Capítulo 2

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Fui para casa a pé, como sempre. Alice subiu a ladeira de sua casa e eu desci. Fiz meu percurso de sempre. Passava pela praia e pela praça, pela peixaria, virava à esquerda, subia a rua do Club e lá estava minha casa, na Chelson Road. Havia sim um caminho mais fácil e rápido, mas não queimava tantas calorias como este que eu fazia há alguns meses.
Logo que entrei, pude sentir o cheiro da comida que minha mãe preparava. A maioria das pessoas diria que aquilo estava apetitoso, mas para mim... Sentia enjoo.
Tentei subir a escada na ponta dos pés, assim minha mãe não me convidaria para almoçar, e nem ficaria brava quando eu dissesse que não estava com fome.
- Filha?
Droga.
- Oi, mãe.
- Não está com fome? Já vai para seu quarto?
- Parei numa lanchonete com a Alice, mãe. Tenho que fazer lição.
Sem olhar seu rosto - que eu sabia que transbordava desapontamento -, subi as escadas e abri meu notebook roxo que havia ganhado de presente do meu pai no natal passado. Ele realmente acha que pode compensar todos os anos de sofrimento que causou a minha mãe com presentes. Mas eu não podia reclamar. Ganhar o notebook foi melhor do que compartilhar com Rose aquele velho computador empoeirado.
Não tinha lição nenhuma. Bem, até tinha, mas nada que eu me importasse. Abri meu tumblr e quando vi já haviam passado duas horas desde que eu cheguei em casa. Me perdi em comentários de apoio das garotas. Tirei algumas fotos novas dos meus e das minhas costelas também. Mais algumas refeições puladas e eu conseguiria contá-las uma por uma. Procurei por minha caixa de thinspos (N/A: numa tradução livre, significa Inspiração Magra. Fotos de pessoas extremamente magras em que as meninas com distúrbios alimentares se espelham). Escondi-a tão bem de minha mãe que nem eu mesma a achava. Mas lá estava ela, bem no fundo, de baixo da minha cama. Fotos e fotos de modelos em que eu me espelhava. Nunca quis ser modelo. Só queria o corpo delas. Os ossos delas, seus braços finos e grandes espaços entre as pernas. Elas não eram como eu. Uma grande merda gorda. Um gigante pedaço de gordura de passeava pelas ruas de Torquay.
- Penelope? - A porta do meu quarto se abriu e eu logo joguei as fotos para debaixo do travesseiro. - Achei que a esta hora você estaria com fome então trouxe alguns cookies... Como vai o dever de casa? - Rose perguntou, mostrando interesse, como sempre. Me enchia o saco.
- Fácil, mãe. Já estou acabando. Obrigada - Sorri, encarando aqueles cookies de chocolate que eu amava tanto. Meu estômago roncava.
- Então tá, filha... Se precisar de algo é só me chamar, ok?
Assenti com a cabeça enquanto ela fechava a porta. Era óbvio que minha mãe estava chorando. Eu a fazia chorar. Sempre eu. Se eu não tivesse surgido na vida dela, ela provavelmente seria feliz.
O cheiro de chocolate entrava em minha mente e alimentava-me psicologicamente. A voz em minha cabeça dizia para eu ir em frente e comer sem culpa. Eram só cookies, que mal poderiam fazer?
Mas aí a voz de Mia também estava lá.
"Você vai mesmo comer isso? Vai mesmo, sua porca? Por isso você é tão gorda. Você acha que a Alice come? Você acha que alguma garota bonita come cookies? Pensei que você quisesse ser magra"
E a voz de Mia continuava em minha cabeça enquanto eu devorava os cookies aos prantos. Comecei com uma mordida. Engolir doía. Depois acabei com os três cookies de uma vez. Lágrimas escorriam de meus olhos enquanto eu sentia toda aquela comida indo para o meu estômago, inchando minha barriga e me deixando cada vez mais gorda e ridícula.
Por que você comeu, Penelope? Por quê? Estávamos indo tão bem... Agora terei que te forçar a ir ao banheiro... Você sabe muito bem o que deve fazer. Deveria ter pensado antes de engolir tudo aquilo, dizia Mia. Ela me obrigava a abrir a tampa da privada. Ela me obrigava a pegar minha escova de dentes verde e colocá-la em minha garganta. Doía. Eu queria não precisar fazer isso, mas eu falhei... De novo. Logo senti a queimação em minha garganta e aquele gosto terrível. Aquele cheiro... Era tudo nojento. Eu era nojenta.
Coloquei a escova mais algumas vezes goela abaixo até nada mais sair dali. Deitei-me no chão do banheiro, como já havia feito várias vezes, tentando ser silenciosa ao chorar para não fazer minha mãe se sentir pior.
É isso que você ganha por quebrar as regras.


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