Correntes Cruzadas

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O sol começava a se pôr, pintando o céu de tons alaranjados, quando Clara finalmente decidiu voltar para casa. Seus pensamentos ainda giravam em torno de Taehyung, e o conflito interno crescia a cada passo que dava. Ela sabia que estava caminhando em um terreno perigoso, mas, por mais que tentasse, não conseguia afastar a ideia de que algo entre eles precisava ser resolvido.

No dia seguinte, Clara foi até a igreja. Não para assistir à missa, mas para esclarecer o que vinha sentindo. Precisava vê-lo, precisava de respostas. O caminho até lá parecia mais longo do que de costume, como se cada passo a aproximasse de algo inevitável.

Ao chegar à igreja, o ambiente silencioso a envolveu. O cheiro familiar de incenso, as velas queimando suavemente e as estátuas de santos imóveis, olhando-a com olhos julgadores. Clara sabia que ali, dentro daquele espaço, as regras eram claras, e o que sentia parecia um erro. Mas, mesmo assim, continuou a caminhar pelo corredor central, determinada a encontrar Taehyung.

Ela o viu na sacristia, preparando-se para a confissão. Sua presença imponente e ao mesmo tempo serena a fez parar por um segundo. Ele parecia tão imerso no papel que desempenhava ali, como se todo o conflito interno que sentira no rio estivesse escondido sob aquela fachada de fé e devoção.

Quando ele a viu, hesitou. O olhar que Taehyung lançou para Clara foi breve, mas carregado de significado. Ele se levantou devagar e caminhou em sua direção, o ambiente carregado de uma tensão que nenhum dos dois podia negar.

— Clara... — Ele disse, a voz baixa, como se já soubesse o motivo de sua visita.

— Precisamos conversar — ela respondeu, sem rodeios.

Taehyung olhou ao redor, certificando-se de que estavam sozinhos. Ele assentiu e fez um gesto para que ela o seguisse até o jardim atrás da igreja. O silêncio entre eles era opressor enquanto caminhavam, cada um lidando com seus próprios pensamentos.

No jardim, o som distante da cidade era abafado pela brisa suave que soprava entre as árvores. Taehyung se virou para Clara, mas havia um peso em seu olhar que ela não tinha visto antes.

— O que você quer de mim, Clara? — ele perguntou, quebrando o silêncio, sua voz cheia de tensão contida. — Eu estou tentando fazer o que é certo. Estou tentando manter a distância, mas você... — ele fez uma pausa, respirando fundo. — Você não sai da minha cabeça.

Clara sentiu seu coração acelerar. As palavras de Taehyung eram uma confirmação do que ela temia: ele também estava lutando. E aquela confissão, longe de aliviar, a fazia se sentir ainda mais perdida.

— Eu também não consigo parar de pensar em você — admitiu ela, sua voz um sussurro no meio do vento. — Mas, Taehyung, isso que está acontecendo entre nós... eu não sei como lidar com isso.

Taehyung esfregou o rosto com as mãos, visivelmente frustrado.

— Eu não posso — ele disse com firmeza, mas sua voz tremia. — Eu fiz votos, Clara. Votos que são a base de tudo o que sou. Se eu quebrá-los, o que resta de mim? Como posso ser o homem que prometi ser?

Clara sentiu um aperto no peito. Ela sabia o quanto aqueles votos significavam para ele, mas, ao mesmo tempo, não podia ignorar o que sentia. Sentia que estava em uma encruzilhada, incapaz de seguir em frente sem arriscar perder algo importante. Ela estava apaixonada por ele, embora nunca tivesse dito isso em voz alta. E agora, diante da dor que via nos olhos de Taehyung, percebeu que o peso de seus sentimentos era maior do que imaginava.

— Eu não quero te fazer quebrar seus votos — disse Clara, tentando manter a calma. — Mas o que eu sinto por você é real. E não posso simplesmente fingir que não está acontecendo.

— E o que você quer que eu faça? — perguntou Taehyung, a voz desesperada. — Que eu jogue tudo fora? Que eu abandone minha fé, meu propósito, por... isso?

Clara ficou em silêncio, as palavras de Taehyung cortando fundo. Ela sabia que ele estava sofrendo tanto quanto ela, mas o dilema que enfrentavam era impossível de ignorar.

— Não estou pedindo isso. — Ela disse suavemente, seus olhos fixos nos dele. — Só quero entender o que está acontecendo entre nós. Se isso é apenas uma ilusão... ou se há algo verdadeiro aqui.

Taehyung a encarou por um longo momento, seus olhos escuros cheios de dor e confusão. Ele parecia estar à beira de algo, prestes a explodir, mas lutando para manter o controle.

— Clara, eu sou um padre. Eu não posso me permitir sentir o que estou sentindo. E não posso te arrastar para isso.

O silêncio entre eles ficou pesado, como se o ar ao redor estivesse sendo drenado de toda a leveza. Clara sentiu as lágrimas começarem a se formar, mas tentou segurá-las. Ela não queria que ele a visse assim, tão vulnerável.

— E se fosse diferente? — Ela perguntou, sua voz trêmula. — Se você não fosse padre... se as coisas fossem diferentes... você me escolheria?

A pergunta pairou no ar, carregada de esperança e desespero.

Taehyung fechou os olhos por um momento, lutando contra seus próprios pensamentos. Quando finalmente respondeu, sua voz era baixa, quase um sussurro.

— Se as coisas fossem diferentes... sim, Clara. Eu escolheria você.

As palavras dele foram um golpe tanto de alívio quanto de dor. Saber que, em outro contexto, eles poderiam estar juntos tornava tudo ainda mais difícil. Clara sentiu uma lágrima escorrer por seu rosto e, antes que pudesse se controlar, outras vieram.

— Então por que não podemos tentar? — perguntou ela, quase em um sussurro. — Por que não podemos ver onde isso vai dar?

Taehyung balançou a cabeça, sua expressão cheia de angústia.

— Porque não é assim tão simples. Eu não posso simplesmente abandonar minha fé, Clara. Isso é quem eu sou. E eu não posso te prometer nada além de mais sofrimento se continuarmos assim.

Clara sentiu como se o chão estivesse desaparecendo sob seus pés. O dilema entre seguir o coração ou respeitar os limites que a realidade impunha parecia sufocante. E, ao olhar para Taehyung, ela viu o mesmo desespero espelhado em seus olhos.

— Eu não sei o que fazer — ela confessou, sua voz falhando. — Eu quero você, Taehyung, mas... não sei se posso lidar com tudo isso.

Ele estendeu a mão, tocando o rosto dela gentilmente, como se tentasse memorizar cada traço. O gesto era cheio de ternura, mas também de despedida.

— Eu também não sei — ele disse suavemente. — Mas preciso que você entenda... eu estou preso. Entre o homem que sou e o homem que deveria ser.

Clara fechou os olhos, sentindo o toque dele pela última vez antes que ele afastasse a mão. Sabia que aquele era o início de um conflito que não terminaria facilmente, uma batalha entre seus corações e as escolhas que a vida impunha. E, ao mesmo tempo, compreendeu que, mesmo naquele momento de incerteza, algo entre eles havia mudado para sempre.

O vento soprou levemente, carregando as palavras não ditas, e, pela primeira vez, Clara se perguntou se algum deles sairia inteiro daquela tempestade.

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