Calíope Braga

➏. ℬℯ𝓂 𝓋𝒾𝓃𝒹𝒶 𝒶 ℳ𝒾𝓁𝒶ℊ𝓇ℴ𝓈

Ninguém se preocupou em explicar muita coisa para Calíope. Quando retomaram o caminho de volta à civilização, a maior interação que tiveram foi emprestar à garota umas roupas extras, já que o inverno estava tão frio quanto podia estar. Os três magos passaram a maior parte do tempo em guarda, como se andasse um difunto entre eles. Seus ocasionais momentos de descontração eram seguidos por um silêncio ensurdecedor, que parecia vir mais ou menos quando eles lembravam da existência de Lilly. Às vezes, eles perguntavam uma coisa ou outra sobre quem ela era, o lugar de onde veio e sobre sua mãe e toda vez que ela dava uma resposta, os três se entreolhavam, como se encontrassem a mesma resposta individualmente.

Apesar disso, a menina já tinha chegado a suas próprias conclusões. Primariamente, aquele lugar tinha pouquíssimas chances de ficar no planeta Terra. Se ficasse, provavelmente não se tratava da mesma dimensão ou do mesmo período no tempo. Já tinha visto algo parecido em algum de seus livros Sci-fi, mas não conseguia lembrar o nome.

Ademais, a partir das perguntas dos três magos e especial interesse destes em Alice, Lilly entendeu que eles tinham alguma relação com sua mãe, só não sabia exatamente qual. Agora que estava se situando, até lembrou que o trio chegou a citar o outro nome dela. Aliás, sua velha tinha alguma coisa com sua situação atual, e isso ficava mais nítido para Calíope conforme o tempo passava. Já fazia meses que aquela mulher apocalíptica não parava de agir suspeito e falar coisas com pouco sentido, e na última semana essa estranheza se tornou ainda mais evidente. Pensar nisso a irritava. O fato de as palavras finais que saíram da boca da mãe antes das duas afundarem na água serem "eu te amo", como se estivesse se despedindo, a fazia tremer. Para ser sincera, Lilly não queria pensar muito nessa parte, mas decidiu perguntar, só por via das dúvidas.

- Com licença, alguém pode me falar mais sobre aquele lago? Por que ele tem aquela cor estranha? O que tem de errado nele?

Nem Eldaliza, nem Mliera quiseram responder, então Eriy tomou as rédeas da situação:

- O lago Sije é um lago de mana líquida. Seu poder é imensurável e é desejado por qualquer um que saiba da sua existência. Não é à toa que tivemos que selar.

- É também um dos maiores mistérios do mundo. - continuou Eldaliza, como se considerasse a resposta do homem vaga demais - existe um ditado sobre ele: em noite de lua cheia, só se afunda uma vez no lago Sije. Porque quem mergulha nunca mais volta. O que me leva a questionar, como você retornou?

Calíope não respondeu, pois ligava os pontinhos na sua cabeça. Ela havia imergido naquele lago e emergido em um lugar completamente diferente, que parecia de outro mundo. Mas, se alguém a observasse da caverna em que tinha montado acampamento junto com a mãe, veria justamente ela desaparecendo para nunca mais voltar, seria como se Lilly tivesse morrido. Ao mesmo tempo, a mãe mergulhou, mas ela conseguiu retornar. Ou será que... Bem, aquelas pessoas possivelmente eram magos, como Alice. Falavam coisas tão indecifráveis quanto e sabiam construir símbolos como os do grimório da mãe, a qual vivia comentando de um lugar onde a magia parecia ser comum, quase como outro mundo. Será possível que ela tenha conhecido os três magos e, se sim, é lógico concluir que ela então teria mergulhado ao menos uma vez naquele lago para aparecer lá na Terra e casar com meu pai. Mas porque ela não voltou? Talvez, não conseguiu voltar. E, então, seria verdade. Ela simplesmente não consegue, por isso, quando mergulhou, ela apareceu exatamente no mesmo lugar de antes. E por isso estava chorando? Está presa lá, e eu presa aqui. De repente, caiu no chão e começou a chorar, percebendo que não veria sua mãe novamente e que por isso ela se despediu daquele jeito.

- Eu não retornei, eu não retornei! - disse, finalmente se dando conta da resposta. Os magos, sem entender muito bem e sem saber o que fazer, a abraçaram, esperando que ela se recompusesse antes de continuar com a caminhada. Nenhum deles quis dizer o quão nostálgico aquilo foi, isto é, foi como se abraçassem a antiga amiga.