O Cetro das Almas

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As sombras da noite pairavam pesadas sobre a floresta, e a lua cheia derramava sua luz prateada sobre as copas das árvores antigas. Agatha Harkness corria sem rumo, os pés descalços arranhando o solo frio e úmido. As memórias do que acabara de acontecer a perseguiam como fantasmas: o brilho violento da magia que escapara de suas mãos, os gritos cortantes de sua mãe, Evanora, e do coven que jurara protegê-la.

Ela tropeçou em uma raiz saliente, caindo de joelhos. Respirava com dificuldade, as mãos sujas de terra tremiam enquanto lembrava a expressão de choque e medo no rosto de sua mãe. Agatha não pretendia. Nunca quis... A magia negra que sugara de todas elas tinha sido despertada de dentro de si, uma força que ela não entendia e muito menos controlava. O poder agora pulsava em suas veias, quente e insaciável.

"Eu sou um monstro", sussurrou para si mesma, a voz embargada.

A floresta ao redor dela parecia viva, sussurrando acusações nas línguas antigas do coven. Galhos se moviam como dedos esqueléticos, e o vento carregava risos distorcidos que a faziam estremecer, só conseguia entre os risos a frase "eu devia ter lhe matado ao nascer". A noite estava mais fria do que o normal, como se a própria escuridão reconhecesse a magia recém-desperta em seu sangue. Agatha fechou os olhos, tentando encontrar uma centelha de controle em meio ao caos dentro de si, mas tudo o que sentia era o eco do poder voraz que devorava sua consciência, era uma sensação boa, quase como um orgasmo ou alguma droga muito forte.

Um galho quebrou à distância, e ela prendeu a respiração, o coração disparado. Alguém ou algo estava seguindo seus passos. Agatha se levantou com um salto, só aí perceberá que estava caída no chão, forçando os músculos exaustos a se moverem. Fugir era a única coisa que sabia fazer agora - correr até que estivesse longe o suficiente de sua própria culpa, de seus erros, do eco dos gritos de seu coven.

Enquanto corria, imagens do rosto de Evanora surgiam em sua mente, a mistura de decepção e horror nos olhos da mãe. Agatha sentiu as lágrimas queimarem, mas as afastou com um movimento brusco. Não havia tempo para fraqueza. Não quando ela era caçada por sua própria criação e, possivelmente, por outros que poderiam ter sentido o desequilíbrio em sua magia.

Sem perceber, ela chegou à beira de um rio que cortava a floresta. A água refletia a luz da lua com um brilho prateado, parecendo calma e imperturbada em contraste com o caos em seu peito. Agatha se ajoelhou, deixando as mãos mergulharem na água gelada, como se pudesse lavar o peso da magia que agora fazia parte dela. Mas a sensação de paz foi breve. O vento sussurrou seu nome, desta vez mais claro e intencional. Ela se levantou rapidamente, os olhos vasculhando a escuridão, sabendo que sua jornada estava apenas começando e que forças desconhecidas já estavam cientes de seu poder.

Ela sabia que, de agora em diante, nada seria como antes.

[...]

Agatha caminhou à beira do rio, sem rumo, seus pensamentos dispersos como as folhas secas que flutuavam pela correnteza. Ela não sabia por quanto tempo esteve ali, mas o cansaço começou a invadir seu corpo, tornando seus movimentos pesados, como se o ar ao seu redor tivesse se tornado mais denso.

O som do rio, usualmente calmante, parecia agora um lamento distante, uma advertência. Cada gota d'água parecia se arrastar pelo leito do rio como se fosse uma eternidade. Agatha fechou os olhos por um momento, tentando se concentrar. Tinha que parar de correr. Ela sabia que não poderia se esconder para sempre. O poder que despertara dentro de si não ia desaparecer. Estava lá, uma presença que ela não conseguia controlar, e se não fosse cuidadosa, ela destruiria tudo o que amava, como fizera sem querer com sua mãe e o coven.

Ela respirou fundo, tentando dominar a sensação de pânico crescente. Não sabia o que fazer com esse poder, não sabia sequer como ele havia surgido. Tudo o que sabia era que algo dentro dela mudara, algo que estava além de qualquer feitiço ou ensinamento que já tivera.

"Eu não sou como elas", Agatha murmurou, mais para si mesma do que para qualquer outra coisa. "Eu nunca quis isso. Eu só... só queria ser forte."

O vento sopra novamente, mais forte, trazendo um aroma de terra úmida misturado com uma sensação estranha, como se o próprio ar estivesse carregado de algo ancestral. Agatha sentiu a presença antes de ver qualquer coisa. Algo mais estava ali, algo mais poderoso do que a simples noite ao seu redor. Algo que não pertencia àquele lugar.

Um som distante, como um estalo no ar, a fez virar rapidamente. Seus olhos, ainda ofuscados pela escuridão, procuraram algo na escuridão da floresta, mas tudo parecia calmo. Ela respirou fundo, tentando se acalmar, mas sentia a tensão na pele, a sensação de que não estava mais sozinha.

A floração de uma flor rara - uma flor que só crescia à beira do rio - a fez olhar para baixo. Agatha se abaixou lentamente, sua mão trêmula tocando as pétalas suaves. Algo estava... errado. O ambiente estava silencioso demais, e, em sua mente, as imagens de sua mãe e de sua destruição se fundiam com outra coisa: uma visão de algo que não podia tocar, mas sabia que a observava. O que fosse, estava se aproximando.

O silêncio foi quebrado com o som de algo se movendo nas sombras, à distância. Não era uma criatura ou um animal qualquer. Agatha sentiu a presença como uma pressão sobre seu peito. A sensação de ser observada era inconfundível.

Ela deu um passo para trás, os olhos procurando entre as árvores, mas não havia ninguém ali. Sentiu o coração bater mais rápido. Algo estava se aproximando... mas não era apenas um ser físico. Havia algo mais - uma essência, uma força.

De repente, uma sombra se projetou na sua frente, fazendo Agatha recuar bruscamente. Ela não sabia se deveria lutar ou correr. Era uma presença que não podia ver, mas podia sentir como se estivesse viva, observando cada movimento, cada pensamento.

"Quem... está aí?" Agatha disse, sua voz baixa e trêmula, mas desafiadora.

O vento parou abruptamente, e a floresta ficou ainda mais silenciosa. O que quer que fosse, estava agora mais perto do que nunca. Agatha podia sentir a energia mágica ao seu redor se intensificar, mas não sabia como manipulá-la, como canalizar aquilo. Era um monstro dentro de si - e, pior ainda, ela não sabia como acalmá-lo.

Um leve som, quase como uma respiração, chegou até seus ouvidos. Algo - ou alguém - estava mais perto. Agatha levantou a mão, involuntariamente, preparando-se para lançar um feitiço, mas logo hesitou. Não sabia o que faria, se tivesse que usar a magia. Se liberasse mais poder, poderia destruir tudo novamente. Talvez até a si mesma.

Ela olhou para a floresta ao redor, buscando uma saída. Mas as árvores pareciam cada vez mais densas e fechadas, como se estivessem a cercando. O peso da noite parecia se fechar sobre ela, e Agatha sentiu que não havia mais fuga.

E então, finalmente, uma figura apareceu.

Era uma sombra, etérea, mas de uma presença tão poderosa que fez a própria noite parecer insignificante. Agatha sentiu uma pressão crescente sobre seu peito, como se sua respiração fosse forçada para fora de seus pulmões.

A figura, imponente e distante, se materializou diante dela com a serenidade de uma força natural. Seus olhos brilhavam com uma luz que não pertencia àquele mundo. Agatha quase não conseguiu respirar.

E então, ela ouviu a voz. Não falava com sua boca, mas dentro de sua mente.

"Você não pode fugir do que desperta dentro de você, Agatha Harkness. E o poder que você liberou... não é algo que você possa controlar sozinha."

A voz era como um sussurro distante e, ao mesmo tempo, como um trovão que reverberava através de sua alma. Agatha não sabia se estava delirando, se o cansaço estava afetando sua mente, ou se estava diante de algo muito maior do que ela jamais poderia imaginar.

Mas ela sentiu o peso das palavras, como se um julgamento invisível estivesse sendo feito. Ela só consegue sentir seus olhos pesados e desmaia

Agatha: O Abraço da Morte.Onde histórias criam vida. Descubra agora