Capítulo III

73 14 7
                                    

Devemos ter andado aos círculos pelo menos meia hora. As árvores pareciam ser intermináveis e o frio cada vez mais gelado, aquele gelado que parece que nos chega aos ossos.

Desde que chegámos a conclusão que não iríamos voltar ao "mundo real" , (se tal coisa existe sequer, já não tenho a certeza disso) que ninguém falara. Estávamos demasiado assustados para o fazer. E atrevo-me a dizer que sentia uma ponta de fascínio pela situação, embora seja inapropriado para a ocasião.

- Ouviram? - Sussurrou o Adam, parando de repente e fazendo-nos parar também, levantando a mão.

-Ouvir o quê, exactamente? - perguntei.

Ele olhou-me e fez-me sinal para que o acompanha-se , levando-nos ás duas para o arbusto mais próximo, onde nos escondemos.

Ao longe, ouvia-se claramente o som de um uivo e de patas de animais a colidirem com a terra húmida do bosque. Mais longe, se escutássemos atentamente, ouvia-se pancadas secas e rápidas no solo. Varri o lugar com o olhar, a tentar descobrir a origem dos sons.

Olhei para a direita e a uns bons metros de nós  vi um rapaz, por volta da minha idade, com um cabelo de um vermelho flamejante, e uns olhos verdes muito vivos que se viam à distância. Era alto e esguio porém, a sua aparência não deixava de demonstrar uma certa força. 

O som das patas aproximava-se e por mais que procura-se não sabia de onde vinham.

Senti uma respiração forte nas minhas costas, rápida.

-Adam, para, isso não ajuda nada. - resmunguei, revirando o olhar.

- Han? Mas não estou a fazer nada... - Dirigi o olhar em direção da voz dele, e vi a Abi ao seu lado.

Mas se não era ele, nem a Abi... quem seria? Virei-me lentamente e vi atrás de mim um lobo, gigante, monstruoso. O seu pêlo era brilhante, cor de prata e juro que, de tanto brilhante ser, quase vi nele o meu reflexo.

"Sou nova demais para morrer. Que digam aos meus pais que os amo. E ao cão, e --"

O animal caiu para cima de mim, sangue fresco escorria-lhe pelo peito. Apesar de o ter em cima, eu tinha espaço suficiente para me conseguir libertar sem esforço. 

O rapaz ruivo estava à minha frente com um martelo na mão, com um olhar calmo e  parecia aliviado.

- Estás bem? - Perguntou.

A voz dele era grave, mas melódica ao mesmo tempo. Do tipo que ouvimos nos documentários. Do tipo que pensamos "Que voz, será que é mesmo real?", era como mel. Pestanejei para afastar os pensamentos, quase que morri e tudo o que penso é nisto.

-S-Sim, acho... obrigada...?

- Dante. - Afirmou suavemente, com um sorriso no rosto.

- Oh, El , prazer. - Senti-me corar lentamente, enquanto me virava para os meus companheiros de viagem.

-E Adam e Abigail , agora vamos continuar que quero chegar a casa antes do almoço.  - Disse o Adam, já em modo protetor, de uma maneira curta e rígida.

Decidimos então segui-lo. Tínhamos muitas mais hipóteses se seguíssemos alguém que tenha o mínimo de experiências com este tipo de coisas.

O Adam e a Abi já tinham dado um bom avanço em relação a mim e ao Dante. Acredito que o Adam não goste da ideia que outro rapaz se tenha juntado ao grupo, sempre gostou de ter a sua "exclusividade" e, em relação à Abi, bem, acho que se pode explicar com a paixoneta que desde sempre ela tem pelo meu irmão. Ela pensa que não sei, mas dá para ver bem melhor do que pensa.

Estava frio, já tinha começado a anoitecer quando o Dante nos guiou por um pequeno trilho de alcatrão que nos ligava a um casarão grande, de madeira.

- Entrem, ponham-se à vontade, vou buscar roupas quentes para vocês. - Afirmou, deixando-nos na sala.

Era pequena e acolhedora, cheia de estantes repletas de livros clássicos e algumas abrigavam filmes. As paredes eram de pedra, o que contrastava bem com a madeira do soalho. No meio da sala estava uma pequena mesa de centro, também de madeira. Esta estava rodeada por 3 sofás de pele pretos, virados para uma das paredes, onde se encaixava uma televisão e um leitor de DVD. Por detrás dessa mesma parede existiam umas escadas que davam para o 1º andar, de onde vinha agora Dante, trazendo algum vestuário.

- Devem de estar esfomeados, depois de se vestirem, venham ter comigo à cozinha, vou preparar o jantar. - E dirigiu-se para a divisão do lado, apenas separada de nós por uma porta.

-Não confio neste tipo. Ainda por cima viemos para aqui com ele sem o conhecermos minimamente. - O sobrolho de Adam ia carregando cada vez mais enquanto falava. Acabei por deixar de ouvir, estava demasiado ocupada com os meus pensamentos.

- Salvou a tua irmã de ser morta,  para mim isso basta. - Disse Abi. O Adam olhou para mim de esguelha mas calou-se sobre o assunto.

Minutos depois, Dante voltou com 4 taças de sopa, que distribuiu por todos nós. À medida que íamos comendo, o ambiente ficava cada vez mais estranho, até que decidi conhecer melhor o mais recente membro do grupo.

- Então, de onde és? 

- Daqui. Não costumo sair muito aos fins de semana, como hoje, que é Domingo. Por sorte, precisava de lenha quando vos vi, e a uma alcateia a chegar-se a vocês. Tive de me aproximar se acabavam a ser o almoço. - Olhou-me nos olhos docilmente e eu desviei rapidamente o olhar e sorri timidamente.

-Então quer dizer que também estás preso aqui? - Perguntou a Abi confusa.

- Preso? Não, eu vivo aqui desde que me conheço. - Um som de pneus no asfalto veio de lá de fora, e as luzes de faróis iluminaram a sala que antes apenas estava iluminada pelo fogo da lareira  - Devem de ser meus pais, não demoro nada. Vou só avisar que temos hóspedes.

Olhamos uns para os outros. 

-Como assim ele está aqui desde que se conhece? Ele não está num sonho? - Disse. - Estou cada vez mais confusa, onde estamos então?

A  Abi levantou-se e parou, olhando para o chão pensativamente. Levantou a cabeça para nós e afirmou, determinada.

- Se calhar não é um sonho. Não para ele. 

- Então isso só quer dizer uma coisa... - começou o Adam.

Mas não tive de esperar que ele termina-se a frase para descobrir o quê. 

Esta é outra realidade. Outro mundo.





















Dream Catcher - Realidade AlternativaOnde histórias criam vida. Descubra agora