(9 anos atrás)
Estava correndo. Não só uma simples corrida. Era uma corrida que, se você parasse, com certeza a morte seria certa.
Minha mãe estava com uma faca na mão atrás de mim. Eu quebrei seu melhor perfume, mas eu juro que foi sem querer. Só que ela jamais iria aceitar minhas desculpas. Essa é a realidade, quando meu pai sai para trabalhar, ela esquece que sou seu filho.
- Volta aqui, seu moleque. Vou fazer sua existência acabar com as minhas próprias mãos. - Ela estava vermelha de ódio. Aquilo não era minha mãe. Era o diabo tomando conta de seu corpo.
Ainda correndo, eu comecei a chorar. Chorar porque não sabia do motivo disso tudo. Chorar porque carrego uma imensa culpa em minhas costas. Chorar porque minhas pernas estão se queimando, vou cair a qualquer instante.
Avisto uma floresta fechada. Olho para trás e vejo que minha mãe ainda está me seguindo. Tenho uma certa repugnância de entrar naquela floresta medonha. Mas talvez. E só talvez. Eu consigo me livrar da morte.
Eu corro sem parar, o som dos meus passos é abafado pelo chão coberto de folhas secas. A floresta ao meu redor é escura e assustadora, com sombras se esticando como mãos tentando me agarrar. As árvores altas parecem se fechar sobre mim, seus galhos curvados parecem dedos retorcidos.
Meu coração bate forte no peito, e o ar frio rasga minha garganta a cada respiração. O medo me impulsiona, mas não sei se estou correndo para longe do perigo ou diretamente para ele. Cada ruído, cada farfalha de folhas me faz acelerar, e tudo que consigo pensar é em sair dali, antes que a escuridão me engula por completo.
Olho para trás e não vejo minha mãe. Então percebo que estou perdido. Perdido em uma floresta de terror.
Meu corpo se treme a cada coaxar dos sapos e a estridulacão dos grilos. Meus pés, que estavam de calços, sentia a umidade do solo.
Então, como se já não bastasse todo esse sentimento horrível, escuto galhos se quebrando atrás de mim. Olho rapidamente na direção em que ouvi o som e não vejo nada. De repente, consigo ver uma sombra que corre tão rápido quando eu, que estava correndo a segundos atrás. Eu não consigo mais.
Sinto minhas pernas falharem enquanto o peso do desespero toma conta de mim. Não consigo mais me segurar, caio de joelhos no chão frio, sem forças. Minhas mãos tremem, meus dedos apertam a terra com tanta força que chegam a doer, mas nada parece real. O nó da minha garganta é insuportável, e antes que eu perceba, as lágrimas começam a correr pelo meu rosto. Mas parecia que isso não aliviava minha dor, chorar em silêncio não era o suficiente. Então, comecei a gritar. Gritar porque eu não tinha ninguém para colocar a mão em meu ombro e dizer que "está tudo bem". Eu estou sozinho. Para sempre.
- Ei. - Ouço uma voz doce, era um anjo.
- Garoto, pare de gritar. - A voz novamente fala comigo.
Começo a cessar meus gritos e abro meus olhos. Dou de cara com uma moça gordinha e com lindos olhos me encarando. Seu olhar era de preocupação.
A garota fortinha segura meus ombros com as mãos mais delicadas que já senti. Seus olhos eram castanhos e tinham um brilho indecifrável, seus longos cabelos da mesma cor que seus olhos balançavam de acordo com o vento. Ela era um anjo na terra.
Ainda com as mãos em meus ombros, ela se ajoelha em minha frente e me abraça.
Quando ela me abraça, sinto algo completamente novo, uma sensação que nunca experimentei antes. O calor do corpo dela contra o meu me faz esquecer tudo ao redor. Parecia que aquela imensa floresta assustadora tinha virado um jardim mais lindo que já vi em toda minha vida.