Capítulo 2

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Estava sozinha no meu quarto, olhando para o espelho do banheiro e tentando lembrar do meu passado. Todos os dias eu me encarava no espelho e tentava lembrar de algo. Tentava buscar em meus olhos brancos uma referência, qualquer coisa seria suficiente para decifrar de onde eu vim. Não existia outra Vila por perto, ELES achavam que eu vim do outro lado do lago, vim arrastada pela força das águas e cheguei aqui. ELES nunca mencionam o que tem do outro lado, só dizem que temos que ficar longe, que o perigo nos cerca depois das grandes árvores que cercam o lago.

- Branca?

Escutei ELE bater na porta. Estava na hora do jantar. ELE iria anunciar para ELES que estamos juntos. Estava nervosa, não queria ser exposta assim. Respirei fundo arrumei o colar no meu peito e apaguei a vela que clareava o banheiro. Abri a porta e ELE estava sorrindo, vestia uma camisa que um dia já fora branca e uma calça jeans escura e uma bota surrada. Seus cabelos estavam molhados e jogados para trás. Abaixei a cabeça para que ELE não me beijasse. ELE estendeu a mão para mim e eu segurei sua mão áspera.

- Vamos?

Sorri para ELE e fomos até a mesa onde estava sua família. Apertei sua mão, estava nervosa, conversei poucas vezes com seus pais e irmãos. Sua família era grande, ELE tinha cinco irmãos e uma irmã. Todos já estavam casados e tinham filhos. ELE era o mais novo e o único que estava solteiro. ELE morava com os pais e todos os seus irmãos tinham suas casas e viviam sua vida com suas famílias. Nos aproximamos e ELE chamou atenção DELES.

- Pessoal, quero apresentar minha namorada.

ELES ficaram sem reação. Um de seus irmãos que aparentava ser o mais velho foi o primeiro a falar na mesa.

- O que? Tantas garotas pra você escolher e você foi escolher justo ELA?

Aquelas palavras não me machucaram, eu sabia que ELES não iriam me aceitar. Mas para ELE foi como se estivessem cutucando uma ferida em aberto. Senti sua mão ficar quente. A mulher mais velha da mesa que era sua mãe, levantou e tomou a palavra antes que ELE dissesse algo.

- Não quero brigas nessa família. Se o irmão de vocês escolheu ELA para namorar, vamos apoiar. Eu e seu pai estamos felizes por vocês, agora sentem-se e vamos jantar em paz.

Ela era uma mulher sábia, mas seu olhar não mentia, ELA não me aceitava, nenhum DELES queria que eu entrasse para a família DELES. Sentamos na mesa e nos servimos da comida que estava no centro da mesa. Todos ficaram em silêncio. Aquela comida era pesada e gordurenta, ELES enchiam o prato e se saboreavam e lambiam os dedos. Eu sentia nojo de ter que comer aquilo, mas tinha que comer para sobreviver.

- Você só come isso, querida?

Olhei para a mãe DELE e ELA me olhava com desprezo.

- Eu não como muito.

- Não precisa manter o peso, você já é tão magra.

Olhei para o lado e sua irmã debochava e me media. Fiquei sem saber o que dizer e abaixei a cabeça e olhei para meu prato. Escutei ELES cochichando sobre mim, ouvi ELES falando algo como "ELA não toma sol?" "Como ELA é branca!" "E os olhos DELA? Dá medo de ficar olhando". Estava incomodada de ficar sentada ali com ELES, normalmente quando faço minhas refeições eu espero todos terminarem e depois venho me servir. Não gostava de sentar com ninguém e não suportava que ficassem me observando. Terminei de comer o pouco de comida que coloquei no prato e levantei.

- Boa noite.

Agradeci pela hospitalidade de me acomodarem em sua mesa e sai em direção a cozinha. Coloquei o prato no lavatório e rapidamente lavei e sequei meu prato. Sabia que ELE viria atrás de mim. Sai pela porta da cozinha e fui caminhar sobre o luar. Adorava a noite, se ELES permitissem eu ficava a noite inteira caminhando sobre a escuridão do luar. Mas ELES tinham suas regras. Não podíamos ficar depois das 20h lá fora. Tínhamos que nos recolher e ir dormir. Comecei a caminhar perto das árvores e senti o vento bater no meu rosto. Me sentia tão livre que se pudesse correria sem destino até meu corpo cansar. Senti sua presença atrás de mim. Me virei e ELE estava me observando.

- Me desculpa, minha família é assim mesmo, falam sem pensar.

Olhei em seus olhos e senti que estava triste.

- Tudo bem. Já imaginava que ELES reagissem assim.

Abaixei a cabeça e deixei que ELE me tocasse.

- Eu conversei com ELES depois que você saiu, ELES não vão mais nos incomodar.

Fechei os olhos e senti seu toque em meu rosto. Balancei a cabeça concordando.

- Você fica tão linda a noite. Não se esconde de baixo daquele moletom. Sua pele fica iluminada com a luz da noite. Como você é linda Branca.

Senti seus lábios encostando nos meus. ELE segurou minha cintura com uma das mãos me levando para perto DELE e com a outra mão segurou minha nuca para ter o controle do meu corpo. Estava atada a ELE, não conseguiria me soltar se eu quisesse. Por um momento pensei em sair correndo e pedir para ELE parar de me beijar, mas isso passou no momento em que ELE passou a beijar meu pescoço e minha orelha. Senti o pulsar do seu pescoço, por extinto beijei sua nuca e senti seu cheiro tomar conta da minha cabeça, fiquei em êxtase, minha respiração ficou ofegante, fechei os olhos e minha pernas começaram a tremer. ELE me segurou com força e voltou a me beijar. Estava sem ar, alucinada, exaltada, fora de mim. Queria avançar nele de uma forma agressiva, nunca senti isso, não sabia como lidar com esse sentimento, esse desejo. Um grito alto e estridente me tirou do meu momento de êxtase e alucinação. ELE segurou meus braços que estavam agarrados ao seu pescoço e me afastou de sua boca. Respirei fundo e ofegante e por um segundo pensei que não ia conseguir voltar ao normal.

- Branca, ouviu isso?

Firmei minhas pernas que estavam tremendo e abri os olhos, olhei em volta e tentei ouvir alguma coisa.

- CORRAM! ESTÃO AQUI! NOS ENCONTRARAM!

Um senhor corria em nossa direção e entrou correndo no refeitório gritando para nos esconder. Do que ELE estava fugindo? Quem estava na Vila? Antes de falar alguma coisa senti ELE me puxar pelo braço e corremos para dentro do refeitório. Não tinha mais ninguém ali, corremos em direção ao corredor, entramos no meu quarto e ELE fechou a porta e colocou a cama para bloquear a passagem. Me empurrou para dentro do banheiro e trancou a porta. O banheiro estava escuro, a vela estava apagada. Sentia ELE segurar meu braço.

- Do que estamos fugindo?

- Sih! Temos que ficar em silêncio.

ELE segurou minha mão e me fez sentar no chão, encostamos na porta do banheiro e ficamos no escuro, em silêncio. Senti os pelos de seu braço ficarem arrepiados, senti seu medo mesmo não conseguindo enxergar seus olhos. Ouvimos gritos, vidros se quebrando, carros sendo ligados, ELES estavam tentando fugir. O que estava acontecendo? Do que estávamos nos escondendo? Deitamos no chão e ELE me abraçou forte. Senti água molhar o meu rosto, percebi que ELE estava chorando. Não sabia o que fazer, então abracei ELE e encostei minha cabeça em seu peito. Dormimos ali, no escuro, no chão do banheiro, ouvindo gritos assustadores que faziam ELE tremer.

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