O beijo no sapo

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Eu preciso confessar: Isabel pode ser uma patricinha mimada e egoísta, mas ela estava linda na noite do baile.

Ela usava um vestido longo, vermelho e cintilante, meio que para insinuar que queria ser o centro das atenções. Não tenho um vasto conhecimento no quesito produtos de beleza femininos. Porém, seja lá que tipo de maquiagem foi aquela, ajudou a me fazer esquecer o quanto a garota era antipática e arrogante; ela estava bem mais bonita e parecia realmente estar se divertindo.

A garota conversava com um grupo de meninas, o que me fez pensar em uma dúzia de planos. Eu não tinha tanta intimidade com Isabel a ponto de puxar conversa e muito menos de tacar-lhe um beijo.

Ela estava quase no centro do ginásio, na metade do caminho para o local em que Tapioca da Paixão tocava. Durante o meu percurso, pude visualizar Marconi sentado na arquibancada flertando com uma garota, mesmo com uma atadura por cima do nariz. Ele segurava um copo, e me perguntei se meus amigos já teriam executado a missão.

Comecei a me assustar com o plano de Bianca. Todos nós fomos designados a cumprir funções, então qual seria a dela? Por que escolher justamente a infeliz que a batizou com um apelido tão nojento? Se a gente pisasse na bola ali, uma multidão de seguidores de Isabel nos expulsaria da festa, só para dizer o mínimo.

Para minha sorte – ou azar –, Isabel me avistou antes que eu pudesse me aproximar demais. Ela também começou a caminhar na minha direção. E aí meu coração congelou; o que ela queria comigo? Nós não éramos amigos, não tínhamos assuntos em comum. Por que estava vindo até mim?

Ela sorriu ao parar na minha frente. Eu retribuí com o sorriso mais falso que já dei na minha vida.

Isabel abriu a boca para falar, mas estávamos próximos do palco e, com o som alto, não pude escutar nenhuma de suas palavras. Aproximei meu ouvido do rosto dela, e ainda assim as palavras me pareceram confusas.

- Quero beijar você!

Não. Não pode ser. Com certeza escutei errado.

- Pode repetir?

- Quero beijar você!

Não. Tinha que ser uma pegadinha. Eu me fingi de desentendido.

- Desculpa! Não consigo entender!

Ela me arrastou até a outra extremidade do ginásio. O som ali era menos barulhento, só que meus ouvidos estavam latejando de dor e por um breve momento senti que tinha perdido boa parte da audição.

Pela terceira vez, escutei Isabel dizer:

- Quero beijar você!

Não é possível que eu tivesse escutado errado desta vez. Olhei para ela, um pouco hesitante, mas decidido.

- Então, tá. Se você quer, por mim tudo bem.

Eu aproximei meu rosto do dela. Porém, antes que meus lábios chegassem ao destino, senti uma bofetada na minha cara.

- Você tá maluco, seu tarado? – gritou Isabel, indignada. – Tava pensando em fazer o quê?

Eu não entendi mais nada.

- Você falou que queria me beijar! – eu protestei.

- Nunca na minha vida que eu diria isso! Eu disse que queria falar com você, e não beijar você, seu surdo! Era para tirar uma dúvida a respeito do trabalho de Química! Limpe seus ouvidos na próxima vez!

Herói TortoOnde histórias criam vida. Descubra agora