#PRATODOSVEREM: imagem na cor laranja com laranjas (frutas) nas extremidades e ao centro o titulo do conto "O jaguar entre laranjeiras", escito por L. Vitória.
Otoni Baraúna
São três horas da tarde quando temos acabado de almoçar. Os ponteiros do relógio acima da porta que dá vista à rua sussurra a mudança dos minutos de maneira lânguida. Já quanto às horas, estas não passam junto do vento, lépido, a correr pela rua. Ao menos sente-se a brisa que bafora consigo.
Minha irmã acaba de levantar da cadeira de entalhe, mesmo nessa em que ela estava sentada há pouco, lendo um de meus livros favoritos, o qual deixei-lhe pegar emprestado, embora o conservasse em um enorme baú com um ávido apego. Ouço-a suspirar. A canseira estampa as pálpebras, de modo a querer fechá-las, os olhos vivos e claros mórbidos do sono.
— Lendo depois do almoço, mana? Coragem a sua. De mais cedo a essa hora, dana-se a comida e dá-me uma canseira até boa. — Grunho, derreando-me sobre a estopa de outra cadeira igual à sua. Mastigando algo imaginário entre os dentes, viro para o lado oposto, onde está a mesa telefônica e, ao lado, a aparadeira. Fecho os olhos, decidido a deixar que o descanso curve-se detrás de mim e também me embale, sereno.
— Hm... — Espreguiça-se, desinteressada. Ela está indo finalmente guardá-lo. Ouço e conto os passos. São cinco para ir à estante da sala, mais uma ponta de pés para e soltá-lo entre os adornos dos recortes bem seguros de madeira de ipê. Não estou a fim de encolerizar-me. É um bom fim de tarde e estou quase ressonando.
— Qual de meus livros pegaste, Liliana? — Balbuciei, cacofônico da fala, um dos lados de meu rosto sendo pressionado pela fofura das costas do assento. Todavia não movi-me nada para verificar do furto.
— Ah! — Ela suspirou. Por breve momento, percebi que um risinho de escárnio chegou a cirandar em seus lábios mesmo sem ter me virado para olhar seu rosto, porém não deixou ser ouvido. — Lucíola. — A resposta terminou arrastada, exausta, quase sem força alguma.
Resolvi ficar descansado. Não era mais caso de motins desnecessários entre nós dois. Afinal, posso dizer precisamente que costumo ter apego a ele e a todos os meus outros poucos de literatura nacional. Também dizer de mim mesmo que sou um atraído voraz pelos livros de gente conterrânea. Sob um silencioso descontrole de nervos, rosto em vergões vermelhos subindo das bochechas às rebarbas quase nuas do cavanhaque, evito repetir à minha irmã que é melhor deixá-lo onde estava, que o livro estando ali, terá, pausadamente, as fragrantes páginas devoradas pelas traças odientas, criará depois camada grossa de poeira... Enfim, eu mesmo sou um inútil sem eles.
— Ora, Otoni. Que mal há? — Seus olhos, ávidos por uma resposta ferina, recaem sobre mim, num combate renhido contra o sono, agora furtivos e interesseiros em meu olhar azulado, faiscado de ceticismo.
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Contos para se conscientizar: porque o respeito está nos detalhes
Short StoryO respeito é essencial e ele mora nos detalhes, mas para que atinja a todos é preciso haver conscientização, em especial, sobre inclusão PCD e valorização da saúde mental. Por isso o Projeto Flor de Lótus reúne neste livro contos variados de divers...