4 - Acordo

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—Então, o que faremos quando o sol nascer? — Jack pulou da árvore e chutou um punhado leve de neve que estava sob seus pés —Você não está em boas condições para algo mais pesado. Você sequer deveria estar patrulhando hoje comigo.

O olhar que Jack me direcionou continha um misto de preocupação e culpa. Preocupação por notar meu estado lamentável e culpado por eu estar me fazendo de forte para amenizar sua preocupação. Sabia também que parte de sua culpa se dava ao fato de ele ter gostado do treinamento e está querendo uma segunda dose. A magia exigia seu preço, afinal não era uma magia comum, eu só a usava uma vez ao ano e sofria as consequências no dia seguinte, mas usa-la por mais de uma vez, ainda que por um curto tempo, também cobrou seu preço em meu físico, mesmo que pouco, ainda foi relevante.

—E deixar você sozinho? Não me parece algo que eu aceitaria de bom grado, você me conhece. E mais... — estiquei a mão e lancei uma rajada fina de luz, fina porém poderosa o bastante para provocar uma explosão no solo —Ainda sou um perigo eminente.

Tentei soar engraçada, mas Jack não riu. Ele estava sério e seus olhos reprovaram minha atitude em "desperdiçar" energia, mesmo sendo a menor quantidade possível. Suspirei pesadamente, desistindo de tentar convence-lo. Levantei de minha posição relaxada e sentei sobre o firme galho que repousava, meus ossos rangendo em resposta. Jack se ofereceu para me ajudar, mas eu prontamente recusei a oferta com um aceno de mão. Ele teria de lidar melhor com minhas fraquezas, e eu ajudaria recusando seu auxílio, em certos casos, claro. Não era de ferro, embora fosse imortal no que tange o envelhecimento.

—Iremos retornar para os livros, para a biblioteca — abri minhas asas —Resolvi pegar um pouco mais leve hoje e aproveitar para lhe explicar melhor sobre o acordo que foi formado entre nós e os seres da luz. — me levantei devagar, e isso exigiu esforço de minha parte.

Meu pé escorregou e me vi cair direto para o chão. Minhas asas falharam, encolheram mediante a dor física. Me preparei para o tombo e para mais dor, mas Jack me aparou a tempo. Ele materializou uma cama de neve fofinha no ar, como uma nuvem, para me impedir de cair. Suspirei aliviada e agradeci aos céus pelo raciocínio rápido de meu companheiro. Com um movimento de mão, Jack aproximou a nuvem de si, me levando para seus braços.

—É bastante notável o quão cansada estás. — Jack me colou no chão, mas não me soltou —Deixe que eu mesmo ti levo para casa. — abri a boca para protelar, mas Jack me calou com seu dedo indicador —Não reclame! Você deve gastar o mínimo de energia necessária.

Apenas assenti em resposta. Não queria admitir, mas Jack estava certo, eu precisava poupar magia para poder me recuperar mais rápido. Então apenas deixei que ele me tomasse em seus braços e nos guiasse até a biblioteca. Jack só me soltara para me por sentada confortavelmente em uma poltrona fofa e macia. Relaxei ao ponto de me deixar afundar no estofado, a sensação fora maravilhosa.

—Agora que chegamos, vou explicar tudo sobre o acordo entre os guardiões e os Seralphins. — estendi minha mão —"O Tratado" venha! — ordenei e o livro saltou de uma das muitas estantes e veio até a palma da minha mão.

Foleei o livro e o abri na pagina do tratado, onde estavam a assinatura do lideres de Sirius, a minha e dos irmãos Moon. Suspirei ao ver o nome de Blood Moon, o aperto no coração fora inevitável. Jack percebera minha reação, mas não me questionara. Eu sabia bem que ele tinha perguntas sobre aquela pessoa, eu bem sabia disso. Mas Jack aprenderá, com seus erros, a esperar por minhas respostas. Ele sabia que no momento certo eu lhe contaria todo o assunto que envolvia nosso antigo líder.

—Ele fica com você, para caso de consulta. — passei o livro pata Jack, que o pegou de minhas mãos —Como você já soube, o acordo foi criado por mim e os estimados irmão Moon, mas vou te explicar um pouco como funciona. Basicamente, ele dá permissão para que os Seralphins adentrem nossa dimensão quando precisarem, em menor número, claro. Somente no dia de Halloween é permitido a passagem de uma quantidade considerável deles, uma vez que a aparência física de alguns deixaria nossos protegidos assustados. Porém, no dia 31 de outubro, todos estão fantasiados para o momento, o que torna tudo mais fácil para os Seralphins passarem desapercebido entre os humanos, sem chamar muita atenção para si, ou até mesmo para nós.

—Tinha achado estranho o fato dessa transição ocorrer somente no Halloween, mas agora as peças se encaixam perfeitamente. Com tanta gente usando fantasias, é fácil para os seres da luz infiltrar-se entre os humanos. Mas, então, por que nós teremos que nos disfarçar de humanos?

—Em nossas formas originais, somente quem acredita em nós poderá nos ver, e isso causaria um tremendo alvoroço. Imagine só, alguém em um grupo de pessoas aponta para nós, mas seus amigos não enxergam o mesmo. Como você acha que tratariam essa pessoa?

—Como alguém com problemas mentais.

—Exatamente. Por isso nos tornamos humanos, porque assim ficaremos visíveis a todos e os pouparemos desse constrangimento. — Jack fez a típica levantada de sobrancelha do entendimento, então prossegui —Também somos responsáveis por manter a segurança e o retorno dos seres da luz, além de termos de impedir a intrusão de seres das trevas, que vem a nossa dimensão com intenções nada amigáveis.

—Esse seres das trevas são bastante inconvenientes. — Jack fez uma careta de desgosto.

—Sim, eles nunca perdem a oportunidade de gerar o caos, mesmo que seja em outra dimensão. — esbocei uma careta —É bem raro algum conseguir a proeza de chegar até esse lado e, quando conseguem, estão sempre em uma quantidade insignificante. Afinal, os Seralphins protegem muito bem o portal que liga nossos mundos, mas nada é perfeito.

—Então essa proteção seria a forma de Sirius nos recompensar pelo Halloween?

—Bingo. — estralei os dedos —Se um exército das trevas chegasse até este lado, seria uma catástrofe sem precedentes. Eles teriam muita energia negativa à sua disposição, sem mencionar que estariam em uma quantidade destrutiva. Contudo, caso isto venha a acontecer algum dia, os seres da luz irão guerrear a nosso lado. Possuímos um elo de amizade infindável, afinal.

—É, vejo que o único perdendo tempo nesses duzentos e cinquentas anos fora somente eu. — Jack sorriu levemente, mas pude sentir que isso ainda o afetava relativamente.

—Águas passadas meu caro Frozt, hoje você é um guardião e o segundo na cadeia de comando se algo me acontecer. — dei um leve soco em seu ombro, o que o fez balançar a cabeça, só que com um sorriso mais leve dessa vez.

—Sim, você está certa.

Passamos o restante do dia lendo o livro de Sirius. Deixei Jack expor seu aprendizado para mim, queria avaliar o quanto ele sabia. Para minha surpresa, só precisei acrescentar poucas coisas ao seu entendimento. Jack olhou para o relógio, em um dado momento, e comprimiu os lábios em uma linha fina logo de seguida. A hora de nossa patrulha diária se aproximava, e isso não o agradava muito, pelo menos não naquele momento.

—O alvorecer se aproxima. — Jack retornou seu olhar para mim, descontente —Mas eu sei que não vai adiantar eu ti pedir pra ficar.

—Ainda bem que você sabe disso. — levantei da cadeira e liberei minhas assas, as abrindo ao máximo, me sentindo renovada —Os efeitos colaterais já estão quase no fim. Já estou em boa forma. Então vamos, temos uma longa noite.

Não estava mentindo. Passar o dia sentada naquela poltrona confortável fez com que meus músculos relaxassem. Tudo que eu precisava era de um bom descanso para o corpo. Então fomos patrulhar. Mesmo não sendo útil para localizar Breu, eu me sentia mais confortável vigiando as crianças de pertinho, um dos motivos para eu não criar meus próprios seres de luz para o fazer. Quem dera eu soubesse que minha patrulha estava bem distante do que se escondia abaixo de nossos pés.

Batalha de Dois Mundos - Livro II (Revisão)Onde histórias criam vida. Descubra agora