Não havia cor na expressão desesperada de Holmes, ele sentara no meio fio, o papel ainda em mãos, seus olhos corriam o papel inteiro, suas mãos tremiam enquanto o corpo estirado era retirado da frente do teatro. A polícia se espalhava pela Trafalgar Square como uma gota de leite numa xícara de café. Irene olhava nervosa sobre o ombro de tempos em tempos, seus olhos estavam fundos e seu queixo tremia, talvez de medo, talvez de ansiedade. Eu mesmo estava perplexo, desde o começo me sentia desconfortável de jogar esse jogo, Holmes aceitou as condições e agora estava jogando com um misterioso insano que parecia prever os seus passos e antecipou cada um deles.
Holmes se levantou do meio fio de supetão e então saiu correndo noite a dentro.
Irene gritou para que eu o seguisse, mas minha perna não me deixava correr na velocidade que ele disparava até o fim da avenida.
-Holmes! Me espere!
Porém ele já virava a esquina, fiquei ali parado esperando algum barulho de carne sendo cortada ou alguma onomatopeia de agressão ou morte, mas o silêncio sepulcral gritava nos meus tímpanos. Enquanto isso Londres fervilhava com gente nas ruas, damas, cavalheiros, bêbados, mendigos. Todos poderiam ser M. A qualquer momento meu amigo poderia aparecer morto em alguma sarjeta e eu não o havia acompanhado.
Caí de joelhos no meio da rua, sem ligar para a opinião dos transeuntes. Onde havia me metido? A guerra não foi o suficiente?
Então de repente ouço ao longe o som de passos rápidos, numa corrida desajeitada e os murmúrios e muxoxos dos passantes. Olhei para o fim da rua e corria numa velocidade incrível Holmes, gritando:
-Eu sei quem é!
Meus olhos brilharam com aquela afirmação, teríamos justiça no fim das contas!
Quando ele chegou perto de mim parecia ter visto um fantasma.
-Jhon, corra para casa e pegue todas as suas coisas!
-O que Holmes? Do que está falando?
-Você vai voltar a morar comigo no 221-B! Não é ótimo?
-Holmes, eu estou casado!
-Não se sua mulher for a assassina de todos esses oficiais da Scotland Yard e da polícia de Londres...
-O QUE VOCÊ ESTÁ DIZENDO HOLMES?
Não temos tempo, ela pode estar em qualquer lugar agora, vamos, pegamos um coche e vamos até sua casa, rápido!
-Como você pode dizer com tanta certeza que Mary é a assassina?
-Me diga Watson, você confia em mim?
-Sim Holmes, mas ela é a minha mulher, pelo amor de Deus!
Holmes então fez sinal para um coche que passava pela rua no momento.
-Então vamos, suba!
Não mentirei que meu primeiro instinto foi ficar ali parado, em choque. Mas minha curiosidade ganhou e eu acabei subindo no coche.
-É bom me explicar direito o que está acontecendo!
-Não vimos porque fomos burros Watson! Estava bem na nossa cara! Mary começa com M, a caligrafia mostra evidentemente os traços femininos da assassina, além disso Lestrade foi assassinado com uma força policial dentro do hospital, quero dizer que alguém da equipe teve de matá-lo. Uma enfermeira poderia ter tranquilidade suficiente para fazer o que fez com Lestrade e sair tranquilamente do quarto. A pista que ela deixou no hospital, que era seu local de trabalho antes de conhecê-la, nos levou a joalheria em que você comprou a aliança para ela e de lá fomos ao Grand Hotel, onde você teria sua lua-de-mel, mas tivemos aquela pequena aventura juntos. Mary e eu nunca nos demos bem, você bem sabe disso. Essa saída dela de casa foi somente um teste para ver o que você faria e você foi visitar seu grande amigo, Sherlock! Ela está com ciúmes e...
-Calado! Não quero ouvir mais nenhuma palavra sua Holmes, como ousa dizer isso?
-Não diga que não faz sentido. Ela sempre detestou meus métodos Watson!
-Mary nunca mataria uma pessoa, esse assassino é um insano!
Nesse exato momento o coche parou em frente à minha casa, que ardia em chamas. Um M enorme estava pintado na fachada.
-Então Watson, acredita em mim?
-E essa tia dela? Não faz sentido, eu vi Mary embarcando!
Senti então uma presença um pouco atrás do meu ombro e logo em seguido o estampido.
A dor lancinante no meu braço esquerdo invadiu meu cérebro como uma rajada de vento derruba uma casa. Caí no chão imediatamente. A luz que emanava da minha casa em chamas iluminava o rosto do cocheiro que apontava a pistola para meu amigo.
-Foi uma bela linha de raciocínio Holmes, tenho de admitir. Mas você se deixou enganar, talvez pela pressão, ou por pura insanidade. Fui eu irmãozinho.
O rosto de Mycroft brilhava, suado e austero, porém o brilho em seus olhos espelhava uma insanidade que eu nunca havia visto antes.
-Mycroft! Meu irmão! Por que?
-A coroa me demitiu Holmes, eles me demitiram dizendo que eu não era mais útil para a coroa, porém qual não é a minha surpresa ao assinar os papéis de resignação vejo na mesa do primeiro ministro uma carta de contratação endereçada a você! Você não lembra? Sempre foi o favorito!
-Mycroft abaixe a arma!
-CALADO, SEU IDIOTA! Resolvi então deixar um pequeno joguete para ver se você era mesmo capaz de me substituir e você caiu como um patinho. Todas as minhas armadilhas, eu podia ter acabado com você em diversas situações, mas ver você cada vez mais desesperado e perdido me dava mais satisfação.
-Não acredito que você matou todos esses inocentes pra provar um ponto!
-Do que importa, você não vai viver muito mais tempo-Engatilhou a arma-Me diga irmão, já jogou roleta russa?
Atirei direto na cabeça dele. O estampido veio seguido do baque surdo do corpo atingindo o chão. Uma poça de sangue se formara ao redor da cabeça de Mycroft.
Holmes estava lívido, a casa em chamas iluminava a macabra cena, e a chuva tão natural de Londres começava a cair.
Holmes então me olhou no fundo dos olhos, sorriu e disse:
-Obrigado Watson, acho que isso é tudo por hoje.
Ele se levantou com lágrimas nos olhos e disparou pela rua até cruzar uma esquina e eu o perder de vista.
Muito tempo se passou até que eu soubesse novamente de Sherlock.
Mas essa já é outra história.
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Para Holmes, com amor
FanfictionSherlock Holmes e James Watson voltam nessa fanfic para resolver um mistério praticamente insolúvel.