Os Filhos da Lua: O pacto (Livro 1)

Dmitry Miracle

O dia da quase morte de Kato Swiftwater foi o ponto de virada para outras vidas além da de Aric Yohannes.

Podia-se afirmar que Dmitry Miracle era o mais próximo que Aric tinha de um irmão. Dois estranhos que a princípio só tinham uma coisa em comum para ligá-los: servir como bolsa de sangue.

Tiveram o azar de serem os mais resistentes ao se agarrarem no abraço quente da vida. Mas a morte chegou sorrateiramente até eles, sem pedir licença, e se disfarçou em cortejo. Os primordiais do Clã Alasca reconheceram tamanha determinação em se manterem vivos e assim o presentearam com a oportunidade de renascerem como criaturas da noite — ficaram deslumbrados com a ideia de criarem monstros tão ávidos naquela vida quanto foram em suas vidas humanas.

Por séculos, ambos sempre estiveram juntos ao lado do Conselho e se mostraram de grande utilidade nas batalhas Groenlandesas e posteriormente, nas do continente americano. Pelo menos até aquele fatídico dia.

Aric se via compromissado com um pacto envolvendo aqueles que lhe foram apresentados como inimigos naturais e Dmitry se viu fatalmente apaixonado por um ser humano. Era inimaginável que em uma pequena cidade como aquela, por muitos considerada como um mero fim de mundo, ele sentiria um amor supremo a arrogar seu coração.

Ace, era o nome.

Dmitry era um apreciador do afeto romântico sem tantos escrúpulos quanto seu irmão, mas infelizmente a imortalidade lhe trouxe o fardo de precisar aguentar a perda daqueles com quem se importava. A tristeza o lacerou por um tempo a ponto de sobrepor a vontade de se doar. Até conhecer aquela ilustre pessoa onde era quase certo que tudo que vinha desta o encantava como nunca antes. Começando com seu espírito livre bastante divergente dos velhos vampiros com seus complexos narcisistas.

Era um alguém cuja magnitude da arte rodeava. Ace usava esta como seu idioma universal, assim como sua manifestação de singularidade, o macrocosmo das cores e da imaginação, o portal da atuação teatral onde a alma era expressa. E tal língua fazia o coração de Dmitry pulsar a ponto de dançar ao som da esperança de amar novamente.

Vivia em seus dias mundanos, em seu trabalho mundano — em uma das lanchonetes mais famosas da cidade, Mrs Sunny — Quando tinha condições ajudava entidades de apoio que abrigavam pessoas transgeneres vítimas de abusos em Clearwater. Não importava o lucro que tirava no mês, sempre fazia um jeito de ajudar aqueles que lhe ajudaram na adolescência, quando ocorreu o episódio de expulsão de sua casa assim que tomou coragem para dizer para o mundo sobre sua identidade de gênero.

Dmitry observou o amor lhe consumindo como o fogo, concedendo desta vez a imortalidade à pessoa amada, já que nem a eternidade seria suficiente para expressar a gratidão que ele sentia por Ace ter despertado tal sentimento após séculos. E foi quando percebeu que o amor não é um fogo repentino crepitando o corpo e sim uma estrela constantemente acesa que guia com segurança o errante ao meio a desorientação, como uma bússola.

Dmitry renunciou sua posição no Clã de Alasca e poderia seguir com sua vida tranquila sendo apenas uma criatura sem clã, o que não aconteceu. Foi considerado Skogamor, e um perigoso. Era nítido que tudo não passava de mesquinharia vindo do Conselho, que não suportava a ideia de que um de seus monstros havia encontrado outra vida além daquela. De qualquer forma, ele se foi jamais esquecendo de seu irmão Aric, que viveu ao seu lado por tantos anos.

Junto com Ace, vivia discretamente em uma belíssima casa afastada do centro da cidade, e claro, de Red Illinor. Uma típica vida pacata em Clearwater, longe de conflitos entre clãs que eram raros ou quase nulos até aquele momento. Ace ainda não sentia necessidade de ir para cidade grande e gostava do que sua causa e arte representavam para a comunidade local, elu enxergava que lá muitas coisas aconteciam entre as sombras dos desprezos forasteiros. Seu parceiro também queria ao máximo passar despercebido, embora tivesse um estilo excêntrico, queria evitar as preocupações vindo daqueles que se achavam monarcas em seu mundo sanguinário.