Entre manobras e sentimentos-Rayssa Leal

Linhas que se cruzam

Depois daquele dia no parque, comecei a perceber que minha relação com Rayssa tinha mudado, mesmo que de forma sutil. As conversas pareciam ter mais camadas, os olhares duravam mais tempo, e os silêncios entre nós não eram mais desconfortáveis, mas carregados de significados.

Hoje, estávamos em um café, um daqueles pequenos e aconchegantes que Rayssa gostava de frequentar quando queria escapar um pouco da rotina agitada. Ela estava à minha frente, com uma xícara de chocolate quente entre as mãos, enquanto falava sobre a próxima competição.

"Vai ser em São Paulo dessa vez," disse ela, os olhos brilhando com uma mistura de ansiedade e empolgação. "É uma das maiores etapas do ano."

"E você está pronta?" perguntei, tentando parecer mais tranquila do que realmente estava. Rayssa parecia tão focada, tão determinada, que às vezes eu me perguntava se havia espaço para algo mais em sua vida.

Ela deu de ombros, sorrindo. "Nunca dá pra saber até estar lá, né? Mas estou treinando o máximo que posso."

Assenti, tomando um gole do meu café, mas meu estômago estava em um nó. Havia uma pergunta que queria fazer há dias, mas a coragem sempre me escapava. Finalmente, respirei fundo e decidi arriscar.

"E... você acha que consegue equilibrar tudo? Quero dizer, o skate, a vida pessoal..." minhas palavras saíram hesitantes, mas Rayssa não pareceu surpresa.

Ela inclinou a cabeça, me observando com cuidado. "Você está preocupada com isso?"

"Talvez," admiti, desviando o olhar para minha xícara. "É só que... não deve ser fácil, sabe? Sempre em movimento, competições, treinos..."

Rayssa ficou em silêncio por um momento, e quando voltou a falar, sua voz era suave. "Lívia, eu não vou mentir. É difícil. Mas algumas coisas valem o esforço, sabe?"

Levantei os olhos para encontrar os dela, e o peso daquela frase me atingiu em cheio. Rayssa não estava falando só sobre o skate. Eu podia ver isso na forma como ela me olhava, como se quisesse me dizer algo que as palavras não conseguiam expressar.

O café parecia mais quente de repente, e meu coração batia descompassado. Antes que eu pudesse responder, Rayssa sorriu, quebrando o momento com sua leveza habitual.

"E aí, o que você acha de me acompanhar em São Paulo? Eu poderia usar uma câmera amiga por lá."

A proposta me pegou de surpresa, mas ao mesmo tempo, fez meu coração disparar. "Você quer que eu vá com você?"

"Claro," ela disse, casual, mas havia algo mais em sua voz. "Além de me filmar, você seria uma boa companhia. E talvez pudéssemos explorar a cidade um pouco, entre as competições."

Sorri, tentando esconder a excitação crescente. "Acho que seria uma boa ideia."

Rayssa riu, levantando sua xícara em um gesto de brinde. "Então tá combinado. Vamos arrasar em São Paulo."

Ela fez parecer tão simples, tão natural. Mas para mim, aquilo era mais um passo em direção a algo que, embora assustador, parecia cada vez mais inevitável. Eu sabia que, eventualmente, teria que encarar meus sentimentos de frente. Talvez São Paulo fosse o lugar onde tudo se esclareceria.