Capítulo 1 - Arautos do Destino

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Flora se deitou, entediada, e seus longos cachos cor de fogo escorreram pela borda da cama. Estava com dezessete anos, seu rosto era fino, as orelhas pontudas, e a pele lisa e macia apresentava um tom cinza-esverdeado. Estava cansada da monotonia daquele lugar. Tudo era sempre tão calmo e silencioso, que, quando seu pequeno brinco de pérola caiu no chão, o som agudo do baque pareceu soar como um grande estampido.

Com um longo suspiro, levantou-se para recolhê-lo e o prendeu de volta na pontinha de sua longa orelha. Por algum motivo inexplicável, ele sempre caía, mas Flora insistia em usá-lo. Não que gostasse tanto assim do brinco, mas ele formava a combinação ideal com seu medalhão de ouro. Este, sim, era especial, possuía-o desde pequena e não o tirava do pescoço. Por algum motivo, dava-lhe a sensação de que a vida ainda lhe reservava uma grande aventura.

Flora foi arrancada de seus devaneios quando ouviu uma agitação abaixo de sua janela. Tudo o que mais desejava era um pouco de emoção, algo que trouxesse algum barulho àquele lugar, mas jamais acreditou que isso aconteceria tão cedo. O povo sollaris, sempre muito tranquilo, raramente gritava ou corria. Mesmo morando na principal cidade da grande Ilha de Ashteria, o som mais comum que se ouvia era o das folhas das árvores se debatendo ao soprar de uma brisa.

A calmaria cotidiana dava a Flora uma angustiante sensação de inércia. Por isso, vivia inventando coisas novas para fazer, e não conseguia entender porque ninguém a acompanhava em suas ideias. Às vezes, sentia-se uma estranha em seu próprio lar. Quem dera todos os dias fossem como na festa da colheita, que acontecia no equinócio de outono. Nesta noite todos riam, cantavam e dançavam. Mas a festa invariavelmente chegava ao fim, então tudo voltava a ser sossegado como de costume.

Mas a época de colheita ainda estava longe, e, até aquele momento, aquele era um dia comum, em que nada acontecia. Até ter início a agitação lá fora, incomum e sedutora.

Curiosa como só ela, Flora abriu a janela de madeira e pôs a cabeça para fora, para espiar o que se passava. E, ao contrário da atmosfera lenta e tranquila com a qual estava acostumada a conviver, deparou-se com uma rua cheia de sollaris que corriam por todos os lados. Muitos se perguntavam como proceder, outros gritavam instruções desconexas.

– O que está havendo? – Flora gritou ao avistar Latham, o mais velho de seus muitos irmãos, correndo em direção à praia.

– Flora, não saia de casa! A ilha está sendo invadida! – Gritou de volta, alarmado, e correu em busca de alguma arma que pudesse usar.

Invadida? Seria possível? Mas aquela era uma ilha mágica! Quando criança Flora aprendera que Ashteria, também conhecida como "a ilha onde tudo parece ser o que realmente é", era totalmente secreta, não podia ser invadida. Sequer podia ser encontrada! Infelizmente, a jovem nunca compreendera que o isolamento era a menor das magias presentes naquele lugar. Mas logo isso mudaria, e ela aprenderia o real significado daquele local.

Flora decidiu que precisaria rever todos os conceitos que lhe ensinaram até então, assim que viu a embarcação que aportava na praia. Ao contrário do que pensara, não se tratava de um navio de guerra com guerreiros ao ataque. Era apenas um pequeno barco a remo, que não representava grande perigo, mas foi suficiente para assustar toda a população. Ansiando por novidades, Flora correu à praia para ver de perto os recém-chegados.

Um grupo de sollaris armados aguardava a chegada do pequeno bote, enquanto uma multidão se escondia atrás deles, prontos para defender suas terras, mas não a ponto de desejarem um embate. Sem estardalhaço, os visitantes atracaram. Eram dois humanos bem vestidos, um velho e um moço. O primeiro, baixo e magro, possuía cabelo curto e uma longa barba triangular. Não era feio, mas uma grave queimadura deformava parte de seu rosto.

A Rainha da Primavera - 2ª EdiçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora