, sem olhar para os lados, sem óculos escuros, e quando sinto a brisa gelada, eu corro. Não avisei ninguém, não me dei conta se alguém viu, eu não sei para onde estou indo, só quero que as nuvens me deixem ver o azul do céu. Meu azul.

Minhas pernas se contraem em dor, e eu paro, exausto. Não ouvia nada além da chuva. Até passos de corrida começarem a aumentar atrás de mim. Olho sobre os ombros, e me viro lentamente, vendo uma figura se aproximando, arfante.

— Hyung!

— Aí meu Deus. O que você tem na cabeça, Jeongguk? — Assim que ele se aproxima, o puxo para debaixo de um toldo de uma padaria, já fechada.

— Hyung, por que você... — ele arfavava mais do que eu, como se não tivesse sido somente a corrida que o cansara — correu daquela forma?

Antes de responder, o observo, abismado pelo seu impeto de me seguir, em meio à chuva, por se preocupar. Eu só precisava da chuva, precisava ver as nuvens choverem e limparem o céu, precisava ver o azul escuro, as estrelas distantes. E acabei preocupando meu amigo mais novo.

— Eu... ahn... — Coço a nuca, sem jeito, e ele me observa preocupado, um olhar que transborda carinho. — Há dias em que a gente não sente que é infinito o suficiente para... — Respiro pesadamente, e meu corpo reage àquelas palavras como se eu tivesse acabado de correr, e minha respiração descompassa  — suportar todas as nossas nuvens. — Desvio o olhar para chuva. Meu corpo sentia falta das pequenas agulhas em minha pele.

— Hyung... apesar das nuvens, o céu ainda é azul. — Ele se aproximou um pouco. — E esses dias passam. — Seu olhar sobre mim é como o de alguém que quer salvar outro que está na beira de um edifício. Porra Jeon, você cresceu tão rápido, não se preocupe dessa forma, não me faça sentir como uma criança.

— E as nuvens chovem. — Ele se aproximou mais ainda, colocando suas mãos em meus ombros. Ele deu mais um passo, e me senti apreensivo. E ele aproximou seu rosto do meu, me encarando até fechar seus olhos, pousando suas mãos nas minhas bochechas, segurando meu rosto.

—Jeon ? — Ele soprou, e eu fechei os olhos por reflexo. Ele soprou novamente, e então abriu os olhos, com um sorriso. Ele sabia que eu estava bem, ele me via através das nuvens.

— Hyung, estou soprando suas nuvens para longe, para que você possa ver o azul do céu logo.

escrito em 06/05/2017

𝙸𝚗𝚎𝚏𝚊́𝚟𝚎𝚕 ♦  [kim nam joon]Onde histórias criam vida. Descubra agora