Capítulo 12 - Osíris

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Jane

      A morte é... estranha, escura e amendrontadora. Mas, havia uma incidência de luz no fim do túnel. Eu estava descalça; senti meus pés tocarem no piso frio e úmido. Minha roupa era tão leve. Não havia sangue, nem dor. A única sensação que eu tive foi medo; "O que eu encontraria quando chegasse ao fim?", pensei curiosa. A estrada foi longa, escura e gelada, mas prossegui determinada. O caminho parava em frente a uma grande porta de madeira; sua maçaneta era lisa. Eu a segurei e a girei para a minha direita; estava destrancada.

Quando eu abri a porta totalmente, pude ver o que tinha por de trás: uma floresta incomum, cheia de árvores, com mais de dez metros de altura cada uma; muitas cores tomavam conta do ambiente, aquele lugar era o mais bonito que eu já havia visto em toda minha vida (bem, quando eu era viva). Fui andando admirada por cada centímetro daquele local. Enquanto explorava o ambiente, percebi que havia uma pequena nascente à minha frente que cortava a terra; resolvi segui-la. A nascente começou a crescer, formando um pequeno riacho. Chegando ao fim da trilha, havia uma casa rudimentar de cor esverdeada; aparentava muito as cores da natureza, era uma camuflagem. Fui tentata a entrar lá e foi o que eu fiz. Eu abri a porta com bastante cuidado, sem fazer barulho algum. Entrei dentro da casa misteriosa.

O chão era de areia, as paredes de pedra possuíam hierógrafos contando toda a história do Egito. Aquele lugar me lembrava muito a parte de dentro de uma pirâmide que eu havia sonhado um dia. Andava distraída, quando esbarrei em alguém, Osíris, o deus dos mortos e do renascimento. Ele tem os cabelos negros e os olhos da cor de alba, sua pele possui um tom de canela. Osíris e Ísis são conhecidos por julgar a alma dos egípcios, quando morriam, e decidiam sobre seu destino. Osíris é o responsável por governar a terra e, através das águas doNilo, ressuscitar a vida existente em torno do rio sempre que a seca matava tudo, inclusive pessoas. Osíris usava uma roupa branca e parecia ser bem divertido.

- O que você faz aqui !? Não esperava ver você aqui tão cedo - ele arregalou os olhos assustado e eu franzi a testa, confusa.

- Como assim? - estranhei. - Eu fui assasinada - respondi como se fosse óbvio.

- Isso não está certo! - ele exclamou furioso. - Eu não escrevo livros para terem um fim trágico como esse! - o deus ficou pensativo logo em seguida. - Só posso te dizer que o bebê está em boas mãos!

Olhei para minha barriga e percebi que eu não carregava mais o neném; aquilo me trouxe uma dose de tristeza e saudade.

- O que aconteceu com meu filho? - questionei magoada.

- Com a sua filha - respondeu.

O deus começou a andar de um lado para outro, pensativo, com a mão segurando o queixo, finalmente, parou de andar e fez uma cara como se tivesse resolvido uma charada.

- O livro da morte! - ele exclamou sorridente. Nada que Osíris dizia fazia sentido para mim.

Osíris me puxou pela mão e me levou até uma sala grande, mas bem diferente da entrada da casa; era um local bem espaçoso e aconchegante, com várias estátuas e móveis até modernos. Essa sala se parecía muito com uma tela que eu havia pintado quando descobri que estava grávida.

- Você podería me explicar o que está acontecendo? - questionei angustiada, enquanto ele se sentava à mesa, e escrevia num pergaminho feito de papiro.

- A culpa de sua morte não foi minha, foi de Anúbis. Esse "deusinho" tem inveja das coisas boas que eu faço para os humanos e, por isso, ele mata as pessoas que considero mais importantes na terra.

- Mas eu pensava que Anúbis fosse seu filho. Você não se uniu com Néftis por tê-la confundido com sua esposa, Ísis? questionei curiosa.

- Não, não, não. Essa versão é a mais comum, mas é a mais louca! Como eu podería confundir minha própria esposa? Eu confiei em Anúbis. Ele até hoje é meu embalsamador divino e um dos responsáveis pelo julgamento dos mortos no além-túmulo. Ele foi contra todas as regras que regem nosso mundo, matando, sem minha autorização, a reencarnação da Cleópatra, você.

- O que !?!? - gritei pasma.

- É isso mesmo que você ouviu. Você é a Cleópatra, só que uma versão mais gentil e menos chata. Bom, tudo isso é mais simples do que parece. Eu vou te trazer de volta à vida. Sua filha ficará com meu filho Hórus até que ele decida que é seguro levá-la de volta para a terra. Fique tranquila, meu filho cuidará muito bem dela. Eu mesmo cuidaría dela, mas meu tempo está chegando ao fim.

Osíris segurou meus ombros e mostrou confiança no olhar. Ele prosseguiu com a fala num tom de advertência:

- Mas, lembre-se, aquele que você mais confiou é o que te traiu. Não posso te falar mais nada, pois o seu futuro depende somente de você. Você ficará escondida dentro da pirâmide e escreverá todos os dias para seu marido. Eu cuidarei que esse diário chegue até ele; enviarei sinais para ver se Robert se toca e vai te procurar. Continue com o plano que seu irmão planejou, eu gostei muito; cara esperto, afastará vários ladrões. Jorge possuía uma fé tremenda.

- Posso pelo menos ver minha filha ? - falei com um aperto no coração, como se eu não fosse vê-la novamente.

- Claro, não priveria uma mãe de ver sua filha - Osíris respondeu sorrindo.

Ele se levantou da cadeira e saiu da sala; eu o segui. Nós subimos uma escada de pedras, enquanto Osíris comentava que queria fazer uma reforma relâmpago naquele lugar monótono. Meus pensamentos estavam em outro lugar. Tudo era muito confuso para mim. "Como irei respirar dentro de uma pirâmide fechada? Minha filha será criada por um deus? Eu sou uma rainha do Antigo Império? Ficarão sabendo da minha morte?! Como o plano funcionará?", pensei frustada.

- Calma, essas perguntas serão respondidas com o tempo - o deus pareceu adivinhar meus pensamentos.

Nós paramos de andar em frente a uma porta de madeira; gravado nela havia um desenho da deusa Ísis, a deusa da maternidade e da fertilidade. Em mitos posteriores sobre Ísis, ela teve um irmão, Osíris, que veio a tornar-se seu marido, tendo se afirmado que ela havia concebido Hórus. Ísis contribuiu para a ressurreição de Osíris, quando ele foi assassinado por Seth.

- Como Ísis é? - perguntei muito curiosa.

- Ela era uma grande deusa e mulher - ele respondeu, parecendo meio desconfortável com a pergunta. - O tempo e o poder dela se esgotaram - ele abaixou a cabeça, ficando triste. - Eu ainda me considero marido de Ísis e pai de Hórus. Continuo julgando os mortos na Sala das Duas Verdades, mas sem ela, permaneço sem esperança.

- Sinto muito - falei sinceramente.

- Tudo bem - ele deu um sorriso fraco.

Osíris abriu a porta bem lentamente e meu coração disparou. A única coisa que havia lá dentro era um berço simples; caminhei em sua direção e vi o bebê, tão frágil e tão pequena. Peguei-a em meus braços e a abracei com lágrimas nos olhos. Segurei-a por vários minutos.

- Lamento o tempo é curto; você precisa voltar para a terra, Jane - Osíris disse.

(...)

Continua...

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