Capítulo 3

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Estava caminhando em um jardim com flores, olhei para trás e vi uma sombra atrás de mim, apertei os olhos e um rosto apareceu, revelando olhos azuis tão claros que pareciam ser brancos como os meus. Acordei. Olhei em volta e a luz do dia passava pela fresta da porta do banheiro, me afastei DELE e levantei do chão. Aquele sonho tinha sido diferente, nunca sonhará assim. Será que foi uma lembrança? Ou imaginação da minha cabeça? Olhei para o espelho e por um segundo pensei que meus olhos estivessem azuis. Pisquei rápido e voltei a enxergar eles brancos como sempre foram. Olhei para baixo e ELE estava acordando.

- Branca?

Abaixei perto DELE e coloquei a mão em seu ombro, ELE estava agitado e perdido.

- Estou aqui.

ELE abriu os olhos e segurou minha mão.

- Temos que sair daqui, preciso ver minha família.

Concordei com a cabeça e dei espaço para ELE levantar do chão e abrir a porta do banheiro. ELE olhou pela janela do quarto e rapidamente tirou a cama da passagem da porta. ELE estava agitado e temia o que ia encontrar do outro lado.

- Branca, você fica aqui. Vou ver o que aconteceu, volto logo.

ELE estava ansioso e preocupado. Fiquei parada vendo ELE correr pelo corredor. Fechei a porta do quarto, tampei a janela com a cortina e coloquei meu moletom. O sol da manhã era muito forte, precisava me proteger. Sentei na cama e esperei ELE voltar. Ouvia o relógio da cozinha dar voltas, as horas estavam passando e ELE ainda não havia voltado. Decidi que ia procura-lo, mesmo não gostando de me expor ao sol. Abri a porta do quarto e andei pelo corredor. Cheguei no refeitório e algumas senhoras limpavam a bagunça que ELES deixaram a noite passada. ELAS me olharam, mas não me pronunciaram nenhuma palavra. Continuei andando e sai do refeitório, o sol estava forte, mal conseguia abrir os olhos. Andei alguns metros de onde estava e avistei a casa que ELE morava com seus pais. Me aproximei e vi de longe que a porta estava aberta, havia alguns DELES conversando dentro da casa, podia ouvir as vozes. Subi os degraus da varanda e vi ELE sentado no sofá, com as mãos no rosto. Conseguia ouvir ELE gemendo, sua dor gritava em seu peito. ELE estava chorando.

- O que você veio fazer aqui?

Olhei para o irmão mais velho DELE que estava do meu lado me apontando seu dedo grosso e gordo, como se eu fosse uma estranha.

- Vim ver o que está acontecendo.

Olhei em volta procurando respostas, mas todos que estavam na casa me olhavam como se eu fosse o inimigo. Procurei seus olhos, meu refúgio, e finalmente ELE estava olhando para mim. Senti aliviada por ver que ELE ainda estava ali.

- Cristian, deixe Branca participar da reunião, por favor.

Olhei para ELE e pela primeira vez consegui guardar seu nome, CRISTIAN. Um nome muito bonito para um cara grande, gordo, e mal-educado como ELE era.

- Se você já considera ELA como parte da família.

Senti o ar de deboche em cada palavra que saiu de sua boca.

- Branca, sente-se aqui do meu lado. Vou te contar o que está acontecendo.

Olhei para ELE e fui em sua direção. Senti todos ELES me acompanharem com os olhos a cada passo que eu dava. Sentei no sofá duro e sujo que ELE estava. Segurei sua mão e fiquei pronta para ouvir o que ELES tinham para me dizer.

- Branca, você lembra de quando falamos sobre o que tem do outro lado do lago?

Parei para buscar informações no meu subconsciente. Lembrava que era proibido atravessar as árvores do outro lado do lago, mas não sabia o que tinha lá.

- Não, só sei que é proibido atravessar.

ELE apertou minha mão e abaixou a cabeça. Senti que ia voltar a chorar.

- A morte está do outro lado do lago. Há muitos anos somos roubados, pessoas são sequestradas e mortas. Depois que construímos nossa barreira e nos escondemos aqui do outro lado do lago, nunca mais fomos atacados.

Não sabia o que pensar, ou como reagir. Me ensinaram que a MORTE era um ciclo da vida. Você nasce, cresce, casa, tem filhos, netos e depois você morre. Estive presente em alguns enterros desde que cheguei na Vila.

- Por que você se refere a morte como um animal ou coisa, ela não seria um ciclo da vida? Todos vamos morrer um dia. Não?

Escutei risadas de todos ELES que estavam na sala. Senti ELE apertar minha mão, agora olhava em meus olhos. Senti sua dor.

- Branca, você pode considerar a morte como uma criatura sombria que mata para sobreviver. Nosso sangue é seu alimento. A criatura anda a noite e por algum motivo que ainda não descobrimos, conseguiu passar por nossos portões e levou muitos de nós. Minha mãe, minha irmã, meus sobrinhos, muitas famílias foram despedaçadas.

Fiquei em choque, não conseguia entender e assimilar as palavras que ELE usou para diferenciar uma morte que eu não conhecia.

- Temos que começar a arrumar nossas coisas, vamos subir o lago, o Sr. Halls está nos esperando. As crianças e mulheres ficam com ele e nós vamos caçar esses animais. Chega de fugir.

Cristian tinha os olhos sedento por vingança, não chorara ou se abalara como seu irmão. Olhei para ELE e limpei suas lagrimas que desciam em seu rosto.

- Vai ficar tudo bem.

ELE sorriu e me fez me sentir protegida. ELE pegou minha mão e a beijou. Sorri de volta para ELE. Olhei em volta e ELES tinham saído da casa. Estávamos sozinhos.

- Branca, quero que volte pro seu quarto e arrume suas coisas, vamos partir daqui 1h. Você vai comigo.

Olhei em seus olhos e pela primeira vez tive vontade de beija-lo. ELE estava fraco, não de corpo e sim de alma. Coloquei minha mão em seu pescoço e me aproximei. ELE entendeu o que eu queria fazer e rapidamente me envolveu com seus braços fortes. Toquei meu nariz no seu e beijei seu lábio que estava gelado. Senti sua pele molhada pelas suas lagrimas. ELE estava mais calmo, sentia seu coração pulsar devagar, seu beijo foi doce e delicado. Acho que pela primeira vez comecei a sentir a palavra AMOR. Uma palavra que agora estava virando sentimento.

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