16

185 3 0
                                    

16Débito aliviado

Em nossos estudos da lei de causa e efeito, não nos esqueceremosde Adelino Correia, o irmão da fraternidade pura.Na véspera de belo acontecimento que nos permitiremos narrar,visitamo-lo em companhia de Silas, que no-lo apresentou nasatividades de um templo espírita-cristão. Ouvimo-lo em preciososcomentários do Evangelho, sob o influxo de iluminados instrutores,dos quais assimilava as correntes mentais com a docilidadeconfiante de um homem profundamente habituado à oração. Falaracom mestria, arrancando-nos lágrimas pela emotividade comque nos tangia as fibras mais íntimas. Singelamente trajado, denotavaa condição do trabalhador em experiências difíceis. Mas oestágio de prova a que parecia enredar-se era mais amplo. Adelinorevelava longa faixa de eczema na pele à mostra. Certa porção dacabeça, os ouvidos e muitos pontos da face exibiam placas vermelhas,sobre as quais se formavam diminutas vesículas de sangue,ao passo que as demais regiões da epiderme surgiam gretadas,evidenciando uma afecção cutânea largamente cronicificada.Além disso, acanhado e tristonho, indicava tormentos ocultos alhe dominarem a mente. Contudo, trazia nos olhos, maravilhosamentelúcidos, a marca da humildade. Vários amigos espirituaisassistiam-no, atentos.Doce velhinha desencarnada abeirou-se de nós e, demonstrandogozar da intimidade do orientador de nossas excursões,falou-lhe, afetuosa:- Assistente amigo, venho rogar-lhe socorro em benefício dasaúde de nosso Adelino. Noto-o mais incomodado, ultimamente,pela dor das feridas não cicatrizadas...

- Sim, sim... - respondeu Silas, cordialmente - o caso delemerece de todos nós especial carinho.- Porque pensa ele nas necessidades dos outros, sem refletirnas necessidades próprias... - acrescentou a anciã, comovida.O assessor de Druso prosseguiu, com carinho:- Dois de nossos médicos o vêm assistindo atenciosamente,quando se encontra ausente do vaso físico por influência do sono.E, afagando-lhe a cabeça:- Esteja tranqüila. Correia, em breve, estará plenamente restaurado.Os múltiplos serviços da casa desdobravam-se, eficientes, eAdelino, dentro deles, atraía-nos a atenção pela segurança espiritualcom que se conduzia. Cercado pelas vibrações radiantes dosseus pensamentos, centralizados no santo objetivo do bem, afigurava-se-nosum companheiro vestido de luz.Alguns instantes após o afastamento da velhinha, apareceunossimpático rapaz, igualmente já desenfaixado da matéria física,que, depois de saudar-nos, rogou, reverente, ao nosso orientador:- Peço vênia para solicitar-lhe valioso obséquio...- Fale sem receio.E o jovem recém-chegado explicou, de olhos úmidos:- Meu caro Assistente, sei que o nosso Adelino vem atravessandocerta crise financeira... Pelo muito que auxilia os outros,descura-se das suas próprias necessidades. Pelo amparo que eleoferece constantemente à minha pobre mãe encarnada, insisto noapoio de sua amizade para que seja favorecido. Ainda na semanapassada, ouvindo as súplicas de minha genitora viúva, em grandepenúria para atender ao tratamento de dois dos meus manos enfermos,procurei-o, em lágrimas, transmitindo-lhe apelos mentaispara que nos protegesse e, sem qualquer vacilação, acreditando obedecer aos seus impulsos, visitou-nos a casa, entregando àminha sofredora mãezinha a importância de que necessitava... ómeu Assistente, rogo-lhe por amor a Jesus!... Não deixe em dificuldadequem tanto nos auxilia!...Silas acolheu a petição com risonha benevolência e disse:- Descansemos. Adelino permanece na rede de simpatia fraternalque teceu para o asilo de si mesmo. Incumbem-se muitosamigos de supri-lo com os recursos indispensáveis ao fiel desempenhoda tarefa a que se dedicou. As circunstâncias na luta materialharmonizar-se-ão em favor dele, atendendo-lhe aos méritosconquistados.Efetivamente, o serviço espontâneo na afetuosa defesa do amigoque ali enxergávamos, prestativo e confiante, era um temade amizade e gratidão a estudar.- Dir-se-ia - observou Hilário, intrigado - que todos os tarefeiros,em trânsito nesta casa, são devedores do irmão sob nossavista...- Sim - aprovou Silas, paciente -, os créditos de Adelino sãorealmente enormes, não obstante os débitos a que ainda está preso...Cultiva, no entanto, a ventura de substancializar a fé e oconhecimento superior que os Mensageiros de Jesus lhe confiamem obras de genuíno amor fraternal, a lhe granjearem larga somade reconhecimento.Logo após, o mentor amigo recomendou-nos aproveitar osminutos em atuação fraternal, no instituto evangélico em que nosabrigávamos, até que pudéssemos tomar contacto mais amplo como servidor, cuja existência atual se desdobrava sob os auspícios daMansão que nos patrocinava os estudos.Em face da simpatia que Adelino despertava igualmente emnós, acercamo-nos dele, a fim de ofertar-lhe, de algum modo, ocontingente de nossas forças, na movimentação dos passes magnéticos que passara agora a administrar, em favor de alguns enfermos.Era curioso pensar que nós mesmos, no primeiro encontrofortuito, nos sentíamos prontos a partilhar-lhe as tarefas, tãosomenteatraídos por sua irradiante bondade. A abnegação, emtoda a parte, é sempre uma estrela sublime. Basta mostrar-se paraque todos gravitemos em torno de sua luz.Findo o serviço da noite, Silas e nós acompanhamo-lo ao redutodoméstico. Esperava-o, no limiar, a genitora que, evidentemente,ultrapassava os sessenta de idade. Silas deu-se pressa emno-la apresentar, explicando:- É nossa irmã Leontina, carinhosa mãe de Correia, mãe eamiga a tutelar-lhe a existência.Reparando na avançada madureza do amigo que nos tomava aatenção, meu colega indagou:- Adelino não é casado?- Sim, nosso irmão é casado, mas não conta com a presençada esposa.A resposta dava-nos a entender que o companheiro atravessavaprovas perante as quais nos cabia respeitosa discrição.E, enquanto mãe e filho se entregavam a doce entendimento,Silas fez-nos penetrar em aposento próximo.Junto á porta de entrada, alinhavam-se três leitos, ocupadospor outras tantas criancinhas.Loura menina de seus nove a dez anos presumíveis, ao ladode dois petizes de escura tez, recordava a Branca de Neve entredois anões. Todos dormiam, placidamente.Afagando a boneca viva, o Assistente informou:- Esta é Marisa, a filhinha de Correia, de quem a mãezinha sedistanciou em definitivo, há seis anos.

AÇÃO E REAÇÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora