Dez anos se passaram sem que eu pudesse ver Day, e agora ele estava na minha frente e eu não sabia como reagir. Por anos imaginei esse momento, mas agora que estava acontecendo não sabia o que fazer.
- Com licença - diz ele. Ah, essa voz! Mais profunda e suave do que eu lembrava, sem o tom áspero da infância e com a nova elegância de um adulto. - Nós nos conhecemos?
Por um momento, fico desnorteada. O que devo dizer? Passei tantos anos me convencendo de que já não nos conhecíamos...
- Não - sussurro. - Lamento.
Na minha cabeça, suplico a mim mesma para dizer a ele a verdade.
Day franze a testa , confuso por um momento. Ele passa a mão pelo cabelo. Ao fazer esse gesto, vejo de relance uma coisa brilhante no seu dedo.
É um anel feito de clipes de papel. Um suspiro me escapa. Não acredito.
Ele ainda usa o anel de clipes de papel que lhe dei há anos.
- Ah! - responde ele finalmente. - Então, me desculpe por incomodá-la. Eu achei... É que você me parece familiar. Tem certeza de que não nos conhecemos de algum lugar?
Examino os olhos dele, em silêncio. Não consigo dizer nada. Há uma emoção secreta que surge no rosto dele agora, alguma coisa entre desconhecimento e familiaridade, alguma coisa que me diz que ele está se esforçando para me identificar, para descobrir de onde me conhece. Meu coração protesta, querendo que ele se lembre. Mesmo assim, nenhuma palavra sai de minha boca.
Day analisa meu rosto com seu olhar fixo e suave e depois balança a cabeça.
- Eu sei que já te conheci - murmura ele. - Há muito tempo. Não sei onde, mas acho que sei o porquê.
- Por quê? - pergunto docemente.
Ele se cala por um instante e em seguida dá um passo à frente e fica mais perto de mim. Perto o suficiente para que eu veja a minúscula imperfeição de seu olho esquerdo. Ele dá uma risada e enrubesce.
- Desculpe. O que vou dizer é muito estranho. - Eu me sinto perdida numa névoa. Como num sonho no qual não me atrevo a despertar. - Eu... - ele começa, como se estivesse procurando as palavras adequadas. - Há muito tempo estou procurando uma coisa que acho que pedi.
"Uma coisa que ele perdeu". Essas palavras me causam um nó na garganta, uma onda de esperança arrebatadora. Talvez essa "coisa" seja eu. Digo algo rapidamente.
- Isso não tem nada de estranho.
Day sorri. Algo doce e desejoso aparece nos seus olhos.
- Senti que tinha encontrado uma coisa quando vi você lá atrás. Tem certeza... Você me conhece? Eu te conheço?
Não sei o que dizer. A parte de mim que outrora decidiu sair da vida dele me diz que devo fazer isso de novo, protegê-lo de saber o que lhe causou tanto sofrimento há muito tempo. Dez anos... Faz mesmo tanto tempo assim? A outra parte de mim, a garota que o conheceu na rua, me instiga a lhe contar a verdade. Finalmente digo, quando consigo abrir a boca.
- Preciso ir me encontrar com uns amigos.
- Sim, claro, desculpe-me - Day pigarreia, inseguro. - Na verdade, eu também preciso. Com uma velha amiga, em Rubi. - Arregalo os olhos. "Com uma velha amiga, em Rubi". De repente, compreendo por que Tess pareceu tão alegrinha na mensagem que deixou pra mim, por que ela me disse para assistir o noticiário daquela noite. Hesito ao perguntar.
- O nome da sua amiga é Tess?
É a vez dele se surpreender. Ele me dá um sorriso intrigado e atônito.
- Você a conhece!
O que estou fazendo? O que está acontecendo? Se isso é mesmo sonho, não quero acordar dele. Já tive este sonho tantas vezes e não quero que ele seja tirado de mim de novo.
- Conheço - murmuro. - Vou jantar com ela hoje.
Nós nos encaramos em silêncio. O rosto de Day está sério, e seu olhar é tão intenso que sinto um calor percorrendo todos os sentimentos do meu corpo. Permanecemos assim por um longo período e, para variar, não tenho noção do quanto tempo se passou.
- Eu me lembro - diz ele afinal.
Examino seus olhos à procura daquela mesma tristeza profunda, do tormento e da angústia sempre presente quando estávamos juntos.
Mas já não consigo vê-los. No lugar deles, encontro outra coisa. Encontro uma ferida curada, uma cicatriz permanente que não obstante se fechou, alguma coisa de um capítulo da sua vida que ele finalmente aceitou, após todos esses anos. Entendo... Isso é mesmo possível? Será que é verdade?
Vejo pedaços de lembranças em seus olhos. Pedaços de nós. Eles estão fragmentados espalhados, mas estão lá, gradativamente se reunindo de novo quando ele me viu. Eles estão lá.
- É você - ele sussurra, estupefato.
Ele se lembrou de algo? Poderia ter se lembrado de mim, mas me lembro que prometi que sacrificaria qualquer coisa para que ele ficasse bem. E com isso sacrifiquei tudo o que tínhamos. Ele havia ido embora da República, e com isso me aproximei muito de Tess. Ela era a única que me entendia, afinal, ela também gostava dele.
- Sou? - sussurro também, a voz trêmula de todas as emoções que mantive escondidas por tanto tempo.
Então ele continuou.
- Espero poder conhecer você de novo - disse ele. - Se você concordar. Existe uma névoa ao seu redor que eu gostaria de dissipar.
Por anos, tudo o que eu queria era ouvir sua voz pessoalmente, não atrás dos jornais, e aqui estava. E dessa vez não sabia como reagir.
- Oi! - diz ele. - Meu nome é Daniel.
- Oi! - respondo. - Meu nome é June.
Então por um segundo antes de ir embora percebo que ele se apresentou como "Daniel" e não "Day", já tinha o ouvido dizer que apenas os familiares lhe chamavam assim.
- Eu preciso mesmo ir - digo me afastando.
- Espero vê-la novamente - ouvi ele dizer por fim.
Caminhei lentamente pelas ruas da república, me permitindo viajar em pensamentos, ele não se lembra de todo o sofrimento que lhe causei. Mesmo que tenha que sacrificar o que sinto, nunca irá saber.
Me lembro do olhar dele, onde havia fragmentos de nós, mesmo estando completamente separados, mas estavam lá, esperando apenas que alguém os junte e relembre tudo o que realmente aconteceu. Uma parte de mim diz que devo lutar por ele, lutar pelo que tínhamos e fazê-lo relembrar. Mas outra parte diz que devo deixá-lo tomar as próprias decisões, já o fiz sofrer tanto, não posso permitir que sofra novamente por mim. Mesmo tentando ignorar meus pensamentos em relação ao Day, tudo que vem na minha cabeça é "O que devo fazer: lutar por Day, ou permitir que ele viva sem mim? ".
Senti tanto a sua falta por todos esses anos, e agora não sabia que poderia estar junto a ele novamente. Fui tirada dos meus pensamentos quando ouvi meu celular tocar. Era Tess.
- Não acredito, June Iparis - disse ela do outro lado da linha, e pelo tom da sua voz, poderia perceber que estava irritada. - Você está muito atrasada.
- Me desculpe, Tess. Eu não notei que o tempo havia passado - disse, tentando acalmá-la. - Estava trabalhando em um caso complicado - eu disse. Não iria falar que fiquei sem reação após falar com Day. - Estou indo agora mesmo.
- Só não demore muito - pediu Tess.
- Já estou em Rubi.
- Claro que sim - disse ela. - Você mora em Rubi, June.
Então em seguida ela desligou, olhei no relógio que horas eram, e percebi o motivo de toda a irritação de Tess. Havia se passado uma hora.
Caminhei rapidamente pelas ruas de Rubi, até que finalmente cheguei na porta de Tess. Bati e minutos depois ela se abriu, mas não era Tess. Era Pascoa.
- Olha só quem resolveu aparecer - disse ele, me dando passagem para entrar. - Finalmente resolveu vir comemorar seu aniversário com os amigos.
- Estava trabalhando em um caso.
- Tess falou. Como sempre, se atrasando por causa do trabalho.
- Ah, finalmente ela chegou! - disse Tess, caminhando em nossa direção. - Uma hora de atraso, June.
- Estava em um caso complicado - menti.
- Tudo bem, não vamos falar de trabalho hoje - disse Pascoa. - Vamos logo jantar, pois estou com fome, e depois entregaremos seus presentes.
- Já falei que não queria nada - protestei.
- Mas queríamos comprar mesmo assim - disse Tess. - Mas antes de jantarmos - ela caminhou até a mesa e pegou três taças de vinho. - Ofereço um brinde. A June. O prodígio da República.
Ouço Pascoa repetir depois de Tess "A June. O prodígio da República" .
Logo depois do brinde nos sentamos à mesa. Viramos uma bela equipe, Tess sentia tanta falta de Day quanto eu. E Pascoa, apesar do pouco tempo que convivera com Day, sabia a falta que ele fazia. Acabamos o jantar e estava tudo delicioso.
- Parabéns, Tess - digo. - Estava tudo saboroso.
- Obrigada - ela agradeceu.
- Agora, June - disse Pascoa. - Espere aqui.
- Tudo bem - digo.
- Enquanto isso - disse Tess, com um sorriso no rosto. - Preciso atender a uma ligação. Não a deixe ir embora.
- Vou segurá-la - ele voltou e parou a uma pequena distância de mim. - Bem, espero que goste - disse Pascoa, me entregando uma caixa preta.
Abri com delicadeza a caixa.
- Que lindo!
Era um colar de Rubi vermelho, sem dúvida uma das joias mais lindas que havia visto na vida.
- Muito obrigada - digo, admirando a joia que acabara de ganhar. Mas antes que pudesse dizer qualquer coisa, ouvi a porta dos fundos abrir e logo em seguida alguns passos, e em seguida a voz de Tess dizendo "espere aqui".
- Tem certeza? - ouço uma voz perguntar. Ah, aquela voz! Nunca em toda minha vida não poderia deixar de reconhecer, mesmo se ficasse sem ouvir por uma década. Em questão de segundos o vejo em minha frente.
- Olá, June - diz ele.~~~~0~~~0~~~~0~~~~0
Hey, postei um pouquinho mais tarde porque esqueci de largar o livro (leitora compulsiva? Imagina! ) enfim.
Espero que tenham gostado, deixem suas opiniões nos comentários, preciso saber se tem algo em que possa melhorar. Acho que isso é tudo. Até a próxima!
Byee ;)
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O Reencontro - Legend
FanfictionFANFIC SE PASSA DEPOIS DE CHAMPION. ATENÇÃO HÁ POSSÍVEIS SPOILERS! June e Day passaram dez anos separados, depois de todos os acontecimentos de Champion. Ele não se lembrava mais dela, e nada do que viveram, mas com um acontecimento surpreendente el...