Capítulo 3

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POV DARYL
O aroma do jantar feito por Martina penetra em minhas narinas e meu estômago logo dá sinais. Meus passos são interrompidos ao vê-la, Martina estava diferente, algo havia mudado. Seu cabelo estava preso, mas com um aspecto mais arrumado.
Aproximo-me lentamente, tentando me aproximar pois a culpa do episódio anterior ainda me fazia mal.
O ambiente está acolhedor, e o jantar parece delicioso. Martina se vira e nossos olhares se encontram. Há uma suavidade em seus olhos, uma serenidade que eu não tinha percebido antes de me sentir culpado, porque nunca a olhei nos olhos.
-Martina, o jantar está com um cheiro maravilhoso. - Digo, tentando quebrar o gelo.
Ela solta um sorriso tímido, mas sincero.
-Obrigada. Espero que você goste.
Quando o jantar termina, Martina fica em silêncio por um momento recolhendo a louça, e então diz suavemente,
-Eu... pretendo ir embora amanhã, não vou esperar o casamento.
Fico surpreso e confuso ao mesmo tempo, pois achei que a tivesse convencido a ficar, na mesma hora penso em Carmen... Ela vai me matar. 
-Ir embora? Para onde?
Ela abaixa os olhos, parecendo hesitante.
-Esse tempo aqui com todos tem sido muito importante, mas aqui não é meu lugar Daryl, nunca vou me acostumar com esta cidade.
Mais uma vez penso em Carmen e tento convencer Martina do contrário.
-Olha, você não precisa fazer isso. Eu já te pedi desculpas por aquele dia, prometo que nunca mais vou deixar alguém te magoar. Mas se é isso que você realmente quer... eu vou respeitar sua decisão.
-Obrigada, Daryl. Isso significa muito para mim.
Afasto-me, sentindo o peso de sua decisão, mas ao mesmo tempo, compreendendo a necessidade de uma pessoa como ela não querer fica aqui. 


No outro dia, Martina se prepara para voltar a Porto Rico. A manhã está ensolarada, mas há uma sombra de melancolia no ar. A despedida é silenciosa, cada um de nós envolto em nossos próprios pensamentos. Quando ela finalmente se despede de Elena e Tatia, seus olhos estão cheios de determinação, mas também de uma tristeza palpável.
Quando chega minha vez de me despedir, hesito por um momento, mas então a abraço. No instante em que nossos corpos se tocam, sinto algo inesperado. Um calor reconfortante, uma espécie de eletricidade passando por mim. É uma sensação que não consigo definir completamente
Martina parece sentir o mesmo, pois ela segura o abraço um pouco mais, como se também estivesse relutante em se afastar.
-Cuide-se, Martina.
Assim que ela se vai, a casa parece estranhamente vazia. Tento me concentrar nas minhas tarefas, saio como sempre disfarçado em alguns momentos, mas a ausência de Martina é impossível de ignorar. A sensação daquele abraço permanece comigo, como uma sombra persistente.
Carmen está magoada comigo por Martina. Como eu pude deixar Peter e aquela cretina fazer aquilo? Minha própria mãe quase não vem mais me visitar, ela manda Alejandro em seu lugar trazer algumas coisas de que preciso, e minhas noites tem sido regadas a bebidas e algumas garotas de programa da cidade vizinha.
Os dias passam devagar e as noites são especialmente solitárias, quando a casa fica em silêncio minha mente começa a vagar e chego à conclusão que odeio ficar sozinho.
Uma noite, enquanto estava sentado na beira da piscina olhando para o céu estrelado, meu telefone vibra. É uma mensagem de Martina.
-Oi, Daryl. Cheguei bem em Porto Rico. Desculpe não mandar mensagens antes, mas só agora consegui vir a cidade para ter algum sinal. Estou tentando me ajustar, mas sinto muita falta de vocês. Espero que estejam todos bem.
Ao ler a mensagem, um sorriso involuntário se forma no meu rosto. Por que uma simples mensagem dela me deixou mais animado? Eu não aguento mais não ter alguém para conversar diariamente, a casa está praticamente abandonada e sinto uma falta terrível de Carmen, eu preciso concertar as coisas.
Decido que preciso buscar Martina, não posso ficar aqui sozinho por um capricho! Ela não pode querer ficar naquela vila de fim de mundo, onde não tem nem sinal de celular.
Sem pensar muito, começo a planejar uma viagem para Porto Rico. A preparação é rápida, faço as malas, organizo tudo e compro uma passagem para o próximo voo disponível, com meu documento falso é claro.
Chego a Porto Rico e o clima quente e úmido é um contraste com Nova Iorque, mas ao mesmo tempo eu adoro essa sensação, principalmente por saber que não estarei preso naquele bangalô.
A primeira coisa que faço é me dirigir ao endereço que Carmen me forneceu antes de partir. O caminho até lá parece interminável, mas finalmente, chego à pequena casa onde Martina mora com Esmeralda sua mãe. É uma construção simples, cercada por plantas, areia e alguns barcos de pesca.
Bato à porta e após alguns momentos, ela se abre e Martina está ali, de pé, surpresa ao me ver. Seus olhos se arregalam, e um sorriso hesitante se forma em seus lábios.
-Daryl? O que você está fazendo aqui? - Pergunta ela, a voz cheia de incredulidade.
-Eu... Não quero ficar sozinho. Carmen está na casa de Olívia e Matt, e eu não encontrei ninguém para substituir você. - Digo, tentando encontrar as palavras certas para explicar minha presença.
Martina me observa por um momento, como se estivesse avaliando a situação. Finalmente, dá um passo para o lado e me convida a entrar.
-Entre, então.
Enquanto entro, percebo que a casa é um reflexo da vida simples de Martina, mas também da complexidade de sua situação atual. No entanto, logo percebo que Esmeralda, a mãe de Martina, está observando a cena com uma expressão de curiosidade e preocupação.
-Martina, você está recebendo um visitante inesperado? - Pergunta Esmeralda, com sua voz carregada de uma leve surpresa. - Não é comum receber visitas assim.
Martina sorri para a mãe e tenta explicar, mas Esmeralda parece cada vez mais intrigada.
-É uma visita importante, mãe. Daryl e eu precisamos conversar sobre algumas coisas.
-Daryl? Mas Carmen não me avisou sobre isso! E você chegou chorando em casa filha -Esmeralda, claramente preocupada, dá um passo à frente e continua.
– Daryl? Não entendo o porquê vir até aqui quando tem muitas pessoas dispostas a trabalhar para você.
-Dona Esmeralda, eu estou em uma situação difícil e Martina sabe disso, não posso ter minha identidade revelada por enquanto, você se lembra disso Martina?
-Entendo, querido, mas só quero garantir que esteja tudo bem. O que Martina decidir sempre terá o meu apoio, mas gostaria de entender melhor o que está acontecendo.
Martina olha para mim, depois para sua mãe e percebendo a necessidade de uma explicação mais clara. Ela respira fundo e diz que depois conversa com Esmeralda.
- Filha, se precisar de algo ou se precisar de mim, me avise.
Esmeralda se retira para outro cômodo, permitindo que Martina e eu possamos ter a privacidade necessária para nossa conversa.
-Martina, eu realmente não posso ficar sozinho. Carmen está na casa de Olívia e Daryl, e eu não encontrei ninguém que possa substituir você. A situação é complicada porque não posso permitir que outra pessoa trabalhe para mim e revele minha identidade.
Martina me olha com uma expressão de surpresa e preocupação.
-Daryl, eu não sei...
Ela se levanta do sofá e seu cabelo ruivo, que estava jogado para o lado, agora cai livremente sobre seus ombros. Ela começa a enrolar uma mecha entre os dedos e faz menção de prendê-lo.
-Não prenda, deixe seu cabelo solto, está lindo - Digo, tentando trazer um pouco de leveza à situação.
Martina para surpreendida, e me olha com um brilho curioso nos olhos. A expressão dela se suaviza, e ela solta a mecha de cabelo, permitindo que ele caiam em ondas soltas e naturais sobre seus ombros. O gesto é simples, mas parece iluminar o ambiente.
-Você realmente acha? - Pergunta ela, com um sorriso tímido começando a se formar.
-Sim, de verdade - Respondo, sentindo um novo grau de intimidade. - Sinceramente, eu não consigo lidar com isso sozinho. Eu sei que minha identidade precisa ser mantida em segredo, e a última coisa que quero é que alguém que não esteja preparado acabe revelando isso.
-Daryl, eu vou voltar a trabalhar na sua casa. Sei que isso é importante para você e para a segurança das meninas, mas depois que tudo se resolver eu vou voltar para Porto Rico.
-Martina, isso significa muito para mim - respondo, com sinceridade. - Eu sei que você está fazendo isso não apenas por mim, mas todos. Eu vou providenciar as passagens para amanhã mesmo, só preciso achar um hotel para me hospedar essa noite.
Enquanto conversamos, Esmeralda, entra na sala com um olhar gentil e acolhedor. Ela parece ter ouvido parte da conversa
-Daryl, ouvi sobre o que você está passando e quero oferecer um pouco de hospitalidade - diz Esmeralda, com um sorriso caloroso. - A casa é simples, mas será um prazer acolher o filho de Carmen com amor.
-Obrigado Esmeralda, está um pouco tarde e eu vou aceitar.
Ela me dá um breve sorriso e se retira, deixando-me para acomodar-me no quarto. Enquanto me preparo para passar a noite, sinto uma mistura de alívio e gratidão. A hospitalidade de Esmeralda é um gesto que traz um pouco de paz em meio ao caos, e esse gesto de carinho me faz sentir que estou entre amigos, um sentimento que o velho Daryl seria incapaz de valorizar.
Acordo às cinco da manhã com sede e vou até a cozinha para tomar um copo d'água, enquanto bebo, algo pela janela chama minha atenção. O céu está começando a clarear no horizonte, e a vista do oceano é magnífica. Então, vejo Martina entrando no mar, completamente nua e por um momento, fico paralisado, sem saber o que fazer ou pensar. A cena é tão inesperada quanto íntima e sinto uma mistura de surpresa e curiosidade. Martina se move com uma graça que nunca havia percebido antes, a água envolvendo seu corpo enquanto ela se afasta da praia faz com que ela pareça tão em paz, e tão livre, que me sinto um intruso em sua privacidade.
Lentamente, me afasto da janela, tentando respeitar o momento dela, coloco o copo de volta na pia e retorno ao quarto, mas não consigo tirar a imagem da minha mente. Há uma beleza crua e vulnerável em ver alguém em um momento tão pessoal, e isso me faz pensar sobre tudo o que ela tem passado e como pouco eu realmente sei sobre ela. Martina volta para a casa cerca de meia hora depois parecendo revigorada, ela entra para tomar um banho de água doce, não percebe que eu a observei, e eu não menciono nada.
Mais tarde, no café da manhã, me sinto um pouco tímido e desconfortável. A lembrança da madrugada ainda está fresca, e não sei como agir diante dela. Martina percebe minha hesitação e me olha com curiosidade.
-Está tudo bem, Daryl? - pergunta ela, levantando uma sobrancelha.
-Sim, claro - respondo rapidamente, tentando soar natural, mas minha voz sai um pouco trêmula. - Só não dormi muito bem.
Ela me observa por um momento, parecendo desconfiada.
-Tem certeza? Você está meio... diferente hoje.
Forço um sorriso e tento relaxar.
-Só um pouco cansado, eu acho. Nada de mais.
Martina não parece completamente convencida, mas não insiste. Continuamos a comer em silêncio, e percebo que preciso esclarecer as coisas antes que ela tire conclusões erradas.
-Martina, posso te dizer uma coisa? - começo, tentando soar casual.
-Claro - responde ela, curiosa.
-Hoje de manhã, quando acordei cedo para tomar água, acabei vendo você na praia... entrando no mar.
Ela fica vermelha instantaneamente, seus olhos arregalados.
-Oh meu Deus, Daryl, eu não sabia que você estava acordado! - diz ela, visivelmente envergonhada.
-Desculpa, eu não queria te assustar ou invadir sua privacidade. Só fiquei surpreso, sabe? Não imaginava que uma moça como você entrasse no mar dessa forma.
Martina respira fundo e ri nervosamente.
-É, eu... gosto de nadar no mar de manhã cedo. Me faz sentir livre, de certa forma. Mas que nunca pensei que alguém pudesse me ver.
Martina se levanta tamanha é sua vergonha, mas eu a seguro com leveza pelo braço para acalma-la.
-Fique Calma, não vou contar para ninguém - digo, tentando aliviar a tensão. - Só queria que você soubesse que não estou julgando. Foi... uma cena... bonita.
Ela sorri timidamente e parece relaxar um pouco.
Depois do café da manhã, o céu se escurece rapidamente, e a chuva começa a cair com força. A tempestade é intensa, com relâmpagos e trovões que sacodem a casa, não consigo sair da para pegar sinal na cidade e comprar as passagens de volta.
-Parece que a tempestade vai nos atrasar um pouco. - Digo
Martina se aproxima, preocupada com a situação.
-A tempestade está forte, melhor não sair de casa até que passe. A estrada pode estar perigosa.
Enquanto a tempestade continua lá fora, passamos o dia conversando. O barulho constante da chuva e o som distante dos trovões criam uma espécie de refúgio acolhedor. À medida que a conversa flui, percebo que a companhia de Martina se torna cada vez mais agradável. A tensão que senti ao chegar começa a se dissipar, substituída por um sentimento bom.
Quando finalmente olhamos para o relógio, ficamos surpresos ao perceber que o dia passou muito rápido.
-Não posso acreditar que o dia passou tão rápido - digo, com um sorriso.
-Eu também não - responde Martina, com um sorriso caloroso. - Foi um dia inesperado, mas muito bom.
Quando a noite se aproxima, Esmeralda retorna do trabalho. Ela entra na casa com uma expressão cansada, mas ainda assim sorridente.
-Olá, Daryl! - diz Esmeralda, dirigindo-se a mim com um sorriso. - Vejo que a tempestade atrapalhou vocês. Como foi o dia?
-Oi - respondo, sentindo-me um pouco envergonhado. - O dia foi bem tranquilo, na verdade. Agora mesmo estou indo até a cidade conseguir sinal no meu telefone, comprar as passagens e falar com minhas filhas.
-Posso ir junto? – Martina pergunta. – E..eu também gostaria de falar com elas.
-Claro, Martina – respondo.
Esmeralda, observando a interação, sorri e acena com a cabeça, parecendo aprovar a ideia.
-Tenham cuidado lá fora - diz ela. - A estrada ainda pode estar um pouco complicada por causa da chuva.

Depois de conseguirmos chegar ao café da cidade e pegar algum sinal, Martina pega o telefone com cuidado e começa a conversar com minhas filhas. A interação é carinhosa e cheia de risos, e vejo o quanto Martina se importa com elas. Sinto algo que não consigo descrever ao ver toda a pureza dela com as meninas. É como se uma nova camada de Martina se revelasse diante de mim, mostrando um lado afetuoso e protetor que eu não havia percebido antes.
Enquanto Martina conversa, seu rosto se ilumina, e a alegria é evidente em seus olhos. As meninas parecem adorar falar com ela, e os risos são contagiantes. Sinto meu coração se aquecer ao observar a cena, percebendo que há uma conexão genuína entre Martina e minhas filhas.
Quando Martina termina a conversa e devolve o telefone, ela ainda está sorrindo.
-Eles são adoráveis - diz ela, com um brilho nos olhos.
-Sim, são - concordo, sorrindo. - E parece que você já conquistou o coração delas.
Martina ri, um som suave e cheio de alegria.
-Espero que sim. Quero que elas saibam que sempre estarei aqui para elas, assim como para você, Daryl.
Seus olhos encontram os meus, e há uma sinceridade neles que me toca profundamente. Não consigo evitar o olhar diretamente para seus lábios. Martina percebe meu olhar e sua expressão suaviza. Por um momento, o tempo parece parar, e o mundo ao nosso redor desaparece.
-Daryl... - ela sussurra, a voz quase inaudível, mas cheia de emoção.
-Martina, eu... - começo, mas antes que eu possa terminar, a porta do café se abre, quebrando o encanto do momento.
Voltamos à realidade, um pouco desconcertados, mas ainda cientes do que acabara de acontecer. Procuro o aplicativo do Voos mas infelizmente só há passagens para amanhã a noite, Martina então me convida para passar mais uma noite em sua casa
-Daryl, parece que vamos vai ter que passar mais uma noite aqui. - Martina diz, com um olhar compreensivo. - Se quiser, você pode ficar lá em casa de novo, mamãe já me disse.
-Não quero atrapalhar.
-Não se preocupe com isso - Ela responde, sorrindo de volta.

Deito-me na cama, mas a tranquilidade do quarto não é suficiente para acalmar minha mente agitada. A cama é confortável, e o ambiente é sereno, mas pensamentos persistentes não me deixam descansar.
Penso na imagem de Martina conversando com minhas filhas. O sorriso dela, o brilho nos olhos e a maneira carinhosa como ela falou com elas me atormentam e eu não consigo evitar refletir sobre o que tudo isso significa.
Viro de um lado para o outro, tentando encontrar uma posição que traga algum alívio, mas a inquietação é imune ao descanso físico. Levanto-me e vou até a janela, olhando para o céu estrelado. A calma da noite lá fora parece contrastar com o turbilhão interno que estou vivendo. Ela é apenas uma garota caipira, eu não posso ter esses pensamentos absurdos! Eu e Martina não temos nada a ver. Isso é ridículo! Volto para a cama e tento relaxar, respirando profundamente na esperança de que meus pensamentos se acalmem.

Acordo tarde, pois a noite passada foi marcada por insônia e pensamentos inquietantes. Quando finalmente levanto, encontro um bilhete deixado por Martina, junto com os bolinhos de carne que eu tanto gosto. O bilhete diz:

Daryl,
Hoje eu preciso ajudar meu tio Roberto nas aulas de mergulho para ganhar um dinheiro extra. Se você se sentir sozinho, me encontre ao 12:00 na Rocha Grande Madre. Estarei de volta até lá.

Enquanto saboreio os bolinhos, penso em encontrá-la e no horário combinado sigo até a Rocha Grande Madre, ao chegar, avisto Martina se aproximando, e a cena diante de mim novamente me deixa confuso, ela está vestida com roupas de mergulho, e o sol que brilha sobre seus cabelos ruivos cria uma cena fascinante. A maneira como as roupas de mergulho acentua suas curvas que costumam ficar escondidas sob roupas largas e cafonas, revela um lado dela que eu não conhecia. Há uma elegância inesperada na forma como ela se move, uma confiança que parece emergir com cada passo depois que ela me vê.
Martina se aproxima e com um sorriso convidativo diz:
— Ainda temos tempo para um mergulho.
- Não sei se quero me molhar hoje — respondo, com um tom que mistura dúvida
— Não sei se mergulhar agora seria uma boa ideia, mas... — digo, hesitando enquanto olho para as ondas tranquilas e o brilho do sol sobre a água.
— Venha, só um mergulho rápido. Vai ser divertido e depois voltamos para casa para eu fazer as malas. – Ela diz me puxando pelo braço.

Enquanto o sol se inclina para o horizonte, Martina e eu nos preparamos para o mergulho. A água está morna e convidativa, ela dá um último olhar para mim, com um sorriso encorajador, e mergulha com uma graça natural que parece desafiar a própria gravidade.
Desço a bordo, seguindo seu exemplo, e sinto o frescor da água envolver meu corpo, aliviando a tensão acumulada. Bolhas que escapam de nossos respiradores dançam à luz do sol que penetra a superfície, criando um espetáculo. Enquanto nadamos juntos, Martina se move com uma leveza que é quase hipnótica. Eu estava longe, envolvido em meus próprios conflitos e distrações, mas o olhar de Martina, a paixão e a serenidade com que se entrega ao mergulho me deixam mais confuso ainda, em seguida ela me faz sinal para olhar o cardume de peixes coloridos, e tudo a nossa volta faz com que eu esqueça que logo mais estaremos embarcando para Nova Iorque.
Quando finalmente emergimos da água, Martina está ao meu lado, seu rosto está radiante e ainda brilhante com as gotas de água. Seus olhos, que parecem ser um reflexo do mar, estão fixos nos meus com uma intensidade que não posso ignorar. Nossos rostos estão tão próximos que posso sentir a respiração dela misturando-se com a minha. O momento é carregado de uma expectativa silenciosa, quando a onda nos alcança e a realidade do momento se reestabelece, vejo o rosto de Martina se iluminar com um rubor de vergonha. Ela desvia o olhar e, com uma expressão de leve constrangimento, diz:
— Acho que é hora de voltarmos.
A voz dela, embora suave, carrega um tom de decisão que não deixa espaço para discussões. Martina começa a nadar em direção à praia, tentando recuperar a compostura. O rubor em suas bochechas e a maneira como ela evita o meu olhar revelam que o momento íntimo a pegou de surpresa, deixando-a um pouco desorientada.
À medida que nadamos de volta, o sol começa a se pôr, lançando um brilho dourado sobre a água e criando um contraste com o sentimento de confusão que ainda paira entre nós. O silêncio que se estabelece é carregado de novas perguntas.

Falta uma hora para irmos para o aeroporto, vou até a cozinha tomar um copo d'água e paro ao passar pelo quarto e ver Martina organizando suas malas. Cada movimento dela é cuidadoso, quase automático, como se o ato de arrumar suas coisas pudesse ajudá-la a colocar em ordem seus pensamentos. O tom rosado ainda tinge suas bochechas, e a sensação de desconforto que paira no ambiente é palpável.
Eu me aproximo da porta entreaberta, hesitante e respiro fundo antes de me aventurar a falar. A tensão que sinto é quase física, uma mistura de arrependimento e preocupação que me impede de simplesmente ignorar o que aconteceu.
— Martina, posso falar com você um momento? — minha voz sai um pouco trêmula, mas tento manter um tom calmo e respeitoso.
Ela levanta a cabeça, surpresa, e faz um gesto para que eu entre. Dou um passo para dentro do quarto, sentindo o peso da responsabilidade pelo que aconteceu.
— Olha, eu... — começo, tentando encontrar as palavras certas — sobre o que aconteceu antes, eu quero me desculpar, não era minha intenção criar um momento desconfortável ou te forçar a nada. Eu...
— Está tudo bem — ela responde, com a voz ligeiramente trêmula.
— Entendo. E eu só quero que você saiba que nunca vou fazer nada que te deixe desconfortável. Foi um momento que me pegou de surpresa, e eu não quero que isso afete nossa amizade.

POV MARTINA
Eu olho para Daryl, com o coração pesado com a complexidade do momento. E a sensação de que algo mais poderia acontecer entre nós é esmagadora, mas eu sei que não posso permitir que isso avance. Eu não posso deixar mais nada acontecer, não posso levar esse sentimento adiante. Daryl está carente e sozinho, e isso complicou ainda mais a situação.
Ele sai em meio ao vácuo que se formou entre nós naquela situação, e sozinha no quarto, o silêncio se torna quase opressivo. Enquanto arrumo as últimas coisas em minha mala, minha mente continua a girar em torno dos eventos do dia. Me sento na beirada da cama e o peso das dúvidas e inseguranças me atingem com uma força inesperada.
— Daryl nunca se apaixonaria por alguém como eu — digo com a voz baixa e carregada de uma tristeza que não consigo ignorar.
Essa ideia persiste, uma sombra constante que obscurece qualquer tentativa de clareza. Ele está sozinho, e talvez, naquele momento, tenha visto algo em mim que não era realmente sobre mim, mas sobre a necessidade de preencher um vazio. O pensamento de que ele possa ter se interessado por mim apenas como uma solução temporária para sua solidão me machuca.
Eu me pergunto se ele realmente poderia ver além do superficial, se ele poderia se apaixonar por alguém que, como eu, se sente tão insegura e deslocada. O quase beijo que tivemos parece agora um lembrete doloroso de que a conexão que eu imaginei talvez não tenha sido real, mas apenas um reflexo de um momento de necessidade.
O peso dessas reflexões me faz sentir ainda mais isolada. Olho para o meu reflexo no espelho, e a imagem que vejo parece estranha, alguém que não consegue acreditar que poderia ser vista de maneira diferente. Será que algum dia eu conseguirei me ver como alguém digno de amor verdadeiro, ou continuarei a me sentir como uma passagem sem importância na vida de alguém?
Meu turbilhão de pensamentos é abruptamente interrompido quando ouço a batida suave na porta. Daryl aparece, com o rosto no vão da porta entreaberta.
— Martina, precisamos ir.

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