Ella sabia que levaria uma bronca de Malvina assim que ela a encontrasse. Entrou sorrateiramente dentro da casa, depois de deixar Veloz no estábulo, sua sapatilha a impedia de fazer qualquer barulho, e ela agradecia mentalmente por isso.
— Ella!
Seu corpo gelou ao ouvir o grito de Malvina, ela estava sentada na sala de estar, com uma xícara de chá em mãos, a encarando como se fosse matá-la a qualquer instante.
— Sim, madrasta?
— Me pergunto se as obrigações que você tem não são suficientes. Onde você estava?
— Eu... sai para cavalgar um pouco.
Não adiantaria mentir, seu castigo seria pior se o fizesse. Malvina se levantou deixando a xícara na mesinha redonda ao lado da poltrona, o vestido preto assim como os olhos frios e verdes da mulher a assustavam fielmente.
— Oh! Vejo bem. Está imunda!
Ella abaixou a cabeça tentando controlar os olhos que ardiam, as lágrimas queriam teimar em cair, mas ela não permitiria. Não na frente de Malvina.
— Limpe o chão de toda a casa, e as escadas também.
— Sim, madrasta.
— As meninas e eu, iremos as compras. Quando eu voltar, quero esta casa brilhando, ouviu bem, Cinderela? — apertou o rosto bronzeado de Ella, a forçando a olhar em seus olhos.
— Sim...
— Ótimo. Lilian! Anastácia! Vamos logo a modista. — Gritou, logo vendo as duas filhas descerem as escadas implicando uma com a outra.
E sem nenhuma outra palavra, as três saíram da casa e entraram na carruagem.
Ella suspirou, a casa não era pequena, levaria o dia inteiro para limpá-la.
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Seus joelhos doíam de tanto ficar ajoelhada no chão, suas mãos estavam enrugadas pelo excesso de contato com a água. Limpou o suor do rosto com o antebraço, e antes que pudesse voltar a esfregar o chão, ouviu batidas em sua porta, não costumavam receber visitas.
Levantou-se ainda dolorida, limpou seu rosto como pode e secou as mãos no avental branco e surrado. Abrindo a porta se deparou com um senhor de idade, os cabelos pretos, ainda que alguns fios estivessem esbranquiçados, estavam arrepiados para cima, o bigode longo e grosso contrastava com o rosto fino e longo, as roupas de alto porte só fizeram Ella se questionar, quem era aquele homem que a encarava com tanto afinco?
— Boa tarde! Posso ajudá-lo?
— Oh, sim, sim! Que indelicadeza. Sou o mensageiro do rei, trago um convite em nome de vossa majestade — as mãos cobertas por luvas brancas estenderam uma carta em direção a Ella — , todas as jovens descompromissadas do reino foram convidadas para o baile real, onde o príncipe escolherá uma das donzelas para ser sua noiva.
Ella olhou a carta em suas mãos, um baile real.
— Ora, mas isso é fabuloso! — a voz de Malvina foi ouvida do lado de fora da porta.
A mulher havia acabado de descer da carruagem com suas filhas, o sorriso de Malvina chegava a ser medonho de tão largo.
— Milady. — o senhor se curvou, antes de montar seu cavalo e ir embora.
Malvina entrou na casa e arrancou o convite real das mãos de Ella, observando como a cera vermelha foi carimbada com o selo real, seus olhos brilhavam com a possibilidade de uma de suas filhas ser a futura rainha de Veridia.
— O baile será em dois dias. Que bom que fomos a modista, vocês precisam estar perfeitas para serem futuras rainhas.
— Aposto que o príncipe deve ser lindo — comentou Anastácia.
— Claro que ele é! E vai ser meu marido — Lilian se gabou, acariciando os cabelos negros.
— Não, vai ser meu!
— Meu!
— Meu! Sua invejosa.
— Meninas, chega, por favor! Isso não são modos de uma dama.
Com uma sensação boa em seu peito e uma esperança, Ella perguntou:
— Eu posso ir ao baile, madrasta?
Malvina a encarou de baixo para cima, antes de um sorriso convencido aparecer em seus lábios vermelhos.
— É claro que não! — Lilian respondeu.
— Claro!
A resposta de Malvina deixou todas surpresas.
— Como assim, mamãe? A Cinderela é apenas uma empregada maltrapilha.
— O baile é para todas as jovens descompromissadas do reino. Seria injusto se a Ella não fosse.
Lilian e Anastácia se encaravam sem entender o que estava acontecendo.
— Mas você tem muitas obrigações a cumprir nessa casa, Ella. Se conseguir terminar de limpar e encerar a casa, tirar as teias de aranha, limpar a lareira, arrumar os quartos, lavar as roupas, alimentar os animais, preparar as refeições e arranjar um vestido, poderá ir conosco.
O sorriso das duas irmãs postiças logo surgiram nos rostos brancos pelo pó de arroz. Ella suspirou, não perderia as esperanças, teria dois dias para terminar todas as suas obrigações
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Maryenne andava pelos vastos corredores do castelo, uma sensação de calor adornava seu peito, como se algo bom estivesse prestes a acontecer, talvez esse baile real realmente fosse uma boa ideia. Ela nunca havia sido uma princesa de usar vestidos glamusoros, e graças a sua posição como general, não precisava utilizar um vestido durante o baile, agradecia internamente por isso.
Passos rápidos foram ouvidos e logo Philip passou correndo por si.
— Onde vai com tanta pressa?
— Maryenne, bom dia! — sorriu o príncipe. — Irei cavalgar próximo a floresta.
— Com essa animação? — um sorriso de lado surgiu nos lábios róseos da princesa — Vai se encontrar com alguém?
O rosto de Philip ganhou um tom rosado, havia sido pego em flagrante.
— Bem, eu gostaria muito que pudesse encontrar alguém nesse passeio.
— Por isso o baile será para todas as jovens do reino? A pessoa que você está interessado é uma camponesa? — Se divertia com aquela situação. Philip estava vermelho e envergonhado, significava um claro interesse em quem quer que seja a moça misteriosa.
— Sim... ela é uma pessoa incrível, e me entende.
— Então temos outro espírito aventureiro.
— Espero que sim — riu — , se me der licença.
Maryenne sorriu, vendo o irmão mais novo sair correndo. Talvez o sentimento bom que ela estava sentindo fosse isso, seu irmão havia encontrado uma dama em potencial.
— Que ela seja uma pessoa boa para você, Philip.
Desejou. Os olhos azuis parando no quadro de sua mãe, a rainha era uma pessoa excepcional, a pessoa mais gentil e engraçada que Maryenne havia conhecido, desejava encontrar alguém como a mãe, tanto para si, quanto para Philip. Pondo a mão delicadamente na pintura, sorriu de forma nostálgica.
— Interceda por nós mãe, para termos um bom futuro.
E então foi para o vasto campo de treinamento, prepararia os novos soldados do castelo.
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E se for ela?
RomanceEsse livro é uma releitura de "Cinderela". Ella é uma jovem garota com um coração puro e uma admirável determinação, mesmo com sua madrasta e irmãs postiças cruéis, ela ainda consegue ser uma pessoa gentil e bondosa. Um desejo misturado com uma pita...