Capítulo 5

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Meu uniforme é logo retirado de mim, meu material é largado na cama por conta do meu artefato, caso contrário, estaria fazendo companhia a qualquer rodapé da casa, e parto para o chuveiro antes de qualquer coisa que meu cérebro pudesse pedir, que não fosse um refresco instantâneo.
Minha temperatura corporal ameniza, visto algo que cobre da minha cintura para baixo e não cuido muito da minha arrumação agora. Busco minha mochila para buscar a minha pena de pavão trazida da escola, que não tem apenas um interesse em estudos envolvido. É ela quem vai substituir aquele mórbido buquê de flores de Narciso, nada decorador de ambientes. O peso que ele carrega, que não é apenas físico, hoje, eu deixo que ele se afunde e nunca mais ressurja para assombrar a minha mente, despedaço ele em pétalas e descarto ele no jardim póstumo da lixeira mais próximo. Aliás, não tem ocasião melhor onde flores simbolizam mais pontualmente vida e morte em harmonia, encerramento de ciclos e dar um enterro definitivo a essa história, uma verdadeira obliteração.

Flores são o símbolo do nascimento, o broto do sentimento, que cresce, se cultiva, se fertiliza e se multiplica. Conforme você maltrata, descuida, despedaça esse filhote, ele se torna frágil, incapaz. Fica por um fio, uma raiz, um galho, no melhor sentido aplicável. Conforme você rega, fortalece e fortifica, sólido, saudável e duradouro ele se mantém. Há aqui uma contraposição: vida e morte, cuidado e descuido, progresso e descontinuidade, lembrança e esquecimento. Esse ramo quando nasce é celebrado, é curtido, é aproveitado.
Em homenagem à gratidão a algo, flores simbolizam agradecimento, reconhecimento de uma ação. Proveito benéfico de uma situação. Um presenteio gracioso. Flores também simbolizam exposição, reafirmação, decoração, amostra daquilo que amamos, um rodeio de aproximação do que nos orgulhamos de depositar. Enfeite, adorno do perfume que apaixona o ambiente. Por outro lado, põe fim em um finado sentimento; depois de morto, embalsamado e finalmente enterrado, as flores se sobrepõem onde antes se cravava suas raízes e se junta ao moribundo como tal; repousa fadado a decomposição.

Enfim, jaz aqui póstumo e tardio toda a esperança da reanimação ou ressuscitação, descansa resolvido esse amor que tinha validade para a eternidade mas que você não teve a intenção de levá-lo com você. Pôde ter guardado consigo porém preferiu mantê-lo no compartimento do esquecimento até que definhou até desaparecer.

Levo para fora essa sacola para se juntar aos outros entulhos e que seja levado para o distante sem destinatário. Ao voltar, passo pela minha mãe, que me interroga no caminho por algo específico. Ou melhor, alguém.

- Austin, você sabe se sua irmã está em casa? - essa pergunta é um perigo se tratando da Glendollyn.

- Sinceramente, eu não sei, mãe... Eu acabei de chegar também.

- Entendi... - sinto uma pausa sugestiva em sua fala e se ela não dá continuidade, uso de novo da minha melhor artimanha.

- Houve algo?

- Não, filho. Ela só saiu ontem e não avisou mais nada. - finjo compreensão e digo para o meu quarto. Precisava desse complemento de explicação para mapear a situação e dizer o que poderia ser dito. A lábia, a ciência de como saber direcionar uma conversa nesses momentos é fundamental para não dizer o que não deve. Nos meus pensamentos positivos, a Glendollyn, desde a sua aparição que eu a vi, apenas está na rua há algumas horas, considerando se ela saiu um pouco depois de mim. Nos piores, aquilo tudo que eu vi foi um delírio matinal com o qual interagi e ela está de fato pelas ruas a solta, suscetível a todo perigo e diversão clandestina que o mundo lá fora oferece. Dado que esses comportamentos não são de hoje, omiti mais o que eu não sei do que quis dar alguma pista do que estaria fazendo ou onde poderia estar, ela tem a sorte que eu a safei dessa bronca mas as explicações ao aparecer, vai ficar por conta dela, para salvar a própria pele. Não sei se foi por desespero de momento para saber o que houve ou se a mamãe acha que eu e a Glendollyn temos um tipo de complô que ambos confiam em contar os segredos do que aprontam e que eu poderia entregá-la, o que é de longe engano.

De volta ao meu momento de introspecção, me recolho na minha concha como um ermitão para refletir quanto a minha decisão: pôr fim a uma dúvida emocional que me cobra e impede de seguir; sendo assim, esse obstáculo está eliminado de campo e posso finalmente prosseguir sem admirar essa flores como se ainda florescessem dentro de mim e exalassem qualquer paixão ou apego. Então assim, posso oferecer uma versão de mim nova, melhor e atualizada, sabendo que flagelações mentais do passado não podem me conjurar mais. Para aqueles que me amam de verdade, se preocupam, se importam e cooperam positivamente para o meu bem estar sempre progredir.

Reflito mais um pouco e de tanto esvaziar a mente, minha barriga sinaliza como um tanque de combustível que precisa ser reestocado também. Parto para revirar algo no armário, já que o almoço caprichado do colégio ainda pesava no estômago, busco por algo que possa cobrir a cota de sobremesa e minha tarde de filmes está garantida. Tudo bem, meu armazenamento de energias pode estar um pouco viciado e pede por recarga precipidamente, antes mesmo do necessário mas obedeço por minha própria satisfação.

Embarco na caça de filmes, que dura mais do que o meu próprio alimento, e navego pelos múltiplos gêneros sem restrição enquanto a procura pela escolha perfeita quase ultrapassa a longevidade de um longa metragem comum. Difícil ter uma aura ora exigente ora indecisa, dilema esse que permeia minhas decisões sem excessão, sobrepondo considerações umas as outras que só permitem ainda mais análises criticas do que um consenso concreto.

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⏰ Última atualização: Oct 21 ⏰

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