Capítulo 3 - A fidalga vulgar

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Sara Buarque costumava se refugiar na última carteira da fileira próxima à janela, porém, naquele dia, a professora do Jardim pediu que todos se reunissem em grupos de quatro integrantes para uma brincadeira.

A mulher fidalga também anunciou os nomes das crianças que seriam as líderes de cada grupo, aquelas que possuíam a maior proporção de cor no cabelo — e que ganhariam balinhas auradas como premiação, com exceção do líder que figurasse na última colocação.

E é claro que Alana foi escolhida! Dentre todas as crianças daquela turma, era quem detinha o cabelo com a maior quantidade de mechas coloridas. O azul dela se espalhava caprichosamente por todo o cabelo — um indicativo, diziam os adultos, de que, quando chegasse à adolescência, ela seria uma jovem de cabelos totalmente azuis.

Embora Alana geralmente não se sentasse ao seu lado, preferindo a companhia de outras amigas, a irmã nunca escolhia outra criança a não ser a Sara para um trabalho em dupla, assim como negava participar de uma atividade em grupo que não incluísse a "vulgar da sala", como alguns ali gostavam de chamá-la. Ainda assim, Sara preferia muito estar sozinha no seu cantinho seguro, pois lá seus cabelos inteiramente negros chamavam pouca atenção em meio às madeixas de cor de seus colegas.

— Todos já estão em grupo? — perguntou a professora.

Cada líder escolheu três crianças para formar uma equipe. A professora até havia ido a outra sala de fidalgos pedir dois estudantes emprestados para, assim, arrematarem todos os grupos.

Com tudo preparado, a fidalga fechou as cortinas, mergulhando a sala numa penumbra. Em seguida, circulou pelos alunos, distribuindo em cada mesa — formada pela junção de quatro carteiras — uma flor de lumeia, cujas pétalas exalavam um brilho suave e encantador. Sara conhecia essa flor. Ela aparecia no Mago Mirim, por isso também sabia o que a professora explicou à turma: quando um fidalgo encosta nas pétalas dessa flor, elas assumem a cor da aura dele. A lumeia deixada na mesa de Sara brilhava em azul.

— Não toquem nela ainda — a professora apressou-se a dizer. — Vamos imaginar que a lumeia... é um desgarrado. E vamos assumir que vocês, crianças, são auranos!

Sara franziu a testa. Não sabia o que era mais difícil: conceber aquela flor como um monstro, ou se imaginar como uma adulta capaz de usar magia.

— Se o desgarrado na mesa for vermelho — continuou a professora —, quem vai conseguir derrotar o monstro?

— Um aurano vermelho — respondeu uma criança, com a mão levantada.

— Isso mesmo.

A professora, então, explicou o jogo. A cada rodada, seria decidida uma cor para a lumeia, e cada equipe precisaria ter alguém com a cor da aura correspondente para o líder marcar um ponto — rosa, azul, verde, amarelo, vermelho ou laranja. Nesta dinâmica, antes de cada rodada, todos os grupos eram obrigados a descartar um de seus integrantes e convidar outro que fora descartado das demais equipes. Além disso, a mesma cor não poderia ser sorteada por duas rodadas seguidas.

Os líderes logo perceberam que não adiantaria nada ter duas pessoas com o mesmo tom de aura no time. Por isso, já na primeira rodada, Sara foi substituída — com um pedido de desculpas no olhar da irmã — por uma criança de aura vermelha, para manter o máximo de diversidade possível na equipe de Alana.

Sara odiou aquele jogo que mal havia começado. Era pior do que sentar na primeira carteira em frente à professora.

Quando a terceira rodada trouxe um "desgarrado azul", o líder do grupo onde Sara estava sorriu satisfeito, acreditando ter garantido seu primeiro ponto após ter sido azarado nas duas primeiras. Contudo, quando Sara encostou na lumeia, que apresentava pétalas alaranjadas, ela não mudou de cor. O líder pediu que a menina usasse a outra mão e que mantivesse os dedos nas pétalas por mais algum tempo. Nada aconteceu.

Universo Aurano: Sara [e] AlanaOnde histórias criam vida. Descubra agora