Sussurros da revolução

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Desde cedo, aprendi o que é perder. Primeiro, foi minha avó, depois meus tios e, por último, minha mãe. Morreram acreditando que, um dia, as coisas poderiam ser melhores. Às vezes, eu queria poder ter a visão deles, ser tão otimista quanto eram.

Mas a verdade é que, mesmo se eu tentasse, acho que não conseguiria. Não quando a indigência é tanta, não quando tudo o que vejo é miséria. Estar acordada é sufocante; meus pés e minhas mãos doem o tempo todo, e, às vezes, quando vou dormir, minha única companhia é o buraco vazio na minha barriga.

Eu olho ao redor e vejo sempre a mesma coisa: rostos cansados, ombros curvados, olhos que já desistiram de brilhar. Todo mundo correndo, tentando sobreviver, mas ninguém parece realmente viver. Me pergunto como é que a gente aguenta. Como é que eu aguentei até agora? Porque, no fundo, eu sei que isso aqui não é vida. É só um fôlego forçado entre um turno e outro, entre uma conta e outra. E por mais que eu tente acreditar que um dia as coisas vão mudar, que esse esforço todo vai valer a pena, parece que estou andando em círculos.

Eu queria poder sonhar, como minha mãe sonhava, mas a realidade me puxa de volta. A cada vez que eu estendo a mão para alcançar algo mais, o sistema me empurra para baixo. Eu sinto como se estivesse afundando em areia movediça. E quanto mais eu luto, mais fundo eu afundo. Meus pés mal tocam o chão firme.

A verdade é que, por mais que eu queira, eu não consigo ver luz no fim do túnel. Tudo o que eu vejo são dívidas, cansaço, e o medo de não ter o suficiente para chegar até o fim do mês. A esperança parece uma coisa distante, quase infantil. Mas será que ela realmente vale de alguma coisa? Porque a gente sonha e sonha, mas no final, o mundo sempre arruma um jeito de esmagar esses sonhos.

Então, será que vale a pena sonhar? Será que eu deveria, como minha mãe e minha avó, viver esperando um milagre que nunca chega? Ou será que tem outra saída? Eu só não sei qual... e, sinceramente, nem sei se teria forças pra encontrá-la, mesmo que existisse.

"Nádia, Nádia, NÁDIA!"

Pulo da cadeira e meus olhos encontram os de Ana. Ela me encarava com a testa franzida.

"Desculpa, acabei me perdendo nos meus pensamentos."

"Você tem feito muito isso ultimamente", ela suspira. "Tem tomado seus remédios direitinho?"

"Tenho, mas não parece que ajudam em muita coisa. Além de metade do meu salário ir neles."

Fui diagnosticada com ansiedade e fobia social. O irônico é que trabalho com o público, o que só aumenta minha ansiedade e meu estresse. Vivo num ciclo de exaustão mental, tentando equilibrar minhas emoções enquanto enfrento situações que me deixam desconfortável o tempo todo.

Às vezes, eu só queria deitar minha cabeça no travesseiro e nunca mais acordar. Cada dia é um sacrifício. Coisas que parecem simples para os outros — como sair de casa, pegar um ônibus ou até mesmo atender o telefone — para mim, se transformam em tarefas gigantescas, quase impossíveis. É como enfrentar um dragão de sete cabeças a cada passo.

Então sigo a rotina que criei para mim: acordo cedo, vou para o trabalho e, em seguida, volto para casa. O mercado onde faço minhas compras fica perto de casa, então é sempre ali que vou. Aos sábados e domingos, quando não faço hora extra, fico em casa, assistindo algo e aproveitando minha própria companhia. Sei que sou patética, mas mesmo que quisesse, não conseguiria mudar minha rotina. Já tentei, mas, no fim, desisti. Como sempre.

Eu suspirei, cruzando os braços e olhando para o chão. “Eu não sei como você aguenta, Ana. Tem dias em que o peso das minhas preocupações parece que vai me esmagar... E você ainda tem duas crianças para cuidar.”

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