Capítulo 15

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CAPÍTULO 15

<<Cris>>

Enquanto caminho para casa, vou pensando em tudo o que aconteceu hoje. Na padaria a convivência é cada dia pior, mas preciso do meu emprego. Já no lar de idosos, me senti tão bem que, por alguns instantes, fantasiei que aquela ali era minha família, que eu tinha amigos.

Fantasiar eu posso. Mas, fazer amigos eu não consigo. Marcos me parece ser um rapaz sério, responsável, gentil e honesto. Mas, Anderson também parecia ser isso tudo até bem pouco tempo atrás...

Acho que depois de tudo que vivi ao lado dele, vai ser difícil me deixar confiar em alguém novamente. Seu Joaldo é diferente. Só nos vemos e falamos mesmo na padaria. Ele respeita tanto a minha escolha de vida que sei que mandou um entregador trazer o almoço e o jantar para não forçar uma aproximação maior porque sabe que não quero.

Estou tão perdida em meus pensamentos que chego ao portão da vila e nem noto. Quando entro, a moradora da casa número um me chama:

"Ô vizinha do seis?" - ela grita.

"Pois não, senhora?"

"Agora há pouquinho teve um homem te procurando aqui. Ele não sabia o número da sua casa, mas te descreveu. Custei a lembrar de você porque você não para nunca para conversar..." - percebo a crítica embutida em seu comentário - "... mas, ele deixou esse envelope para você." - me entrega um envelope lacrado.

Nele há apenas meu primeiro nome escrito, mas reconheço a letra horrível de Anderson imediatamente.

"Obrigada, senhora. Ele já foi embora?" - questiono temendo a resposta.

"Sim. Pediu que te entregasse isso e foi embora."

"Obrigada, mais uma vez. Com licença." - me despeço e sigo para casa.

Coloco o envelope em cima do sofá. Não sei se quero abri-lo. Vou para o quarto, pego uma muda de roupas e vou tomar banho. Dancei e caminhei. Estou muito suada. Só um banho mesmo para me reanimar!

Termino o banho e sinto fome. Lembro que eu tinha congelado umas comidas no domingo antes de ficar doente. Retiro uma das porções e coloco para esquentar no micro-ondas.

Enquanto a comida descongela, vou para a sala e fico zapeando pelos canais para ver se tem algo que me interesse. Quando morava no Méier, minha condição financeira era melhor e eu podia me dar ao luxo de ter TV por assinatura. Mas, com o salário de balconista de padaria não posso e, por isso, só me restam os canais abertos. Isso significa que minhas opções agora a noite são novelas, telejornais ou programas de igrejas. Desligo a TV e decido escutar rádio.

O micro-ondas apita, avisando que a comida descongelou. Vou para a cozinha e como. Não sei se é a fome, mas gosto muito da comida que fiz e congelei. Termino de comer, lavo a louça e volto para a sala. Sento no sofá, pego o controle e aumento o som do rádio. Quando coloco o controle remoto no sofá, minha mão esbarra no envelope deixado por Anderson. Eu já havia me esquecido dele.

Fico o olhando. Não quero abrir, mas sou curiosa demais. Anderson sabe disso. Sabe que eu não conseguiria conter minha curiosidade. Ele sabe que vou abrir.

"A quem vou enganar? Eu quero abrir esse envelope. Mas sei que boa coisa não vem." - comento comigo mesma.

No rádio começa a tocar Miles Away do Winger.

"So this is love or so you tell me (então, isto é amor, ou pelo menos é o que você diz)/ As you're walkin' out the door (enquanto caminha porta a fora)/ The months go by and I know for certain (os meses passam e eu sei com certeza que)/ It's not the love I'm looking for (este não é o amor que procuro)/ But sometimes just for a moment (mas, às vezes, só por um momento)/ I reach out hope you're still there (eu estendo a mão, na esperança de que você ainda esteja lá)..."

Olha Pra MimOnde histórias criam vida. Descubra agora