Capítulo 8 - O casamento

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Malvina espumava de raiva, uma veia em seu pescoço branco estava saltada, sua mandíbula estava travada, e suas unhas faziam pequenos cortes nas palmas de suas mãos.

— O que faremos agora? — Anastácia sussurrou. Quem cuidaria da casa se Ella partisse para o palácio e se casasse com o príncipe?

— Vossa alteza, não pode levar a Ella de casa.

Maryenne arqueou uma de suas sobrancelhas, a sombra de um sorriso irônico se fez presente em seus lábios, esperando que Malvina lhe desse uma justificativa para aquele comportamento tolo da mulher.

— Veja bem, majestade. Ella não passa de uma empregada, uma garota sem classe alguma e certamente não serve para ser rainha — o riso desdenhoso pode ser ouvido em bom tom —, o sapatinho se encaixou por acidente.

— Isso não me parece ser um acidente, lady Drakov — a voz da princesa soou tão fria quanto a lâmina de sua espada.

— Um engano, é claro! Ella não tem etiqueta, não sabe nem se portar como gente. Com certeza vossa alteza vai querer evitar o constrangimento que será leva-la a corte.

— Constrangimento? — A cada palavra que saia da boca de Malvina, Maryenne parecia se controlar cada vez mais para não arrancar a língua da mulher.

— Imagine, uma simples plebeia, sem nenhum modo, sendo rainha, a corte jamais aceitaria algo tão absurdo quanto isso. Pense bem majestade.

— A senhora se esquece de que a palavra real vale mais do que a dos membros da corte? — Malvina engoliu em seco, dando um passo para trás. — Se esquece que foram as ordens do rei que me trouxeram aqui? Se a senhora se atrever a abrir a boca novamente para insultar, ou dizer que a Ella não serve para o posto de rainha, terei que leva-la presa por desacato a ordem real. Por um acaso, é isso que a senhora almeja?

A mulher apenas ficou em silêncio. Já era muita desgraça ter aquela criatura irritante como futura rainha, não seria presa por causa dela. Já Ella, sentia seu peito se aquecer com aquela defesa de Maryenne, ninguém havia feito aquilo por ela antes.

— Ella, arrume suas coisas, partiremos em breve.

— Minhas coisas?

— Sim! Você não voltará mais para esta casa, Ella.

— Eu... não tenho muitas coisas, alteza.

A princesa olhou firmemente para os olhos castanhos de Ella, eram tão intensos que poderia facilmente se perder neles. Como fizera na noite do baile real.

— Então vai ser rápido, não se preocupe com isso. Apenas se apresse.

Assentindo, Ella correu para seu quarto. Observando uma foto gasta de seus pais, sorriu para eles, sua vida mudaria a partir daquele dia. Arrumou as poucas roupas que tinha em uma pequena bolsa de pano, o colar que sua mãe a havia dado e por fim, saiu de lá sem ao menos olhar para trás.

A descer novamente para a sala, Malvina segurou em seu braço, a mantendo parada perto dela.

— Ella, querida... você não vê? Assim que eles verem que você é uma simples criada, vão mandá-la embora como um cão sarnento. Você não pertence a este mundo!

As palavras de Malvina foram como facas cravando seu coração sem nenhuma piedade. As dúvidas surgiam em meio a tantos pensamentos. Olhando para Malvina e suas filhas, se lembrou de quão sua vida havia sido cruel morando com elas, os anos de servidão, sem nem mesmo um obrigado como acalento. Seus olhos se encontraram com os da princesa e todas as dúvidas pareciam sumir, como um passe de mágica. Maryenne lhe estendeu a mão, e sem mais nenhuma palavra, a segurou.

Cruzaram a porta de entrada juntas, e pela primeira vez em anos, Ella sentiu que a vida lhe sorria. O sol a gracejava com calorosos raios, o dia parecia por fim, mais belo. Mas antes que entrasse na carruagem se lembrou de Veloz, não poderia deixa-lo para trás.

— Algum problema, Ella?

— Meu cavalo! Não posso deixa-lo aqui, Malvina o venderia.

— Entendo — com um simples sinal, um dos cocheiros foi até o estabulo para pegar o único animal presente.

— Obrigada por me encontrar.

— Não poderia ser diferente. Eu sempre te encontraria, em qualquer lugar, em qualquer vida. Meu coração saberia me guiar para o caminho certo.

Ella sentiu seu coração disparar em seu peito, seu rosto ganhou um tom rosado, antes de por fim, entrar na carruagem.

────⊱◈◈◈⊰────

O caminho para o castelo foi silencioso, Ella apenas admirava a paisagem do lado de fora. Maryenne seguia do lado de fora, montada em seu cavalo tão negro quanto a noite, sua mente vagava em o que faria se Philip se casasse com a garota? Seu coração suportaria vê-la todos os dias e não poder dizer que ela a atormentava em seus sonhos? Que era ela, e apenas ela, a quem seu coração pertencia? Ansiava para que o castelo nunca chegasse, e pudesse passar a eternidade ao lado de Ella.

Mas suas preces não foram ouvidas, e lá estavam os portões do castelo.

Philip parecia saber que a irmã voltaria vitoriosa para casa, estava a espera nas pequenas escadarias que levavam ao palácio em fim, com uma roupa azul completamente bem alinhada, os olhos azuis brilhando em expectativa. Maryenne desceu de seu cavalo, abrindo a porta da carruagem para Ella, e antes mesmo que pudesse estender a mão para a jovem, Philip já estava lá. Em um galante cumprimento.

— Bela dama. É um prazer finalmente vê-la novamente.

— Vossa majestade!

— Por favor, me chame apenas de Philip.

— Philip...

O jovem príncipe sorriu, a ajudando a descer da carruagem, finalmente olhou para a irmã.

— O rei deseja vê-la, irmã.

Maryenne nada disse, apenas se curvou levemente antes de sair.

────⊱◈◈◈⊰────

— Vejo que conseguiu achar a jovem.

— Sim, meu pai.

— Bem, nunca duvidei de sua capacidade Maryenne. Não seria capitã se não fosse boa o suficiente. — Se gabou, orgulhoso.

— Philip disse que o senhor desejava me ver. Posso saber o que aconteceu?

— Seu irmão vai se casar...

— Imagino que sim.

— Mas não com a jovem do sapato de cristal!

O coração de Maryenne errou uma batida, como Ella não seria a noiva de seu irmão?

— Como? Mas o que aconteceu? Agora a pouco... — O rei ergueu sua mão em uma forma de pedir silêncio.

— Ele não vai se casar com a garota... Você vai!

— Como? — Sua surpresa era tamanha, mal conseguia acreditar naquilo, estava sonhando enquanto dormia em seu cavalo? Não, aquilo era impossível. Não era?

E se for ela?Onde histórias criam vida. Descubra agora