Foi a gota d'água. Meu pai exigia de mim um casamento para o qual eu não estava preparada.
Cansada de discutir com ele e do mau ambiente que nos últimos tempos rondava a nossa casa, eu decidi por fim a tudo.
- Não adianta. Não vou servir de moeda de troca para as suas trafulhices. Fez as dívidas, então pague o senhor.
- Uma filha deve obediência ao pai e se eu digo que casas vais casar.
- Prefiro a morte. Esse asqueroso do Tobias nunca terá o meu corpo. O senhor trate de desfazer essa promessa porque eu não caso.
Meu pai perdeu a cabeça. Desafivelou o cinto das calças e levei a maior sova da minha vida.
Impávida e serena a minha madrasta assistia a tudo esboçando um sorriso de satisfação. Desde a morte da minha mãe e quando ela veio morar connosco, nós duas nunca tivemos uma convivência fácil.
A minha mãe morreu ao saltar de uma ponte para o rio e embora ninguém falasse do assunto, eu sei que ela não superou a traição do meu pai. Eu tinha doze anos e aquela época foi a mais difícil da minha vida.
Sem se importar comigo, o meu pai assumiu logo a outra e desde então eu fui tratada como uma serviçal.
Felizmente não me tiraram da escola e durante o horário escolar era o período em que eu estava feliz.Sempre que terminavam as aulas e antes de regressar a casa eu fazia duas horas de trabalho na casa de dona Rosa, uma idosa que vivia sózinha. O dinheiro que ganhava fui juntando porque sabia que mal terminasse o liceu não tinha meios para ir para a faculdade.
Aos 18 anos pensei sair de casa, mas ou trabalhava ou estudava, porque pagar uma renda e outras coisas mais exigia muito trabalho. Decidi continuar na casa de meu pai, contar que havia ganho bolsa de estudo na faculdade.
E era verdade em parte. A bolsa não era integral, mas pelo menos não pagava propinas e isso era uma grande ajuda.
Estou no terceiro ano de arquitectura e perante as exigências do meu pai, sei que terei que abandonar a Universidade.
Precisei apanhar esta sova para reagir. Com o corpo marcado pelo cinto, alguns cortes mais profundos sangravam, subi para o meu quarto e tranquei a porta.
Despi-me e fui para debaixo do chuveiro. Todo o meu corpo ardia. Olhei-me ao espelho e pelo menos o rosto tinha sido poupado.
Chorei, e como chorei, desesperada mas determinada a tomar novo rumo.
Preparei uma pequena mala com algumas roupas, os meus livros e saí de casa sem ter para onde ir.Meu pai não o vi, mas a megera estava na cozinha quando eu passei.
- Já vais tarde. - Foi a única coisa que ela disse.
- Vai para a pqp sua vaca ordinária.
Ela largou o que estava a fazer e veio atrás de mim, mas eu já tinha passado a porta e saído.
- Vais voltar com o rabinho entre as pernas sua mal educada.
- Volto sim, mas para te dar um xuto na bunda e expulsar-te da casa da minha mãe.
Segui caminho e sentei-me na pracinha. Os meus pensamentos eram confusos, mas a vontade de dar novo rumo à vida era muita.
Onde ir? Quem me poderá ajudar neste momento? Pensei e pouco depois segurei firme na minha mala e fui.
Pouco tempo depois bati à porta da dona Rosa.
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Coração Malvado
FanfictionNão te feches ao amor. Não resistas. Deixa que a natureza haja no tempo certo.