Aguenta, Kelvin, aguenta.
Era o que Kelvin repetia para si mesmo enquanto aguentava no agachamento em isometria e ainda usava uma faixa elástica para provocar resistência.
Olhou para Bruno à sua frente, que cronometrava o tempo e pensou se aquele gay não estava roubando.
E mesmo que estivesse sentindo o ardor insuportável, se recusava a desistir. Não poderia ser igual ao seu pai que também desistira.
Rangeu os dentes e apertou mais uma mão contra a outra, sentindo o corpo inteiro começar a tremer.
Estava a um passo de cair no chão quando Bruno estalou os dedos.
— Foi!
Kelvin se jogou ao chão, deitando enquanto esticava as pernas e cobria o rosto com as mãos.
— Porra, esse foi o minuto mais demorado da minha vida.
Bruno estendeu a mão, ajudando-o a se levantar.
— Sempre são.
Kelvin bebeu um longo gole de água e enxugou o rosto com sua toalha, agradecendo aos céus que aquele era seu último exercício do dia.
Detestava treinar inferiores, mas adorava o resultado que eram pernas torneadas e uma bunda linda.
Caminhou com o primo entre os aparelhos da academia de bairro que pertencia à sua tia e onde Bruno trabalhava como personal.
— Meninas, que tal vocês diminuírem essa carga, hum? — Bruno se aproximou de uma dupla de jovens e enquanto o primo ajudava uma, a outra encarou Kelvin dos pés à cabeça.
Kelvin reparou e deu uma piscadinha para ela. Absolutamente não gostava da fruta — e olha que já havia experimentado — mas sabia jogar charme como ninguém e sabia disso, então aproveitava seu super poder em qualquer oportunidade.
Bruno o cutucou para continuarem andando e deu risada ao reparar que o ruivo flertava com uma das garotas.
— Toma jeito, você é gay.
— Flerte esportivo, sou praticante.
— Você sabe que essas meninas só treinam nesse horário porque é o seu horário de treino, né?
— É pra eu me sentir lisonjeado?
Os dois chegam ao vestiário masculino e Kelvin começa a tirar a roupa de treino, ficando apenas de cueca, enquanto Bruno rabisca algo na prancheta em sua mão.
— Acho que você devia virar personal e trabalhar aqui na academia, ia chover de menininhas adolescentes querendo treinar com o personal gatinho.
Kelvin deu uma risada nasalada.
Se pensasse bem, Bruno tinha razão, poderia fazer uma boa grana trabalhando aqui, mas não tinha a menor vontade de estudar sobre aquilo que costumava fazer para esquecer os problemas.
Problema que aliás já começavam a voltar a cair sobre si e lhe pesar as costas novamente. As contas, sua família, seu emprego, Ramiro…
— Eu posso ajudar quem estiver precisando de ajuda, não ligo de fazer isso. — Caio, irmão de Bruno, entrou no vestiário, já abrindo seu armário para guardar suas coisas.
— Ele realmente não liga, mesmo que as meninas fiquem claramente dando em cima dele — Bruno apontou para o irmão — Da última vez, a menina perguntou se ele não queria sair com ela e ele disse “acabei de chegar aqui, porque sairia agora?”, ela tentou chamar ele pra comer e ele só disse “já comi, obrigado” e foi embora.
Kelvin deu uma risadinha.
Caio era bem parecido com Bruno. Ambos tinham os mesmos olhos verdes, quase azuis, o cabelo em um castanho claro e um rostinho de príncipe. Bem o tipo que as meninas da idade dele gostariam de namorar, mas Caio não parecia muito interessado.
Seu jeito lembrava bastante o jeito de Ramiro, aliás.
— E como tá a titia? — Bruno indagou se referindo à mãe de Kelvin.
— Tá bem, falei com ela hoje cedo e disse que estava se adaptando aos novos remédios.
Remédios esses que lhe custaram o valor de um encontro de noite inteira.
— Que bom, você parece preocupado.
— Bom, é… não tem como não se preocupar, né?
— Que tal sair um pouco para se distrair? Soube que abriu uma boate nova chamada 212 Fahrenheit.
— Seria uma boa. Quando?
— Vamos na sexta.
— Hum, sexta não vai dar… — Kelvin negou com a cabeça, lamentando.
— O que você faz nas sextas? Nunca está disponível. — o corpo de Kelvin tencionou — É algum namorado secreto que você não quer me contar?
— Não… — Kelvin terminou de se vestir, pegou sua mochila, acenou para Caio e foi acompanhado de Bruno até a saída da academia — É que eu saio com bastante gente, ninguém especial, só isso.
— Bem, se mudar de ideia, só mandar mensagem. Eu também tô saindo com umas pessoas e o seu “ninguém especial” pode fazer companhia ao meu “ninguém especial”.
Honestamente, queria mesmo sair com Bruno. Haviam crescido juntos, tinham poucos meses de diferença e foram criados como irmãos. E sentia muita falta de seu primo.
Mas não conseguiria sair com Bruno quando havia um lado de sua vida trancado a sete chaves, teria vontade de desabafar sobre a vida de merda que vinha levando como acompanhante e temia sua reação.
Se bem que estava um pouco mais “livre” dessa responsabilidade por três sextas-feiras, quando daria as aulas para Ramiro.
De certa forma, aquilo lhe trazia um certo alívio, sem surpresas, sem ter que começar do início com um cliente novo.
Isso lhe confortava e o deixava até mesmo ansioso para que chegasse logo, mas era uma zona bem perigosa para um acompanhante.
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Os Números do Amor
RomanceRamiro Neves está feliz com o seu trabalho e sua rotina, mas sua família não. A pressão em cima do homem para que forme uma família está tirando sua paz. Até porque, para pessoas como ele, que estão dentro do espectro autista, se relacionar minimame...