Capítulo IX - Impulso

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Após uma semana dividindo a casa com Channing, Alice chegara a conclusão que a convivência com o homem era fácil. O que para a jovem não estava sendo fácil de lidar era o instinto protetor que ele possuía. Por razões óbvias, ela sequer considerara a possibilidade de sair do casarão e notou que ele evitava circular pela cidade. Não saberia dizer se era um hábito comum do artista. Gastava seu tempo observando a casa, os objetos decorativos e, muitas vezes, contando os ladrilhos, tamanho tédio que sofria.
- Ótima maneira de aproveitar sua viagem, Alice...

- Resmungando? - A voz rouca de Channing a pegou de surpresa e a mulher estremeceu.

- Nunca perderá essa mania?

- Que mania? - Ele fez cara de coitado.
- Entrar sorrateiramente nos lugares, tentar me matar de susto... E por aí vai. - Ela gesticulou para o nada.

- Vim trazer um presente.

Alice respirou fundo e fechou os olhos em sinal claro de impaciência. Ele não deveria trazer presentes, ou mantê-la em sua casa. Nada tiraria de sua cabeça que Channing estava sendo prejudicado por causa dessa atitude teimosa em tê-la por perto.

- Não tem que fazer isso, Channing.

- Mas eu quero.

- Não tem necessidade de gastar...

As palavras de Alice foram interrompidas por um olhar magoado do homem. Ele deixou a caixa sobre a cama e saiu do quarto, fazendo-a sentir-se a pior pessoa do universo. Ela manobrou a cadeira de rodas e alcançou o objeto que havia sido embalado com perfeição. Dentro havia um bilhete escrito à mão.

"Desejo que seus dias se tornem mais agradáveis e produtivos. Use-o para expressar seus pensamentos e sentimentos, mas deixe-me conhecê-los algum dia."

Havia a assinatura dele logo abaixo. O coração de Alice acelerou de uma forma que até então ela desconhecia. Com toda rapidez que fora capaz de produzir, a jovem conduzia a cadeira pela casa na intenção de encontrar Channing e agradecer pela atitude de carinho. Não gastara muito tempo para achá-lo, pois o astro estava sentado à mesa da cozinha fingindo ler um roteiro. Alice fez um ruído baixo com a garganta para sinalizar sua chegada, ciente que ele ouvira perfeitamente o barulho irritante produzido pela cadeira de rodas, mas que evitara erguer o olhar de propósito.

- Espero que possa me perdoar... - Ela balbuciou.

Silêncio.

- Channing, me perdoe. - Ela repetiu.

Nenhum movimento ou som por parte dele.

- Quer saber? Dane-se você! Eu estou me desculpando, que droga! - Ela gritou, irritada e ele permaneceu imóvel, como se não houvesse ninguém por ali.

Alice ficou estática por alguns instantes, mas seus olhos encheram de lágrimas que ela não conseguiu conter. Um choro magoado escapou de seu peito e ele finalmente se comoveu, saltando da cadeira mais rápido do que o cérebro da moça fora capaz de processar, e em poucos segundos Channing estava ajoelhado à sua frente, tentando acalmá-la.

- Me deixe em paz... - Ela pediu com a voz trêmula.

- Claro que não, Alice. Me perdoa, fui um idiota. - Ele acariciava seu rosto com carinho e tentava enxugar as lágrimas.

- Eu fui cruel, você só quis me agradar. Eu... Estou me sentindo tão inútil e intrusa... - Ela soluçava e chorava baixinho.

- Não diga isso... Você está passando por um momento péssimo. O que eu posso fazer, Alice? Me diga que eu faço.

Ela o encarou em silêncio. Nenhum dos dois conseguia dizer nada, emitir nenhum som. Depois de muito tempo, ele acariciou os cabelos macios de Alice, inclinou o corpo em sua direção e pousou os lábios sobre os dela. Haviam tantas emoções afloradas naquele momento, uma atração mútua que surgiu inesperadamente, fez com que ambos intensificassem o contato, permitindo que o beijo prolongasse e se tornasse profundo e intenso, até que ambos afastaram-se num sobressalto. Alice levou uma das mãos até os lábios inchados pelo beijo apaixonado, e Channing cambaleou para trás, com uma expressão indecifrável.

- Não diga nada! - Alice falou firmemente quando ele fez menção de abrir a boca. - Não ouse pedir desculpas, eu sei que isso foi um erro.

Ela manobrou a cadeira de volta para o quarto com uma rapidez que nunca conseguira antes, deixando-o sozinho e abalado na cozinha.

Momento de ImpactoOnde histórias criam vida. Descubra agora