Eu costumava frequentar um restaurante no meu bairro, que mais me parecia como um porto seguro.
Era um lugar onde o tempo se dobrava em sutilezas. O garçom, com um enorme sorriso no olhar, me recebia como se conhecesse meus caminhos antes de eu sequer atravessar a porta. Os pratos chegavam até a mesa numa dança suave, que me envolviam num discreto abraço. Todas as manhãs eu pedia o mesmo suco de goiaba, não por amar, mas porque ali ele tinha um sabor de poesia e conversa na calçada de casa, leve e reconfortante, como memórias nós nem vivemos. Por fim, ele sempre trazia balas de caramelo, como se adivinhasse ser a minha favorita.
Com o passar dos meses, aquele encanto começou a se desmanchar lentamente, como uma névoa que se dissolve no calor da manhã. O garçom, antes um reflexo solar, agora parecia como neblina. Seus passos, antes no ritmo da nossa música, agora eram arrastados, e o brilho caramelizado dos seus olhos estava opaco. Era como se a essência do lugar tivesse se esvaído junto com o seu frescor. O cuidado virou desatenção, os pratos já não chegavam mais com aquelas chamas de paixão a flor da pele, mas sim jogados como folhas secas ao vento. O suco de goiaba, outrora doce e sincero, sumiu do cardápio como se jamais tivesse existido, e, as balas de caramelo, que antes eram por tua conta, desapareceram juntamente com o amor que antes habitava em nós dois.
O restaurante, que um dia fora meu lar, agora era um navio à deriva. Não havia mais calor ali, e você que antes aquecia o meu corpo e a minha alma, virou só mais um grão de areia no deserto. Assim, precisei me afastar, forçada a buscar em mim o que aquele lugar já não podia mais oferecer. Mas, com isso pude descobrir que as minhas mãos também poderiam temperar e que as minhas chamas também produziam ardores capazes de criar a minha própria paixão de entardece. Cozinhar para mim mesma, aos poucos, transformou-se em uma dança de redescoberta, como um rio que flui levemente e leva consigo tudo que passou, sem deixar de caminhar.