Capítulo 3 - Harry

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Autor: Brendon SS.

O peso do frock coat preto que caía até seus joelhos era quase reconfortante, uma camada adicional de proteção contra o frio cortante naquela estação do ano de 1884. Harry, observando pela janela de seu quarto, as pessoas chegando aos poucos em sua residência, todas vestidas com o mesmo luto e estado de espirito. Seu acampamento, um pequeno vilarejo oculto na floresta densa nos arredores de Cambridge, estava envolto em uma quietude sombria.

O jovem caminhou até um grande espelho ao lado de sua cama. Seus cabelos, marrom-escuros e ondulados, eram de um comprimento médio, caindo em camadas soltas e desordenadas ao redor de seu rosto, foram colocados para trás, deixando seu rosto à mostra. O reflexo revelava os olhos verdes que contrastavam com a esclera avermelhada, uma lembrança silenciosa das lágrimas derramadas durante a noite.

Harry ajustou o colarinho alto e rígido, finalizando o traje com uma um laço preto que apertava seu pescoço e caía sob sua camisa branca.

Uma batida em sua porta, o despertou de um transe melancólico, em que olhava diretamente para sua imagem refletida no espelho.

- Pode entrar. - respondeu Harry em um tom firme, evitando mostrar sua fragilidade naquele momento.

Um rapaz alto, de cabelos loiros bem arrumados e olhos azuis extremamente penetrantes, entrou no quarto. Com um olhar pesado e preocupado que recaiu sobre Harry, era Ezreal, seu melhor amigo.

- Como está se sentindo? - perguntou uma voz hesitante, talvez percebendo que a pergunta não foi adequada, já que sabia que seu amigo não estava bem. - Devo te chamar de... senhor?

- Relaxa, Ez. As coisas não mudaram entre nós. - respondeu Harry, tentando dar uma leveza à situação, mas não conseguindo disfarçar o quanto estava abatido.

Ezreal imediatamente percebeu os sinais de uma noite difícil para Harry, mas não comentou sobre sua aparência. Era pedir demais naquele momento.

- Lembre-se, Harry. Como novo líder, não pode mais demonstrar fraqueza na frente de nenhum deles. - aconselhou Ezreal, colocando a mão no ombro do amigo e encontrando o olhar de seu amigo pelo espelho. - Chore o quanto quiser agora, ou durante a noite, mas depois que estiver pronto e sair por aquela porta, todos eles o verão de outra forma.

- Eu sei, obrigado. - respondeu Harry com pesar na voz. - Quanto tempo eu tenho?

- Está na hora, na verdade. - Ezreal pressionou um pouco mais o ombro de Harry, demonstrando sua empatia para com o amigo.

Harry assentiu. Um último olhar no espelho, um ajuste final no casaco. A respiração foi tomada profundamente, e os ombros, antes curvados pelo peso da dor, foram endireitados.

- Vamos acabar logo com isso. - murmurou ele.

Ezreal assentiu e se virou, caminhando em direção à porta com passos controlados. Quando alcançou a saída, ele pausou por um instante e virou-se novamente ao amigo.

- Te aguardo lá embaixo. - disse Ezreal, sua voz suave, carregada de empatia. Com um movimento cuidadoso, ele abriu a porta e saiu, fechando-a quase sem fazer som algum.

Harry esperou o tempo de Ezreal chegar ao saguão principal e, em seguida, caminhou para o mesmo local. Descendo as escadas da casa principal, ele percebeu o silêncio que começou a se formar assim que ouviram os passos. Sentia os olhos de todos sobre si. Estava acostumado com isso, entretanto não os queria naquela situação. Ele ainda não tinha visto a cerimônia, não havia saído do quarto enquanto a montavam. Seus olhos verdes caíram sobre o caixão de madeira escura que repousava no centro, ornado com flores brancas e cercado por velas que dançavam conforme o ar ambiente. Todos os presentes estavam visivelmente tristes; o vilarejo era uma grande família, e a morte de cada um era sentida como tal.

Herança SombriaWhere stories live. Discover now