Cumplicidade 【Appleradio】

【Capítulo 25】

Os céus estavam mais vermelhos que o habitual, como se o inferno tivesse decidido intensificar suas próprias cores, criando um cenário onde o calor e a tensão pairavam no ar. Para Lúcifer, contudo, tudo parecia estar voltando aos eixos, como se, finalmente, o caos estivesse encontrando uma ordem natural. Cherry estava ocupada tentando não perder a paciência com um hóspede particularmente irritante, enquanto Vaggie monitorava atentamente todos os preparativos, garantindo que nada escapasse ao controle. Angel e Husk tinham saído para o trabalho, como sempre, levando Niffty junto para não deixá-la ociosa. Charlie e Alastor estavam organizando a área onde a comitiva celestial de Sera seria recebida, cuidando de cada detalhe meticulosamente.

E Lúcifer, o grande e imponente Rei do Inferno, ironicamente sem nada para fazer, estava sentado em sua oficina particular, moldando patinhos de borracha enquanto uma melodia suave tocava no rádio antigo ao fundo. Seus dedos trabalhavam no material macio, mas a mente estava distante, perdida em pensamentos que ele não conseguia afastar, por mais que tentasse.

Ele não sabia ao certo como tudo aquilo havia chegado àquele ponto. O que teria conduzido o destino àquele momento? Seria tudo apenas um sonho lúcido, sem fim, onde ele estava preso? Se fosse, ele não queria acordar, jamais. Mesmo assim, a ansiedade começava a tomar conta. Suas mãos, normalmente firmes e controladas, tremiam, e os patinhos que ele moldava saíam estranhamente deformados. Era a primeira vez que ele veria Sera em tantos milênios... a primeira vez desde aquele fatídico dia.

Ele soltou um suspiro baixo, tentando acalmar os nervos. "Está tudo bem...", murmurou para si mesmo.

Não é como se a simples presença de Sera e de sua comitiva celestial fosse capaz de fazer o inferno desmoronar. Eles já haviam compartilhado laços antigos, outrora chamados de amigos... irmãos, até. Mas quem ele estava tentando enganar? Só de pensar em rever o rosto de Sera, ou de qualquer outro ser celestial, seus pulmões pareciam perder o ar e o teto começava a escurecer diante de seus olhos.

O que fariam se não fossem convencidos? Aumentariam o genocídio? Já tinham se passado um ano e sete meses de carnificina moderads - comparada a de sete anos atrás -. Não seria algo impossível, mas Lúcifer não queria considerar essa possibilidade. Ele precisava focar em algo mais imediato... algo tangível. E, assim, voltou-se para o patinho em suas mãos, apenas para perceber que ele estava horrível, grotesco em sua forma. A cabeça estava desproporcional, e as asas pareciam mais garras do que penas.

Com um suspiro de pura frustração, Lúcifer jogou o patinho em uma pilha de outros patos defeituosos, olhando para a criação com uma mistura de incredulidade e autodepreciação.

"Até uma pessoa com um derrame faria melhor que isso" resmungou para si mesmo, sem esconder o tom ácido na voz.

A voz familiar e cheia de entusiasmo de Alastor cortou o ar, surpreendendo Lúcifer e fazendo-o dar um salto involuntário para trás.

"Sério mesmo? Estou vendo o que acho que estou vendo, ou é um delírio dos meus magníficos olhos?" Alastor perguntou, a diversão evidente em sua voz.

Lúcifer virou-se bruscamente, sem saber como reagir. Por um breve momento, ele ficou congelado, os olhos arregalados, como se tivesse sido pego em flagrante. O sorriso de Alastor se alargou, um brilho brincalhão dançando em seus olhos rubros. Ele riu, uma risada que ecoou pela sala, e Lúcifer, que normalmente sabia exatamente o que dizer ou como agir, encontrou-se desarmado pela situação.

"Não ria de mim, Al!" murmurou Lúcifer, tentando recuperar a compostura, mas ainda sentindo o embaraço esquentar seu rosto.

Alastor se aproximou com passos leves, felinos, sem nunca deixar de exibir aquele sorriso provocador que parecia iluminar a escuridão ao seu redor. Ele parou diante da pilha de patinhos defeituosos e, sem hesitar, pegou o mais grotesco de todos, segurando-o entre os dedos longos e analisando-o com uma expressão exageradamente séria.